Ao mestre, com carinho

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RIO DE JANEIRO – Estou devastado.

Acabo de saber via Miltão Alves da notícia da morte do querido Marcus 
Zamponi, o grande Zampa, um dos maiores jornalistas de automobilismo do país. Gravemente enfermo, sucumbiu a um câncer (sempre esta doença fatal…) e faleceu hoje em São José do Rio Preto, interior de São Paulo.

Batizado Marcus Cícero Zamponi há 63 anos (ainda tinha muita estrada pra percorrer, pombas…), o “gordo”, como era conhecido por todos nós, era um tarado pelo esporte que amamos. Talvez o mais tarado dentre os que conheci. Um apaixonado que largou tudo no Brasil, o Rio de Janeiro e a Ilha do Governador e se aventurou trabalhar para escroques como Max Mosley e Sandro Angeleri, seus patrões na March nos anos 70.

Certamente aprendeu um bocado, viu e ouviu muita coisa e compartilhou grandes, maravilhosas histórias como uma de um teste onde o Vittorio Brambilla, após comer dois pratos inteiros de massa e beber uma garrafa inteira de vinho, inconformado com um piloto que quebrara sua marca num teste de Fórmula 1, entrou no carro para melhorar o tempo e… bateu. Mais Brambilla – e mais Zampa – impossível.

Nos anos 80, quando comecei, taradinho de dez, onze anos que já era por automobilismo, a comprar os exemplares da Auto Esporte (não perdia um), cuja editora era na Felisbelo Freire, em Ramos, bairro onde nasci e cresci, achava do cacete os textos do Zampa. Sem desmerecer ninguém da área, e acho que todos concordam, o melhor texto do jornalismo automobilístico brasileiro em qualquer tempo. Escreveu páginas inesquecíveis do nosso esporte. E até arriscou algumas incursões como repórter em provas da Stock Car, na Bandeirantes. Acho que o próprio Zampa viu que não era do ramo e seguiu com sua pena ainda mais afiada.

Trabalhou com tudo que estivesse ao seu alcance, com a competência que Deus lhe premiou. Desconheço algum colega da imprensa que não gostasse daquela figura engraçada que não perdoava ninguém. Nem mesmo o compadre Lito Cavalcanti, de quem falava “cobras e lagartos”, mas pelas costas – claro – porque cara a cara, a admiração saltava aos olhos e era, certamente, recíproca.

Eu não sei precisar em que corrida nos conhecemos. Provavelmente lá pelo fim dos anos noventa e aqui no Rio de Janeiro. Guardo com carinho as intermináveis gozações do Zampa para comigo e com o Amir Nasr. A nós, netos e descendentes de libaneses, ele não perdoava e, abusado, chamava nós dois de “turcos filhos da puta”, com aquela voz de baixo profundo que era uma marca registrada nos autódromos. Ele cutucava na ferida da nossa origem porque sabia que nós detestamos ser chamados de turcos. Mas tínhamos que levar na esportiva. O Zampa era assim, um tirador de sarro por excelência.

Foi aquela figura que, numa premiação do Capacete de Ouro da revista Racing, da qual foi colaborador até os últimos dias de sua vida, que me chamou num “particular” e disse pra eu liderar uma salva de palmas – de pé – para o querido Luiz Pereira Bueno, o saudoso “Peroba”. Não me fiz de rogado. Quando o Luizinho foi chamado ao palco, levantei-me da minha cadeira e o aplaudi de pé. Quase todo mundo no recinto fez o mesmo, emocionando o “Peroba”.

Hoje, quem merece o nosso aplauso é o Zampa. O nosso aplauso e o nosso agradecimento, por tudo o que fez no jornalismo esportivo. Um mestre ao escrever, um cara de quem todos nós vamos guardar as melhores e mais divertidas lembranças. Porque o que se leva da vida é o que a vida tem de melhor.

Zampa, muito obrigado. Você foi inspiração para muitos de nós. Com certeza, da minha parte, nunca vou esquecer dos papos que tivemos. E com sua morte, meu caro, se vai uma grande parte das histórias do nosso automobilismo.

