Equipes históricas – Tyrrell, parte VI

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Sem Stewart e Cevert, Ken Tyrrell trouxe para 1974 uma dupla nova: Patrick Depailler e Jody Scheckter

RIO DE JANEIRO – Após exatamente um mês de pausa, que incluiu as férias do blogueiro, a série Equipes Históricas está de volta com a sexta parte da história da Tyrrell. No último post, publicado em 18 de novembro, relatei o que ocorreu com a escuderia inglesa em 1973, ano de triunfo e tragédia, com o tricampeonato de Jackie Stewart e a perda lamentável do talento de François Cevert, aos 29 anos de idade.

Sem “Le Patron”, que já se aposentaria – e muito menos sem o piloto que estava preparado para ser seu sucessor, Ken Tyrrell estava teoricamente em maus lençóis. Até o fim daquele ano, ele tinha pouco tempo para resolver sobre uma nova dupla para a temporada de 1974, a primeira sem o Escocês Voador desde a fundação da escuderia.

Como tinha o patrocínio da Elf, Ken não podia abrir mão de um piloto francês e rapidamente chegou-se a um consenso: Patrick Depailler, com os mesmos 29 anos de Cevert, rápido e impetuoso, foi alçado à condição de piloto titular. O segundo cockpit ficou com a escolha mais criticada: o sul-africano Jody Scheckter, conhecido pelo nada singelo apelido de “Troglodita”, teria sua primeira oportunidade numa temporada completa após mostrar muita velocidade com um terceiro carro da McLaren, além de se envolver em algumas polêmicas com Emerson Fittipaldi, François Cevert e Graham Hill, sem contar o acidente monumental que provocou em Silverstone-73.

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Nenhum dos pilotos gostava do Tyrrell 006, mas pelo menos Depailler fez um pontinho com ele no GP da Argentina

O começo do campeonato para a nova dupla não seria dos mais fáceis. Enquanto o novo carro previsto para a temporada de 1974 não ficava pronto, a Tyrrell teria o chassi 006 com suspensão de barras de torção, o que desagradava tanto a Jody quanto a Depailler. Os dois não se adaptavam ao entre-eixos curto do carro e o 007 seria tanto mais longo que o antecessor como viria com uma suspensão dotada de molas helicoidais.

A estreia foi discreta: Depailler pescou um pontinho com o 6º lugar no GP da Argentina e a junta do cabeçote do motor do carro de Scheckter fundiu na 25ª volta. Duas semanas após, no GP do Brasil, o francês chegou apenas em oitavo e o sul-africano foi um apagado 13º.

No GP da África do Sul, Depailler optou por andar com o chassis do 005, usado também em 1972, cujas características eram mais do seu agrado. Mesmo largando em 15º, bem atrás de Scheckter – que, é bom lembrar, corria em casa – o francês chegou em quarto e somou mais três pontos no campeonato. Jody foi apenas o oitavo e o placar de pontos mostrava 4 x 0 para Depailler.

Mas na Espanha, em Jarama, a Tyrrell finalmente pôs para jogo o novo carro: o modelo 007, mais moderno e diferente não só no design como na suspensão, ficou pronto apenas para Jody Scheckter. Numa corrida complicada pela presença da chuva no início, o sul-africano marcou os primeiros pontos dele na Fórmula 1, chegando em quinto, duas voltas atrás do vencedor Niki Lauda. Depailler foi o oitavo.

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O primeiro pódio do “Troglodita” Scheckter foi no GP da Bélgica, em Nivelles: 3º lugar

Em Nivelles, no GP da Bélgica, Scheckter teve desempenho excelente desde os treinos. Não fosse um crasso erro do sistema de cronometragem, não seria disparate algum dizer que a pole poderia ter sido do sul-africano, que acabou ao final das contas largando em 2º. Seu primeiro pódio foi ofuscado pela luta titânica pela vitória entre Emerson Fittipaldi e Niki Lauda. Acabou em 3º, enquanto Depailler desistiu na 53ª volta com problemas de freios.

Monte-Carlo poderia ter sido a primeira pista a ver os dois pilotos da Tyrrell nos pontos em 1974, mas a corrida de Patrick Depailler foi prejudicada por falhas mecânicas que o fizeram chegar apenas em 9º, três voltas atrasado. Jody Scheckter emplacou mais um ótimo resultado e com isso chegou a 12 pontos no campeonato, subindo ao quarto lugar do Mundial de Pilotos.

