Discos eternos – O concreto já rachou (1985)

plebe-rude-o-concreto-ja-rachou

RIO DE JANEIRO – Formada por Philippe Seabra, Jander “Ameba” Bilaphra, André Müller (André X) e Gutje Wortmann, a Plebe Rude teve fortíssima influência de bandas punk como Clash, Sex Pistols e Public Image Limited e também do Madness, grupo de ska/new-wave da década de 80. Eram cultuados no Planalto Central e tidos e havidos por todo mundo da chamada “turma” como a melhor banda de Brasília. Até por Renato Russo, que num Chico & Caetano, programa especial de TV durante as sextas-feiras, uma vez por mês, lá por 1986, apresentou-se vestindo camiseta com o nome da Plebe por baixo de uma blusa desabotoada.

O grupo passou pela experiência de ter duas mulheres nos backing vocals: Ana Galbinsky (Ana XYZ) e Marta Brenner (Marta Detefon). Só que na mesma época, 1982, a Blitz estourava no país inteiro com “Você não soube me amar” e os rapazes da Plebe, inseguros quanto ao futuro, tiraram as garotas da banda.

Os shows, inclusive alguns fora de Brasília como um que rendeu ótimas histórias em Patos de Minas, onde o grupo foi detido por dizer no palco que a cidade tinha muitos patos e que PM era a sigla de Patos de Minas, deram cancha à Plebe e serviram para testar repertório. Muitas músicas do começo do grupo, como “A dança do semáforo” e “Em casa ele é um ditador” acabaram restritas aos fãs locais que conheceram o grupo antes do país inteiro.

Quando as bandas de Brasília surgiram no cenário nacional com o nascente BRock, não foi surpresa que a Plebe assinasse com a EMI-Odeon (para onde, aliás, foram levados por recomendação de Renato Russo) para a gravação do primeiro disco. Surpresa foi a decisão de se produzir um EP, com apenas sete faixas, quando a Plebe já tinha canções suficientes para encher um disco inteiro – talvez a EMI não acreditasse muito no sucesso da banda planaltina, vai saber…

Herbert Vianna, também contratado junto com os Paralamas do Sucesso, da gravadora na época, ficou amigo da Plebe depois de saber que seu nome era citado em “Minha Renda” (‘Vou mudar meu nome para Herbert Vianna’) e assumiu a responsabilidade de produzir o álbum, dirigindo as sessões de gravação.

O Concreto Já Rachou conseguiu uma façanha impressionante para a Plebe Rude logo em sua estreia. Todas, absolutamente todas mesmo, as sete faixas tocaram nas rádios rock como a Fluminense FM e outras que davam muito espaço para os novos grupos brasileiros. O disco abre com dois sensacionais e até hoje atuais petardos: “Até quando esperar”, com direito ao auxílio luxuoso do cello de Jacques Morelembaum e a virulenta “Proteção”, que em tempos de ditadura moribunda ainda foi olhada de viés pela censura federal.

Também pudera… em seus versos, a indignação da letra demonstrava uma grande dose de ironia com os policiais, que pode perfeitamente ser vertida para o que se viveu ano passado na Bahia e no Rio de Janeiro. Lembram-se?

A PM na rua… nosso medo de viver
O consolo é que eles vão me proteger
A única pergunta é: me proteger do quê?
Sou a minoria mas pelo menos falo o que quero
Apesar da repressão
(Que é para sua proteção)

A Plebe botou o dedo na ferida também em “Johnny Vai À Guerra”, terceira faixa do disco e que a exemplo de “Proteção”, incomodou muita gente – daquela vez do Exército. Musicalmente, a influência punk é totalmente presente, pelos riffs de guitarra, a velocidade e a levada da bateria de Gutje em sintonia perfeita com o baixo de André X. “Sexo e karatê”, com participação de Fernanda Abreu, é a típica brincadeira adolescente entre o esporte da alcova e o karatê, coqueluche dos filmes de Bruce Lee que os rapazes da Plebe certamente viram nos anos 70.

A veia irônica do grupo pulsa como nunca em “Minha Renda” (‘Ambição… grana, fama e você’), uma das melhores faixas do álbum, como a subestimada e não menos excelente “Seu Jogo”, que metaforicamente homenageia o amigo do grupo Andre Pretorius, integrante do Aborto Elétrico, morto de overdose em 1983 e que se referia às perigosas viagens de heroína como um “orgasmo permanente”.

Na batalha onde não me alistei
Procuro um orgasmo permanente
Mas finalmente acho que encontrei
Fugindo é que você se sente
Na sua indecisão você não viu
E ninguém se importa com seu jogo
Você está em xeque-mate viu?
E o culpado é você!

