Saudosas pequenas – ATS, parte IV (final)

RIO DE JANEIRO – Numa época de ruptura de conceitos, quando a FIA determinou o fim do efeito-solo na Fórmula 1, projetistas e engenheiros podiam fazer o que bem entendessem com seus carros de fundo plano para a temporada de 1983. E mesmo sem muitos recursos, Gustav Brunner trouxe para Günther Schmidt uma ideia que conquistou até o mago Adrian Newey, tido como o melhor do seu ramo, hoje, na categoria máxima.

ATS D6
O belo carro de Gustav Brunner não tinha carenagem

O ATS D6, projetado e construído para aquele campeonato, renunciava à carenagem. Foi totalmente composto e moldado em fibra de carbono e a pintura foi aplicada nela. Vale lembrar que John Barnard tinha idealizado em 1981 o McLaren MP4/1 em fibra de carbono, mas os chassis foram construídos em parceria com a empresa aeronáutica Hercules. No caso dos alemães, não. Brunner fez chassi e revestimento se confundirem e aplicou todo o trabalho e o dinheiro da equipe em testes aerodinâmicos.

Para o ano de 1983, a ATS conseguiu um contrato com a BMW para o fornecimento de motores. Pelo menos teriam potência de sobra para lutar no bloco intermediário contra equipes de bom nível e superar todos os times que ainda usavam motores Ford Cosworth aspirados, os “convencionais”, como se dizia naquela época.

6790388648_a97294a4b6_b
Manfred Winkelhock era o único piloto da ATS em 1983

Mas o começo não foi dos mais animadores. Chassi e motor começaram não se entendendo. Winkelhock classificou mal no Brasil e em Long Beach, obtendo apenas um 16º lugar ao fim da corrida de Jacarepaguá. A partir do GP da França, em Paul Ricard, é que a situação da equipe melhoraria um pouco.

Ao longo do ano, pelo menos em classificação, Winkelhock mostrava qualidades. Ficou entre os 10 primeiros do grid em nove oportunidades, o que para uma equipe pequena como a ATS era sensacional. Mas apesar da inventividade de Brunner no chassi e do bom motor BMW turbo, faltava sorte e confiabilidade.

Em Spa-Francorchamps, por exemplo, Winkelhock chegou a andar em 6º, mas algumas voltas mais tarde, uma roda pediu demissão, voando longe. No circuito de Silverstone, o piloto alemão andou muito bem até o carro ter problemas de superaquecimento. Além das dezenas de falhas técnicas, houve ainda uma desclassificação em Zandvoort porque Winkelhock ultrapassou um adversário na volta de apresentação e na Alemanha, na corrida “caseira”, o alemão sofreu um acidente nos treinos e não pôde largar.

Manfred Winkelhock Driving the ATS/BMW in Practice at Brands Hat
O alemão seguiu com a equipe de Günther Schmidt em 1984

Apesar de passar mais um ano em branco, a ATS seguiu para 1984 sem saber ainda que aquela seria sua última temporada na Fórmula 1. Mudanças, só nos pneus, que passavam a ser os Pirelli e na numeração do único carro previsto, o #14, para Manfred Winkelhock.

O modelo D7, mais uma vez concebido por Gustav Brunner, seguia a mesma tendência do antecessor, copiando uma novidade do McLaren MP4/2 de John Barnard, com a traseira em formato “garrafa de coca-cola”. A novidade deu certo: nos treinos, o desempenho de Winkelhock foi muito bom no início do campeonato.

1306421642_d7-1984-2
Mesmo com alguns bons desempenhos em treinos, o ATS D7 não era confiável

A melhor corrida do alemão em toda sua carreira na Fórmula 1 foi em Zolder: sexto no grid, ele passou para quarto, atrás de Michele Alboreto, Derek Warwick e René Arnoux e por lá ficou durante 22 voltas. Acabou superado por Nelson Piquet e depois disso, persistiu entre os seis primeiros até a 33ª passagem. Voltou à pista após um pit stop e estava em décimo quando um problema de pane elétrica tirou carro e piloto da pista.

No resto do ano, o ATS D7 teria uma sequência de quebras de câmbio que atrapalhavam ainda mais a performance do carro. Ainda assim, Günther Schmidt inscreveu um segundo carro, para o novato Gerhard Berger, austríaco que vinha da Fórmula 3 europeia.

autowp.ru_ats_d7_3
Quem fez sua estreia na Fórmula 1 com um ATS foi Gerhard Berger, oriundo da Fórmula 3 europeia

Berger estreou em Zeltweg e logo na segunda corrida chegou em 6º no GP da Itália – mas como a ATS não tinha inscrito dois carros para o campeonato inteiro, piloto e equipe não tiveram direito aos pontos. Winkelhock saiu antes do fim do campeonato e Berger ficou como único piloto do time nos GPs da Europa, onde se envolveu num acidente após a largada e em Portugal, quando foi 13º colocado.

No fim do ano, a ATS encerrou suas atividades como equipe de Fórmula 1, com um cartel de 99 GPs disputados e apenas sete pontos somados em oito temporadas. Günther Schmidt regressaria para uma nova aventura como dono de equipe, com a Rial, no fim daquela mesma década. Mas isso é assunto para outra postagem…

A retrospectiva da ATS – parte I

A retrospectiva da ATS – parte II

A retrospectiva da ATS – parte III

Comentários

  • Rodrigo,

    Essas postagens sob a citação “Saudosas pequenas…” são incrivelmente de ótimo gosto!! Para um entusiasta de Fórmula 1 e algumas (não muitas) outras categorias nascido em 92. Que começou a olhar com outros olhos para o automobilismo em 99, bons tempos de Barrichello pela Stewart, é muito interessante dar uma olhada nas décadas anteriores e ficar sabendo da grande história das pequenas na F1.

    Reparei nessas postagens no meio da semana e tirei o último domingo do ano para dar uma conferida nelas…. Não me arrependi e estarei acompanhando as próximas. Conteúdo de qualidade na entressafra de corridas é difícil de achar, mas aqui… Sempre tem do bom e do melhor.

    Continue assim Rodrigo! E que a sorte sorria para todos nós nesse 2013 que há de ser melhor que o “velho” 2012!!
    Feliz ano novo!!
    Abraços!