40 anos do bi, parte V – GP da Bélgica de 1974

Belgica 74 6
O poster promocional da prova de Nivelles

RIO DE JANEIRO – O primeiro terço do Mundial de Fórmula 1 de 1974 foi atingido no GP da Bélgica. Sede da prova em 1972, o circuito de Nivelles-Baulers, de ótimas instalações na época e muito seguro, fez com que os pilotos remanescentes do campeonato anterior não sentissem nenhuma saudade de Zolder, com suas curvas apertadas, chicanes travadas e o asfalto que soltava pedaços que voavam perigosamente em direção aos capacetes dos pilotos.

O traçado de 3,724 km de extensão acabaria por se tornar o palco de uma corrida histórica para a categoria. Nunca mais vimos um grid como aquele que alinhou em 12 de maio, há quatro décadas: os organizadores aceitaram um total de 32 inscrições – e dependendo do desempenho de cada um nos treinos, todos largariam, o que superaria os 30 carros que alinharam no GP da Alemanha de 1952, até então o maior grid registrado numa prova de F-1.

Na verdade, a lista de inscritos contemplava mais nomes. Houve algumas desistências pelo caminho, como a do helvético Silvio Moser, do piloto-construtor John Nicholson – que tentava emplacar seu Pinch-Lyncar e de Chris Amon, ausente para tentar melhorar os defeitos do Amon AF101 que estreara sem muito sucesso em Jarama, no GP da Espanha.

As novidades eram várias: Gijs Van Lennep, reconhecido como piloto “top” de Endurance, foi indicado por Frank Williams para retornar à categoria no Iso-Marlboro #21. A Ensign regressava com o novo N174, o australiano Vern Schuppan e o patrocínio da Theodore Racing, do milionário oriental Teddy Yip, de Hong Kong. A Brabham inscreveu um terceiro carro, modelo BT42, para Teddy Pilette. Num bólido idêntico, Gérard Larrousse foi inscrito pela Scuderia Finotto e a AAW Racing Team, da Finlândia, alinhava Leo Kinnunen, o último piloto da história a usar capacete com óculos de proteção.

Outra estreia em Nivelles foi a do Token RJ02. A história desse bólido, todos já conhecem. Os proprietários do pequeno time britânico, Tony Vlassopoulo e Ken Grob, ofereceram uma oportunidade ao jovem Tom Pryce, oriundo da Fórmula 3, para estrear na categoria máxima.

Terceiro colocado do Mundial de Pilotos com 13 pontos, Emerson Fittipaldi tinha um carinho especial pela pista de Nivelles. Afinal, dois anos antes, fora naquele circuito em que o brasileiro, então na Lotus, conquistou uma das cinco vitórias que o levaram ao título. Portanto, mesmo a bordo da McLaren M23, ele era apontado como um dos favoritos à vitória. E seria uma corrida importante, pois o escritório europeu da Texaco, copatrocinadora da equipe de Emerson, era justamente na Bélgica e o principal dirigente, John Goossens, também era belga.

O treino de classificação que definiu o grid foi, no mínimo, polêmico. A moderna aparelhagem eletrônica do circuito de Nivelles não funcionou direito e todo mundo voltou à aferição manual. E aí deu-se a bulha: Clay Regazzoni teve o tempo aferido de 1’09″82 – um segundo inteiro mais rápido que o segundo colocado, o sul-africano Jody Scheckter. É claro que houve protestos, mas os organizadores puseram o galho dentro e confirmaram a pole para o suíço da Ferrari. Engraçado que entre Scheckter e o 12º colocado Denny Hulme, todos estavam dentro do mesmo segundo, o que só aumentou as suspeitas de favorecimento a Regazzoni.

Emerson Fittipaldi conseguiu a quarta posição do grid, com o tempo de 1’11″07, apenas três décimos mais lento que Niki Lauda. Ronnie Peterson foi o quinto com a Lotus 76, seguido por Arturo Merzario, Jean-Pierre Beltoise e José Carlos Pace, fazendo milagres com o Surtees TS16 equipado com pneus Firestone. O favorito da torcida, Jacky Ickx, desapontou ao marcar o 16º tempo e Carlos Reutemann, vencedor na África do Sul, enfrentou uma série de problemas nos treinos e ficou apenas em vigésimo-quarto. Dos 32 que treinaram, somente Leo Kinnunen não obteve qualificação para o GP da Bélgica.

1974_belgian_grand_prix_start_by_f1_history-d5iduiy
Imagem da largada, com Regazzoni, à esquerda, lado a lado com Scheckter antes da freada da primeira curva

Na largada, Regazzoni tirou partido da pole e assumiu a liderança. Emerson ganhou de saída uma posição e ainda na primeira volta desbancou Scheckter da segunda posição. Lauda não largou bem, sendo superado por Ronnie Peterson. Quem vinha atrás do austríaco era James Hunt, com o Hesketh. Mas a Ferrari #12 rapidamente começou a avançar, deixando Peterson e Scheckter para trás.

