Quatro ases e um coringa

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Daniel Ricciardo exulta com sua segunda vitória na Fórmula 1; australiano é o 3º no Mundial de Pilotos

RIO DE JANEIRO – Raras foram as corridas na Hungria que foram realmente boas. Desde 1986, contamos nos dedos que provas naquele circuito travado e hoje superado para a Fórmula 1 ficaram na memória dos aficionados. Para os brasileiros, talvez a corrida inaugural em que Piquet passou Senna por fora tenha esse caráter. Os espanhóis sempre se lembrarão da primeira vitória de Alonso, enquanto os súditos de Sua Majestade jamais esquecerão do que Jenson Button fez em 2006. A vida é assim.

Só que a corrida deste domingo foi excelente. Talvez o melhor GP da Hungria de todos. Talvez uma das melhores provas da temporada 2014, rivalizando com o Bahrein. A chuva e outros aditivos deram um caráter todo especial, salvando o domingo da monotonia que se antevia com a pole de Nico Rosberg na véspera.

Se houvesse combinação, Bernie Ecclestone teria dito a Marcus Ericsson o seguinte: “Filho, você já tem um carro ruim, sua equipe acabou de ser vendida. Então arrebente essa carroça no guard-rail que nós chamamos o Safety Car. Aí uma turma faz a parada nos boxes, outros não e aí vamos ver se essa bagaça ganha um pouco de emoção. Combinado?”

Lógico, é um diálogo inverossímil, mas foi o acidente do piloto da Caterham que mudou os rumos da corrida já dominada com alguma facilidade por Rosberg. A pista, molhada pelas chuvas que caíram mais cedo no dia da corrida, já secava e quase todos trocaram de pneus intermediários para slicks. Menos a dupla da McLaren.

Além de Ericsson, Romain Grosjean bateu também. E – pior – durante a neutralização da disputa, o que tornou as coisas ainda mais ridículas para o piloto da Lotus, claro. A partir da relargada, assistiu-se à gangorra da classificação, variando conforme as condições e as estratégias das equipes.

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Ao bater na 22ª volta, Sergio Pérez provocou a segunda entrada do Safety Car no GP da Hungria

Ninguém combinou, é claro, mas Sergio Pérez também contribuiu para mudar os rumos da corrida, com uma baita pancada no muro interno dos boxes na 22ª volta. O carro de segurança voltou de novo e aí alguns pilotos optaram por parar nos boxes – entre eles os dois primeiros, Daniel Ricciardo e Felipe Massa.

Sem nada a perder, a Ferrari optou por manter Fernando Alonso na pista, com o francês puxando o pelotão que tinha ainda Jean-Éric Vergne, da Toro Rosso, as Mercedes de Rosberg e de Lewis Hamilton que, é bom lembrar, partira dos boxes, em último – e Sebastian Vettel com a Red Bull.

O tetracampeão mostrou a Pérez como evitar uma colisão no muro dos boxes, salvando de forma sensacional uma rodada que poderia ter significado a terceira entrada do Safety Car na pista. Quase ao mesmo tempo, o pole Rosberg buscava os boxes para mais uma parada para troca de pneus.

As variáveis da classificação apresentaram até Hamilton líder (por uma volta, é verdade) e Ricciardo de volta ao comando até o último pit do australiano, na 54ª volta. O Risada regressou à pista em quarto e deu, em quinze giros, um dos maiores espetáculos do ano.

Contou-me um amigo de Fox Sports que o Reginaldo Leme tinha certeza perto do fim da corrida que Ricciardo venceria, porque tinha pneus mais novos e era muito mais rápido que seus adversários à frente de si. Para o jornalista – e para muitos no circuito – ficou claro que a Ferrari arriscou demais manter Alonso na pista por tantas voltas com o mesmo jogo de pneus e que Hamilton, ao optar por uma tática praticamente semelhante, só tinha a lucrar chegando à frente de Nico Rosberg.