O petardo final é “Brasília”, que com um bem-bolado efeito de canto e contracanto entre Philippe e “Ameba”, aponta as melhores e também as piores coisas da capital da República. É nela à qual os rapazes da Plebe se referem ao ‘Concreto Já Rachou’ que batiza o álbum. Logicamente, foi a música mais encrencada com a censura, mas a EMI, com jogo de cintura, fez a faixa ser liberada – mas com algumas restrições. A banda se vingaria logo no disco seguinte, Nunca Fomos Tão Brasileiros, de 1987, gravando “Censura”, uma cotovelada contra a perseguição que a Plebe viveu em seu primeiro disco.

Os 21 minutos e 32 segundos que duram o disco valem cada dinheiro investido nele. E representam uma época de ouro do rock nacional, onde além de provarem que se sabia fazer ótimas letras em português, Brasília também tinha alguns dos melhores grupos de punk rock do país.

Ficha Técnica de O Concreto Já Rachou
Selo: EMI-Odeon
Gravado em 1985
Produção: Herbert Vianna
Tempo: 21’32″

Músicas:

1. Até Quando Esperar (André X/Gutje/Philippe Seabra)
2. Proteção (Philippe Seabra)
3. Johnny Vai À Guerra [Outra Vez] (Plebe Rude)
4. Minha Renda (Philippe Seabra/Plebe Rude)
5. Sexo e Karatê (Jander Bilaphra/André X)
6. Seu Jogo (André X/Gutje/Philippe Seabra/Jander Bilaphra)
7. Brasília (Plebe Rude)

Comentários

  • Eis uma banda injustiçada. Ou melhor sub valorizada na época.
    Tem músicos ótimos e uma pegada muito forte e letras que – nos anos em que esteve na ativa – diziam muito.
    Hoje é estranho, soa envelhecido e datado. Vale sempre ouvir com nostalgia.

    • Posso discordar um pouco, Groo? Pode parecer que, esteticamente e musicalmente a Plebe pertença ao passado. Mas não há como negar que muitas das letras diziam – e ainda dizem – alguma coisa sobre este país e a vida que vivemos.

  • Eu sou fã incondicional dessas bandas da década de 80,até porquê vivi intensamente essa época,botava para rolar esses sons e saia para namorar no meu Passat Ts rebaixado,com dois elos e meio cortado da mola,pinturinha com as faixas e os emblemas do Ts,aro de variant ll pintado de preto com sobre aros ,faróis de milha da cibié serra dois,toca-fitas TKR “cara preta” equalizador tojo GR 100,tweeter ara 120 da Arlen mais par de 6×9 da Selenium,só no agudinho,tempos muito bom.Agora só não entendo que naquela época viviamos tão bem,nosso cotidiano era bom não tinhamos a internet sendo usada para o mal, guerrilheiros e bandidos existiam mas não era nem metade do que se tem hoje,drogas? rsrsrs só quem ia atrás tinha,era mais bebidas alcoólicas e cigarro,aquele que era na época “o sucesso”. festa rave,baladas? rsrsrs “novamente”, era o tempo também da disco-music,só curtição.tinhamos,nosso automobilismo campeoníssimo com Fittipaldi e Piquet ao qual iria se juntar,mais uma estrela ,o Senna tinhamos Interlagos inteiro sem mutilação e jacarepaguá tava lá sediando nosso GP de F1.Na política, o PT era o bicho oposição forte lutou contra os militares e tinha solução para todo tipo de mal e pregava rigor em todos os níveis da pirâmide social com a utopia de que seríamos todos iguais um dia. Agora eu pergunto cadê essa gente? Hoje temos problemas de todos os tipos e piores que naquela época e vamos gastar com copa e olimpíadas? cadê a seguraça (que morre mais gente todo dia no Brasil, mais que em país que tá em guerra)vamos ter no futuro comissão da verdade para apurar esses crimes?,e a educação dos jovens que serão adultos no futuro? cadê a igualdade social?onde estão os rebeldes da década de 70 e 80 ? estão anestesiados com que fizeram?

    • ¨Anestesia¨, seu nome é Brazil!Estamos num Estado semi-policial com trollagem oficial, e os antigos e novos defensores da liberdade de expressão caladinha.Concordo com vc Renato.Só discordo que o pt lutou contra os milicos.Na verdade prosperaram pq eram opção aos exilados que voltavam depois da anistia no fim do Regime militar.Desculpe falar de política, mas isso influenciou nosso automobilismo como vemos agora.A Plebe foi uma das bandas mais subestimadas do BRock.

  • Álbum fantástico. Um dos meus favoritos dentre os álbuns de bandas brasileiras, junto com Cabeça Dinossauro e Cinema Mudo

  • o jander mora na minha cidade em nova friburgo , em lumiar se não me engano tenho o cd ao vivo pelo menos das sete musicas desse album tem seis no ao vivo e é muito bom mesmo