Os retardatários começaram a desempenhar um papel fundamental na disputa quando Lauda, ao tentar se livrar de um concorrente mais lento, comete um pequeno deslize e Scheckter recupera a 3ª posição. Sete voltas depois, o austríaco deu o troco no sul-africano da Tyrrell. Por seu turno, Regazzoni se mantinha à frente de Fittipaldi, que já pressionava o suíço com o intuito de fazê-lo errar e assim ganhar a liderança.

1974_belgian_grand_prix_by_f1_history-d6qs2xz
Até a 39ª volta, Regazzoni se manteve à frente de Emerson; depois, a história seria diferente… bem diferente

E foi exatamente o que aconteceu: na 39ª volta, Rega se atrapalhou ao tentar superar um carro mais lento e bobeou. Emerson agradeceu e assumiu a primeira colocação. Lauda também deixaria o companheiro de equipe para trás e iniciaria a temporada de caça à McLaren #5. Naquela altura, Ronnie Peterson já havia ficado pelo caminho com a Lotus 76 e James Hunt também. Com 50 voltas, os seis primeiros eram Emerson, Lauda, Rega, Scheckter, Patrick Depailler e Jean-Pierre Beltoise. Logo depois, o francês da Tyrrell era obrigado a desistir, abrindo caminho para Denny Hulme entrar na zona de pontos.

Formula One World Championship
Lauda botou muita pressão em Emerson, mas o brasileiro resistiu e venceu por 35 centésimos apenas

As últimas voltas foram de tirar o fôlego, pois Lauda atacava Emerson ferozmente e, mesmo com a intensa pressão do austríaco, o brasileiro – ao contrário de Regazzoni – não cometeu nenhum erro. Emerson venceu ao fim de 85 voltas com a escassa diferença de 35 centésimos de segundo para o rival da Ferrari. E com o triunfo, assumiu a liderança do campeonato, com 22 pontos, um à frente de Lauda.

44 podio
Sorriso escancarado e liderança do campeonato para o Rato

Regazzoni, que caiu para 3º no campeonato, poderia ter ido ao pódio, não fosse uma surpreendente pane seca que o fez perder a posição para Jody Scheckter na última volta. O sul-africano chegou ao seu primeiro pódio na F-1. Jean-Pierre Beltoise conquistou outro bom resultado com a BRM e Denny Hulme, autor da melhor volta da prova, chegou em sexto. José Carlos Pace desistiu na 50ª volta, queixando-se de vibrações em seu Surtees.

A revista brasileira Auto Esporte, nos seus áureos tempos, estampou profética manchete sobre a corrida da Bélgica.

“Pintou o campeão”.

O resultado final:

1º Emerson Fittipaldi (McLaren), 85 voltas em 1h44min20seg57, média de 182,019 km/h
2º Niki Lauda (Ferrari), a 0seg35
3º Jody Scheckter (Tyrrell), a 45seg61
4º Clay Regazzoni (Ferrari), a 52seg02
5º Jean-Pierre Beltoise (BRM), a 1min08seg05
6º Denny Hulme (McLaren), a 1min10seg54
7º Mike Hailwood (McLaren), a uma volta
8º Graham Hill (Embassy-Lola), a duas voltas
9º Vittorio Brambilla (March), a duas voltas
10º Tim Schenken (Trojan), a duas voltas
11º John Watson (Brabham), a duas voltas
12º Guy Edwards (Embassy-Lola), a três voltas (vazamento de combustível)
13º Jean-Pierre Jarier (Shadow), a três voltas
14º Gijs Van Lennep (Iso-Marlboro), a três voltas
15º Vern Schuppan (Ensign), a três voltas
16º François Migault (BRM), a três voltas
17º Teddy Pilette (Brabham), a quatro voltas

Não completaram:

18º Brian Redman (Shadow), 80 voltas (motor)
19º Jacky Ickx (Lotus), 72 voltas (superaquecimento)
20º Tom Pryce (Token), 66 voltas (acidente)
21º Carlos Reutemann (Brabham), 62 voltas (tubo de combustível)
22º Ronnie Peterson (Lotus), 56 voltas (vazamento de combustível)
23º Gérard Larrousse (Brabham), 53 voltas (pneu)
24º Jochen Mass (Surtees), 53 voltas (suspensão)
25º Patrick Depailler (Tyrrell), 53 voltas (freios)
26º José Carlos Pace (Surtees), 50 voltas (vibração)
27º Rikki Von Opel (Brabham), 49 voltas (pressão de óleo)
28º James Hunt (Hesketh), 45 voltas (suspensão)
29º Arturo Merzario (Iso-Marlboro), 29 voltas (transmissão)
30º Henri Pescarolo (BRM), 12 voltas (acidente)
31º Hans-Joachim Stuck (March), 6 voltas (embreagem)

Volta mais rápida: Denny Hulme, na 37ª – 1’11″31, média de 188,002 km/h

Comentários