E quase que isto não acontece: a equipe alemã ditou ordens para que Lewis “deixasse” Rosberg passá-lo. O britânico, com alguma razão, revelou-se ‘chocado’ e o companheiro de equipe não gostou do que aconteceu. Afinal, foram mais alguns pontos descontados (três, para ser exato) e que deixam os dois separados por 11, antes das férias de verão pré-GP da Bélgica.

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Contrastes no pódio em Budapeste: um Alonso extenuado, um Ricciardo rindo como se não houvesse amanhã e um Hamilton visivelmente de cara amarrada (Foto: Mark Thompson/Getty Images)

Lewis ignorou as ordens, chegou em terceiro e seu semblante no pódio contrastava com o evidente cansaço de Fernando Alonso em ter ido longe demais com um carro igualmente longe de ser competitivo e com a alegria incontida de um Daniel Ricciardo que guiou feito gente grande para conquistar sua segunda vitória na Fórmula 1.

“Sabemos hoje quem lidera a equipe Red Bull”, alfinetou Alonso após a corrida, num recado direto a um Vettel que não foi além de um pouco brilhante 7º lugar, resultado que o deixa em sexto no campeonato – atrás até de Valtteri Bottas, da Williams.

Sobre os demais pilotos, é preciso dizer inclusive que Felipe Massa teve um bom resultado, comparado – claro – ao que o piloto vem conseguindo ao longo de um ano em que esteve fora dos pontos por seis vezes. Some-se a isso o fato de que o carro da Williams não foi competitivo em ritmo de corrida e que nem o assoalho novo fez a diferença – tanto que Bottas foi oitavo. Hungaroing não é uma das pistas mais agradáveis para o FW36 e marcar pontos foi lucro.

Perto do que vem fazendo num ano medíocre, Kimi Räikkönen foi excelente ao chegar em 6º – que inacreditavelmente é o melhor resultado do finlandês em 2014. Jean-Éric Vergne andou bem o bastante para somar dois pontos e Jenson Button, prejudicado pela tática inicial da McLaren em manter os pneus intermediários em favor dos slicks, ainda marcou um solitário pontinho numa prova que ganhou duas vezes.

A Fórmula 1 faz uma pausa e vamos ver se a Mercedes vai repensar a hierarquia do time, impondo uma condição de primeiro e segundo piloto ao invés de colocar seus dois contratados em confronto direto. Lewis Hamilton não gostou do que aconteceu na Hungria. Nico Rosberg também não. E algumas cabeças pensantes do time, como Toto Wolff, acham que Nico poderia ter vencido neste domingo.

Será? Possível, é verdade. Mas ninguém pode reclamar de uma coisa: a vitória do Risada dá um novo alento a um campeonato dominado pela estrela de três pontas e acirra ainda mais a rivalidade entre os antigos amigos e companheiros de time desde os tempos do Kart.

Comentários

  • Uma coisa é certa; Mesmo que Rosberg seja campeão ao final da temporada, Lewis provou, mais uma vez, que é mais piloto que ele (vide Bahrein). Mostrou ainda, o que Felipe (é assim que a transmissão se refere ao Massa agora…), o que ele deveria ter feito no episódio “Alonso is faster then you”. Hamilton também mostra descontentamento, mas o direciona somente a atitudes como esta, além da sequência de incidentes normais de corrida, mas que ocorrem somente no carro dele…jamais no de Nico. No mínimo, estranho.

  • Caro Rodrigo,
    Antigamente, muito antigamente, a 4 Rodas dava nota pelo desempenho dos pilotos após as corridas. Imitando a revista eu daria 10 para os três pilotos que subiram ao pódio. Acho que o Rosberg mereceria uns 6 por querer aplicar um “Fernando Is Faster Than You” em cima do “comandante hamilton” td bem que ele é o lider do mundial (por méritos próprios), mas como diz um certo locutor esportivo Alonso é Alonso. Para Romain Grosjean que bateu sozinho, no mesmo ponto que Ericsson em regime de Safety Car sua nota só poderia ser 0. Talvez o problema do
    Grosjean é que ele tem andado muito com Maldonado. Vc não acha?