Saudosas pequenas – Minardi, parte V

RIO DE JANEIRO – Quinze anos depois de alinhar uma Ferrari 312T em duas corridas extracampeonato para Giancarlo Martini, quando sua equipe ainda era a Scuderia Everest, Giancarlo Minardi teve direito a receber um lote de motores Ferrari V12 para instalar em seus carros no Mundial de Fórmula 1 em 1991. Aliás, a equipe do Cavallino Rampante inaugurava aí sua história de fornecedora para clientes, já que nos tempos de Enzo Ferrari, isso era praticamente impossível de acontecer.

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O M191 foi o primeiro carro de um time particular na história a receber o motor Ferrari

Com os motores type 036 de 700 cavalos de potência, os primeiros chassis do M191, projeto de Aldo Costa e do novo auxiliar de engenharia, René Hillhorst, foram para a pista nos testes da pré-temporada. O amarelo predominante do carro nos dois anos anteriores foi trocado pelo preto dos primeiros anos do time. Pierluigi Martini, o herói de 1989, renovou por mais um ano e teria a companhia de Gianni Morbidelli, que passara a ser piloto de testes da Ferrari e teria seus salários pagos por Maranello.

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Gianni Morbidelli, que corria com salários pagos por Maranello, teve uma temporada modesta

O começo do binômio Minardi-Ferrari foi modesto, com um 9º lugar de Martini nos EUA (mesmo com problemas de motor) e um oitavo de Morbidelli no GP do Brasil. Mas em San Marino, Martini correspondeu: nono no grid, chegou à zona de pontuação na 38ª volta. Com os problemas que afligiram Stefano Modena e Roberto Pupo Moreno, que ocuparam o 3º lugar durante grande parte da disputa, o italiano chegou em quarto e conseguiu o melhor resultado da equipe na Fórmula 1 até aquela data.

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Martini mais uma vez foi o melhor piloto da Minardi nas pistas

Apesar da força do motor V12 da Ferrari, o M191 não era um carro excepcional e isso se refletia nos resultados alcançados nos treinos classificatórios. Além do bom desempenho em San Marino, somente uma única vez um dos carros se qualificou entre os dez primeiros, com Morbidelli, 10º tempo na França. Em corrida, Martini ficou no “quase” no Canadá e Morbidelli no México, com os dois completando em 7º lugar.

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O italiano chegou em 4º lugar nos GPs de San Marino e Portugal

Na segunda metade daquele campeonato, o desempenho não melhorou muito. Porém, em Portugal, onde Martini liderara dois anos antes, o M191 teve boa performance e o italiano, após largar em oitavo, deu calor na Ferrari de Jean Alesi durante grande parte da disputa e terminou em quarto, a menos de 10 segundos do francês. Mais três pontos para a conta.

Nos treinos do GP do Japão, os dois pilotos ocuparam a quarta fila inteira e Martini vinha num respeitável 5º lugar até a 40ª volta, quando ficou sem embreagem. Na última corrida do ano, Gianni Morbidelli foi requisitado pela Ferrari após a demissão do francês Alain Prost, por ter criticado a performance dos carros vermelhos. Roberto Pupo Moreno, que ao ser afastado da Benetton para dar lugar a Michael Schumacher, passara os seus contatos a Giancarlo Minardi, que o chamou para andar no #24 em Adelaide.

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Roberto Pupo Moreno também andou no M191, na última e aquática etapa do ano, em Adelaide

Sem nenhum teste e sem conhecer o carro, novamente o Baixo mostrou o quanto valia: fez o 18º tempo no grid, a um segundo e dois décimos de Martini, que tinha dezenas de quilômetros percorridos com o carro ao longo de todo o campeonato. O brasileiro acabou em 16º lugar na corrida que durou apenas 25 minutos e 14 voltas, a mais curta da história da Fórmula 1.

Com um mais do que razoável sétimo posto no Mundial de Construtores, com seis pontos somados, e à frente de escuderias feito Scuderia Italia, Brabham, Lotus (estas em crônico declínio), Larrousse e Leyton House – sem contar a Ligier, em grave crise técnica naqueles anos, afora as nanicas AGS, Fondmetal e Coloni, além do Modena Team, nem assim Giancarlo Minardi manteve os motores Ferrari para a temporada de 1992.

O jeito foi costurar um acordo com Mauro Forghieri, que fechara sua escuderia, garantindo assim uma cota de motores Chrysler-Lamborghini para aquele ano. Martini saiu do time e foi para a Scuderia Italia. Morbidelli ficou e veio o estreante Christian Fittipaldi, que brandia as credenciais do título da Fórmula 3000 internacional em 1991, derrotando o italiano Alessandro Zanardi.

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Morbidelli guiou no começo do ano o antigo M191 adaptado para receber o motor Chrysler-Lamborghini

Costa e Hillhorst deram um jeito de adaptar o motor Lamborghini, mais comprido que o Ferrari, no M191 para que os dois pilotos do time fizessem os testes e as primeiras corridas até a estreia do chassis M192, prevista para o GP de San Marino, em Imola. A adaptação de Christian Fittipaldi ao novo ‘brinquedo’ até foi boa: ele fez o 20º tempo no grid em Kyalami e saiu da pista por problemas elétricos quando vinha em 13º e à frente de Morbidelli.

