Sir Jack Brabham (1926-2014)

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Cena rara: Black Jack sorri após mais um triunfo; foram 14 vitórias em 123 GPs disputados

RIO DE JANEIRO – A Fórmula 1 e o automobilismo mundial estão mais uma vez de luto. Morreu uma personagem lendária, único da história da categoria máxima a ganhar como piloto e construtor. Não era dos mais consagrados e celebrados do seu tempo quando se tratava de guiar um carro de corrida, porque seu estilo era mais, digamos assim, “duro” do que os demais colegas. Mas foi brilhante e conquistou três títulos mundiais. Aos 88 anos de idade, Sir Jack Brabham sai da vida e entra para a eternidade. Ele estava gravemente enfermo há anos e morreu em casa, neste dia 19 de maio.

Nascido John Arthur Brabham em Hurstville no dia 2 de abril de 1926, na região de Nova Gales do Sul, ele começou a se distinguir no automobilismo com uma idade não tão avançada quanto alguns que brilhavam no esporte, mas que hoje o fariam um ‘velho’ nas pistas. Aos 29 anos, estreou na Fórmula 1 pilotando um Cooper T40 com um pequeno motor Bristol, no GP da Inglaterra. Não fez nada de extraordinário pelos três anos seguintes – e na temporada de 1958, já correndo pela equipe oficial de fábrica dos irmãos John e Charles Cooper, marcou os primeiros pontos com um 4º lugar no GP de Mônaco.

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Acelerando o Cooper-Climax no GP da Holanda de 1959, em Zandvoort

No ano seguinte, a Cooper inovaria ao lançar o primeiro carro de Fórmula 1 com motor central-traseiro, o que fez os demais construtores aposentarem rapidamente seus roadsters com motores dianteiros. Jack, que não dava espetáculo e primava pela regularidade, adaptou-se rápido ao modelo T51. Venceu em Mônaco e na Inglaterra e, para ser campeão na última prova do ano, nos EUA, precisou do muque: sem combustível, empurrou seu bólido por 300 metros para cruzar a linha de chegada, receber a quadriculada em 4º lugar e se consagrar o primeiro australiano campeão mundial de Fórmula 1.

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Com os carros dos irmãos Charles e John Cooper, o australiano foi bicampeão em 1960

Muitos acharam que o acaso tinha definido o título em favor de Brabham. E esses muitos certamente ficaram aparvalhados quando ele surgiu na temporada de 1960 com cinco vitórias – consecutivas, aliás – que lhe deram o bicampeonato antecipado a bordo do Cooper T53. No ano seguinte, marcou apenas 4 pontos e foi um esquálido 11º colocado no Mundial de Pilotos. A cabeça de Jack estava voltada para outro objetivo: tornar-se construtor.

Antes disso, ele disputara as 500 Milhas de Indianápolis de 1961 com um Cooper equipado com um motor 2,7 litros que arrancou sonoras risadas dos ianques, acostumados com seus carros mais possantes. Tiveram que engoli-lo terminando a prova em 9º lugar.

O sonho de construir seu próprio carro não era novo: Brabham conhecia um engenheiro talentoso, chamado Ron Tauranac, proveniente da Nova Zelândia. Juntos montaram uma sociedade e em 1962, começaram a produzir os primeiros Brabham, sob o nome Motor Racing Developments (MRD).

Os motores da Fórmula 1 obedeciam à cilindrada máxima de 1,5 litro e a opção foi pelo Climax FWMV V8 quando o primeiro modelo, o BT3, ficou pronto. Mas Brabham só venceria sua primeira prova como construtor em 1964, graças a Dan Gurney, no GP da França, disputado em Reims-Guex. Para 1966, estava prevista uma nova alteração: os motores ganhariam o dobro da cilindrada e passariam a ter 3 litros de capacidade cúbica.

Neste interregno, Jack encomendou um projeto a um jovem engenheiro mecânico chamado John Judd, então com 22 anos: com base em blocos Oldsmobile V8, Judd projetou e construiu os primeiros motores Repco-Brabham que equipariam os carros do time dentro do novo regulamento.

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A bordo do Brabham-Repco: aos 40 anos, era campeão como piloto pela terceira vez e como construtor

Por ser o piloto e também o construtor mais bem preparado para as novas regras, Jack, então com 40 anos, emplacou quatro vitórias seguidas que o impulsionaram a um histórico tricampeonato. Não existira – e até hoje não existiu – ninguém na Fórmula 1 que ganhou como construtor e como piloto. E quase que ele repete a façanha em 1967: foi vice-campeão atrás do companheiro de equipe Denny Hulme.