Aliás, concordo ipsis litteris com o craque da fotografia, Luca Bassani.

“O automobilismo acordará mais burro amanhã”.

Valeu, mestre! Vá em paz…

(Foto de Vinícius Nunes)

Comentários

  • Gênio. Simples assim!!

    A gente sabe que um dia todos vão, mas não há como se entristecer vendo apenas os bons subindo para o andar de cima!!

    Belo texto, xará. E sim, também estou triste!!

  • Rodrigo lindo texto. Realmente não havia quem não gostasse do gordo. Sacadas e sacanagens em doses perfeitas num equilíbrio único. Grande abraço

  • Perfeito, Rodrigo. Em termos de RGS, nunca ouvi jornalista da área automotiva endereçar comentários negativos para o Zampa. Particularmente, sinto imenso orgulho pelas oportunidades profissionais que ele me acenou. Evidente, desde já, imenso ‘feeling’ de saudade.

  • Que merda….um puta jornalista de automobilismo…conhecia a fundo …viu o Alex chegar para um teste na March na F3…acho que trabalhou na Polar….contava boas histórias..como em 78 nas 24 Horas de Le Mans com Paulão, Guaraná e Cia…pqp….que merda…e ainda por cima temos de engolir hoje em dia coisas do tipo ” Fettel” , RBR , STR..pqp mesmo…

  • Essa terça-feira começou triste prá quem gosta de corridas. Não à toa, chove prá burro aqui no Rio… Valeu, Zampa, obrigado por tudo que nos deu em seus textos, por todo o humor e conhecimento.
    Belíssima homenagem, Rodrigo.

  • A coluna do zampa sempre foi a primeira coisa que eu li em todas as Racing que tive! Vai fazer falta…

    Quem sabe a racing nao poderia incluir na premiaçao do capacete, o trofeu marcus zamponi para os jornalistas do automobilismo…

  • Perda irreparável mas que muito contribuiu para o automobilismo com seu ponto de vista e seus maravilhosos textos. Nos anos em que disputei posições na Stock Car, aprendi e me diverti muito com suas famosas histórias contadas em rodas atrás do Box.
    Valeu Zampa.

  • Sinceramente, não sei o que falar depois de ver isto… O que me cabe dizer é: vá com Deus, Zampa!!! Seu corpo se foi, mas sua alma, seus textos e crônicas maravilhosas (que aprendi a ler com muito entusiasmo na “Racing”) ficarão eternamente aqui. Esse cara, realmente, soube viver.

  • Lindo texto Rodrigo,fez a sintese do que era esse grande cara.
    Muitas ve.zes eleme dizia,vamos chamar o rodrigo de Turco que ele fica puto.
    Mas vc sabe que no fundo ele te admirava!!
    Valeu

    • Eu só ficava puto no começo. Depois me acostumei. Ao Amir (Nasr) ele também destinava o mesmo tratamento. O Zampa só zoava quem ele gostava.

  • Triste notícia.Quando comprava a revista Racing era uma das primeiras coisas que procurava pra ler.Me divertia e me alimentava de historias dos bastidores dos tempos heroicos do automobilismo.Nunca me esqueci da história que contou de um jornalista brasileiro, metido a esperto, que num GP de Monaco entrevistou David Niven pensando ser Grahan Hill.E o pior que cada pergunta do tal reporter fazia questão de chamar o ator de Mister Monaco, :)simplesmente impagável.Que Deus o tenha.Não só ficou mais burro , o automobilismo.Tambem ficou mais mal humorado e politicamente correto.

  • Sem palavras…uma perda irreparável…li muitas histórias nas revistas Racing (minha preferida foi “Senna x Piquet”, de 2006) e também na Speedway, revista que as vezes era bimestral, outras trimestral…que encontre a paz, Zampa…você foi o melhor de todos!!!!!!!
    Rodrigo, parabéns pelo texto e homenagem.