O brasileiro derrotou o colega de equipe pela primeira vez em qualificação no GP do México, partindo quatro posições à frente de Morbidelli. Christian largou bem e ficou com a 13ª posição – mas deu uma rodada na terceira volta e ficou de fora. Morbidelli também saiu da pista e não terminou a corrida. Em Interlagos, novamente Christian ficou à frente do italiano na qualificação, mas enquanto Morbidelli chegava em 11º, o brasileiro deixava a corrida na 55ª volta, quando já era décimo.

A última corrida do M191B foi no GP da Espanha e mais uma vez o placar em treinos de classificação foi favorável a Christian, que fez uma boa corrida apesar do temporal que caía em Barcelona durante a disputa. Mesmo chegando quatro voltas atrás de Nigel Mansell, ele conseguiu terminar pela primeira vez, em 11º lugar.

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Christian Fittipaldi começou bem com o novo M192, mas acidentou-se na França e ficou várias corridas de fora

Em Imola, o M192 faria suas primeiras voltas oficiais na temporada. A diferença básica em relação ao modelo anterior era o desenho da asa dianteira, além do carro ser construído em função do motor Lamborghini, o que não acontecia na versão B do M191. O início do novo carro não foi bom e no GP de San Marino, os dois pilotos desistiram com problemas de transmissão. Mas já na prova seguinte em Mônaco, Christian Fittipaldi conquistou um excelente 8º lugar, muito bom mesmo porque ele nunca tinha corrido ali antes – nem de Fórmula 3. No Canadá, Morbidelli salvou um 11º lugar e aí veio o GP da França, em Magny-Cours.

Durante os treinos, Christian tentava melhorar seu tempo quando sofreu um violento acidente. Diagnosticado com uma lesão na coluna cervical, o piloto teve que usar colar no pescoço e foi afastado por vários GPs, perdendo o desenvolvimento do M192 e prejudicando a equipe, que precisou chamar Alessandro Zanardi para substitui-lo.

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Morbidelli tentou, mas não conseguiu seus primeiros pontos pela Minardi

Não foi um bom período para a Minardi. Embora Morbidelli tenha sido 8º colocado na França, até o GP da Hungria a performance da equipe foi ridícula e Zanardi não se classificou em duas das três corridas em que substituiu o brasileiro. Christian voltou, liberado pelos médicos, no GP da Bélgica, mas não se qualificou em Spa, o mesmo acontecendo em Monza.  Na Itália, Morbidelli conseguiu o melhor grid do M192, um 12º posto, mas o motor quebrou.

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Christian fez um grande trabalho em Suzuka e chegou em 6º lugar, após luta intensa com Jean Alesi

Fittipaldi voltou a terminar uma corrida, com muito esforço, no GP de Portugal. Mesmo largando em último no Estoril, chegou em décimo-segundo, duas posições à frente de Morbidelli. E já com a confiança e a forma física recuperadas, o brasileiro teve uma atuação exemplar no GP do Japão em Suzuka: largou em 12º e brigou o tempo inteiro com Jean Alesi, que guiava o horroroso modelo F92A da Ferrari. O francês só foi superar a Minardi na vigésima-quarta volta e Christian não desistiu, fungando no cangote do #27 até a última volta. Foi premiado com a 6ª posição, marcando seu primeiro ponto na Fórmula 1 e o primeiro da Minardi em 1992.

Na Austrália, Christian voltou a figurar à frente de Morbidelli em corrida, graças à sua proverbial regularidade. Terminou em nono e Giancarlo Minardi apressou-se a renovar seu contrato para o campeonato de 1993, onde Morbidelli não teria vez no time de Faenza.

No próximo post, veremos como a equipe e seus pilotos se saíram nos anos de 93 e 94.

Comentários

  • Rodrigo. A série “Saudosas Pequenas” é maravilhosa. Você não pensou ainda em transforma-la em um livro. Séria maravilhoso juntar todas estas histórias destes batalhadores da F1. Eu certamente compraria, não só para eu mas para dar de presente a amigos loucos por F1. Acho que vale a pena você pensar nisso.

  • Essa série é demais. Já estou ficando até triste pois a cada novo capitulo sei que ela esta mais perto do fim! RM sei que deve dar um trabalho danado essa série mas vc aceitaria sugestões de equipes para dar continuidade ao “Saudosas pequenas”? Obrigado.

  • Esse Fittipaldi realmente era um bom piloto,pena que não fechou para pilotar a tyrrell em 95(não sei se foi de toda má idéia pois aquele carro era bem fraquinho),lembro de uma entrevista dele no youtube em que ele dizia que os planos era ir para os EUA e retornar depois a f 1.Olhando os representantes que tivemos após o Cristian percebemos que nosso País já foi bem melhor representado.Esse M191 era lindíssimo ainda quero ter uma miniatura dele um dia.

  • Rodrigo, lembro de ter visto em uma revista uma foto de uma especie de casa de campo com uma Minardi (provavelmente de 1992) pendurada na parede da sala de um dos Fittipaldi… procurei por esta história e não encontrei, sabe/lembra de alguma coisa ?

    • Sim. O Christian ganhou o chassi do carro com que marcou seu primeiro ponto na F-1 e pendurou-o na parede da casa dele, na Inglaterra. Igual ao que o Otávio Mesquita fez com a Jordan de 2003 do Fisichella. Abrs!

  • Rodrigo, alguns dizem que a Minardi usou o motor Ferrari de 1990 e esse consta com potência de 680 cavalos mas em outras pesquisas que realizei, diz que eles usaram o motor 037, que iniciou o ano de 1991 com 710 cavalos. Você tem a informação correta à respeito da potência desse motor usado pela Minardi? Abraço.