De repente, os motores Repco-Brabham tornaram-se pouco competitivos e Jack fez apenas dois pontos no Mundial de 1968, terminando o campeonato daquele ano num horroroso 23º lugar. No ano seguinte, com Jacky Ickx substituindo Jochen Rindt, o rendimento dos carros melhorou graças à opção pelos Cosworth. Mesmo sem disputar três provas, o velho Jack, aos 43 anos, ainda foi 2º colocado no GP do Canadá e terceiro no México.

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Em 1970, perdeu duas corridas quase ganhas; uma delas foi o GP de Mônaco, nas ruas de Monte-Carlo

Anunciou sua despedida definitiva das pistas em 1970, quando tinha como objetivo conquistar o quarto título e se retirar “por cima”. E quase conseguiu: venceu na abertura do campeonato em Kyalami, mas foi vítima da má sorte em Mônaco, quando bateu a 300 metros da chegada e em Brands Hatch, quando ficou sem combustível. Ambas as provas foram vencidas por Jochen Rindt, campeão post-mortem. Brabham fechou o ano com 25 pontos, em 6º lugar no campeonato.

Pouco depois, Jack surpreendeu todo mundo: sua aposentadora não era apenas como piloto – e sim como dono de equipe. A Brabham foi vendida a Ron Tauranac e, posteriormente, Bernie Ecclestone tomou o time para si, trazendo de volta a escuderia aos holofotes. Com pilotos como Carlos Reutemann, José Carlos Pace e posteriormente Niki Lauda e Nelson Piquet, vieram vitórias e o título mundial do brasileiro em 1981 e 1983. A Brabham, como escuderia, passou de mão em mão depois que Ecclestone deixou-a de lado e encerrou suas atividades em 1992.

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Jack Brabham deixou o legado de uma equipe que fez história na F-1 nas mãos de Bernie Ecclestone a partir de 1972

Sir Jack Brabham teve três filhos – Geoff, Gary e David Brabham – todos pilotos. Mesmo aposentado e afastado, ainda dava contribuições valiosas ao esporte. Em 1978, quando o filho Geoff disputava a Fórmula 3, ele assistia uma prova da categoria na Inglaterra ao lado de Bob Sparshott, dono da pequena equipe BS Fabrications, que alinhavam em caráter particular os McLaren M23 na Fórmula 1. Procurando jovens valores para testes e um possível contrato, Sparshott perguntou sobre Geoff e em troca, ouviu o seguinte:

“Se eu fosse você, contratava aquele brasileiro ali”.

Apontou um carro amarelo com patrocínio Arno/Brastemp que arrasava a concorrência e rumava para mais uma vitória.

Não preciso dizer de quem se tratava: foi Black Jack quem abriu para Nelson Piquet os caminhos na Fórmula 1 e, além de pilotar para a equipe que levava o nome do australiano, o futuro tricampeão tinha em Brabham o seu maior ídolo no automobilismo, admirando-o pelo conhecimento mecânico e pelos seus feitos no esporte, hoje celebrados, rememorados e eternizados.

Comentários

  • Como bem foi dito,o grande Jack deixou a vida,para entrar na eternidade.É uma das figuras que mais admiro na história da F-1.Entre outras coisas,por ter sido o criador da “minha” equipe.Que descanse em paz.

  • Muito 10, essa dele indicar o Piquet para ser contratado, pude conhecer o David nas 6 Horas de São Paulo, ele pode não ter sido tri como o pai, mas não é todo mundo que ganha Le Mans duas vezes, e em categorias diferentes, em 2007, com o Aston Martin DBR9 e em 2009 como o fantástico Peugeot 908 HDI FAP.

  • Gênio, a simbiose piloto-engenheiro-mecânico mais perfeita que já existiu e realmente e seu sucessor quanto á filosofia de trabalho de um piloto foi Piquet.
    Viveu a grande aventura do automobilismo romântico e agora parte para a eternidade em paz e com o dever cumprido.

  • Quando alguém,diz¨fulano foi o maior piloto de f1 de todos os tempos¨, eu fico pensando poxa será quê esse cara não conhece a história da F1.Vai lá no início pesquisa na web,procura revistas,compare os tempos.Gente igual a esse Brabham,é gente quê faz,ou melhor agora é gente quê fez,e nos deixou seu legado.

  • Como na época dele não tinha essa mídia toda em cima da F1 ele nunca fez parte da lista dos melhores da história, o que é de uma injustiça tremenda. Fosse inglês ou tivesse corrido por time da Ilha era idolatrado até hoje, como é o Clark e outros menos competentes que o escocês. Meus respeitos a esta legenda.

  • Primeiramente parabéns pelo texto e pelo blog o qual gosto muito! Tem algo errado na legenda da segunda foto, pois no GP da Holanda de 59 ele correu com o #8. Esta foto foi em Aintree ou Monza no mesmo ano de 1959. Um abraço!