Em Anderstorp, palco do GP da Suécia, a adaptação dos Tyrrell 007 àquela pista foi espantosa. Patrick foi o único a virar tempos abaixo de 1’25” na qualificação e conquistou sua primeira pole position, batendo Jody Scheckter por 0″318. O domínio dos dois pilotos dos carros azuis foi tão grande que nos minutos finais do treino classificatório, eles ficaram batendo papo na mureta dos boxes, de macacões arriados, enquanto os outros se ‘matavam’ para superar seus tempos.

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A alegria de Scheckter pela primeira vitória em Anderstorp, no GP da Suécia

Na corrida, o domínio se repetiu: Scheckter liderou de ponta a ponta e Depailler, que saiu com a melhor volta, pegou a segunda posição quando o Lotus de Ronnie Peterson deixou o ídolo local na mão. Aos que achavam ser impossível a Tyrrell voltar a vencer e, principalmente, ganhar em dobradinha, o triunfo na etapa nórdica foi a resposta que os azuis precisavam. E Scheckter, com sua primeira vitória na F1, igualou-se a Lauda no terceiro lugar do campeonato, com 21 pontos.

Em Zandvoort, entretanto, nada seria capaz de deixar Jody e Patrick na linha de frente. As características da pista eram desfavoráveis ao Tyrrell 007 e as Ferrari 312 B3 deitaram e rolaram. Venceram em dobradinha, com Lauda e Regazzoni. Scheckter salvou dois pontinhos e Depailler um. Pelo menos o sul-africano não estava tão longe de Emerson Fittipaldi, que liderava o Mundial de Pilotos.

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Scheckter, aqui com Lauda, Fittipaldi e Regazzoni, brigou pelo título até o fim

No GP da França, na terra da Elf, patrocinadora principal da equipe, Scheckter conseguiu um razoável 4º lugar e Depailler foi só oitavo. Mas o sul-africano faria as pazes com a vitória em Brands Hatch, na disputa do GP da Inglaterra. É verdade que ele foi beneficiado por um furo lento de pneu na Ferrari do inabalável líder Niki Lauda. Jody era o piloto certo na hora certa e ao ganhar de novo, seguiu muito vivo na luta pelo título.

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Jody fez uma corrida fantástica na Alemanha, chegou em segundo e manteve acesa a esperança de ser campeão

O GP da Alemanha, em Nürburgring, aumentou a certeza da Tyrrell que a escolha da dupla Scheckter-Depailler tinha sido perfeita. Especialmente pela corrida espetacular do sul-africano, que chegou em 2º e passou, de uma só tacada, Emerson e Lauda no campeonato, pulando para 41 pontos – três a menos que Clay Regazzoni. Patrick acidentou-se na 5ª volta e não terminou.

Com os ótimos desempenhos de Jody, a Ford – por pressão de Jackie Stewart – que tinha muita influência nos bastidores – ofertou à Tyrrell uma versão experimental do motor Cosworth DFV que, segundo Emerson Fittipaldi, tinha 20 HP a mais que o de todos os outros com o mesmo propulsor. Nas retas longas e curvas velocíssimas de Zeltweg, na Áustria, isso seria um fator. Só que o motor era pavio curto: estourou após oito voltas. Depailler envolveu-se numa colisão com Jacky Ickx e desistiu mais uma vez.

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Depailler fechou sua primeira temporada completa na F1 com o 9º lugar no Mundial de Pilotos, com 14 pontos

De volta ao motor “normal”, Scheckter fez boa corrida na Itália e chegou em terceiro. Com 45 pontos, mantinha-se na vice-liderança e com chances de conquistar um título histórico, que seria a redenção da Tyrrell Racing Organisation. Contudo, o sul-africano enfrentou problemas de freios no GP do Canadá e bateu na última prova do ano, o GP dos EUA, em Watkins Glen. Depailler voltou aos pontos após o pódio em Anderstorp: foi 5º no Canadá e sexto em Glen.

No fim das contas, não foi uma temporada da qual Ken Tyrrell pudesse se queixar. Muito pelo contrário: seu faro continuava aguçado e o revelador de talentos ainda estava com tudo. Tanto que Scheckter fechou o campeonato num mais que honroso 3º lugar, Depailler foi um razoável nono, seus carros continuaram vencedores e a equipe terminou igualmente em terceiro no Mundial de Construtores.

O assunto do próximo post será a temporada de 1975. Não percam!

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