Equipes históricas – Tyrrell, parte XX

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O Tyrrell DG017 foi o último projeto de Brian Lisles, supervisionado por Maurice Philippe

RIO DE JANEIRO – Praticamente sem concorrência entre as equipes que optaram por motores de aspiração normal em 1987, a Tyrrell teria muito mais trabalho para a temporada seguinte. Afinal de contas, com a opção da Benetton por um novo propulsor V8 desenvolvido pela Ford, sem contar a Williams, que perdera os motores Honda Turbo optando pelo bloco Judd V8 com base no motor Honda da Fórmula 3000, a equipe de “Tio” Ken teria muito mais concorrência no pelotão intermediário, porque diversos times também optaram por motores Ford Cosworth e/ou Judd, provocando também a vinda de novos times atraídos pela mudança de regulamento, feito a Rial, a Scuderia Italia e a EuroBrun.

O modelo para 1988 era o Tyrrell DG017, uma evolução natural do projeto do ano anterior, novamente desenhado por Brian Lisles sob a supervisão e direção técnica de Maurice Philippe, no último ano de contrato da dupla, já que para 1989 fora anunciada a contratação de Harvey Postlethwaite para chefiar o departamento de projetos da tradicional equipe britânica.

Na decoração, a cor dominante do carro era o preto, com aplicações discretas de amarelo, fruto do acordo com a RJ Reynolds, então fabricante dos cigarros Camel. Com Philippe Streiff assumindo a vaga que seria de Roberto Pupo Moreno na AGS, Ken Tyrrell deu vez a mais um novato na Fórmula 1, para dividir o time com Jonathan Palmer: Julian Bailey, piloto inglês de 26 anos que terminara em 7º na disputadíssima temporada de 1987 da Fórmula 3000 Internacional, ganhando inclusive uma etapa em Brands Hatch.

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A estreia de Julian Bailey aconteceu em Imola, no GP de San Marino

Após a longa pré-temporada, os carros da Fórmula 1 iniciaram o campeonato em 3 de abril com o GP do Brasil em Jacarepaguá. Logo a Tyrrell percebeu que o ano seria duro: Bailey ficou a três décimos do 26º colocado e não se classificou. Palmer largou em 22º e estava em décimo quando a transmissão do DG017 quebrou a treze voltas do final. No GP de San Marino, Bailey enfim fez sua estreia – e nos treinos oficiais, até classificou-se à frente de Palmer, com o 21º tempo. Mas a corrida do novato acabou após 48 voltas com problemas de câmbio. Jonathan chegou em 14º lugar, duas voltas atrás do vencedor Ayrton Senna.

Tyrrell 017/Ford Cosworth DFZ
Os melhores desempenhos do Tyrrell DG017 – e de Jonathan Palmer – aconteceram na primeira metade do campeonato

Veio Mônaco e o desempenho da dupla foi de absoluto contraste: enquanto Palmer brilhava com o 10º posto no grid (quarto melhor piloto entre os que dispunham de motores aspirados, atrás de Nigel Mansell, Alessandro Nannini e Riccardo Patrese), Julian Bailey experimentou o dissabor de mais uma desclassificação, com o último tempo entre os 30 pilotos – mas a três décimos do 26º colocado, o sueco Stefan Johansson com a Ligier. A exemplo do ano anterior, Palmer fez uma excelente corrida, entrando na zona de pontuação na 52ª volta. Com a batida de Ayrton Senna na curva Portier, antes do túnel do Hotel de Monte-Carlo, o britânico ascendeu ao 5º lugar, somando os primeiros pontos no campeonato.

No México, contudo, a Tyrrell passou por um vexame que jamais experimentara. Apesar da boa performance em Mônaco, o DG017 teve um péssimo desempenho no asfalto ondulado do circuito Hermanos Rodriguez e, para piorar, faltou velocidade de ponta aos dois carros na longa reta da pista. O resultado foi uma dupla – e inédita – desclassificação dos seus dois pilotos. Pela primeira vez desde o GP do Canadá de 1970, não havia ao menos um carro da Tyrrell a largar numa prova de Fórmula 1.

Provando que a categoria era imprevisível para os times médios e/ou pequenos, Bailey e Palmer conseguiram a classificação sem muitos sustos para o GP do Canadá, o quinto do campeonato. Contudo, a corrida de Bailey não passou da primeira volta, graças a uma batida. Palmer teve uma atuação bem razoável e acabou bafejado pela sorte: o combustível do Rial de Andrea de Cesaris acabou na penúltima volta e o motor da Lola-Larrousse de Philippe Aliiot explodiu. Os dois vinham exatamente à frente do britânico, que chegou em sexto e marcou seu terceiro ponto no ano.

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Nas ruas de Detroit, Palmer pontuou pela terceira vez em 1988, com um 5º lugar

O GP dos EUA, na difícil pista de Detroit, seria outra ótima chance para a Tyrrell chegar nos pontos. Bastava evitar problemas que a oportunidade poderia surgir sem sustos. Palmer aproveitou bem a ocasião e, mesmo largando de 17º, somou mais um 5º lugar ao seu currículo, recuperando de uma rodada sofrida na 32ª volta. Bailey quase terminou sua primeira corrida no ano, mas estava desidratado e bateu na 60ª volta quando estava em oitavo. Apareceu em nono no resultado final, mas não recebeu a quadriculada.

Em Paul Ricard, no GP da França, faltou novamente velocidade aos DG017 e a duras penas Palmer conseguiu uma vaga no grid, como o 24º colocado, largando uma posição à frente com o forfait do Zakspeed de Pier Carlo Ghinzani. Para nenhuma surpresa, Bailey ficou fora pela terceira vez no ano. A corrida foi daquelas para apagar da memória: Palmer estava em 18º na altura da metade das 80 voltas quando o motor quebrou. Fim da linha.

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Debaixo d’água: atrás do March de Maurício Gugelmin, Bailey terminou o GP da Inglaterra em 16º lugar

No GP da Inglaterra, em Silverstone, os dois conseguiram qualificar-se razoavelmente, mas os problemas começaram mais cedo que o imaginado. Chovia na hora da largada e Palmer, com evidentes dificuldades, baixou de 17º para último, abandonando cedo com uma falha de transmissão. Julian Bailey teve mérito de resistir até o fim em meio ao aguaceiro e completou seu primeiro GP, em 16º lugar. Em Hockenheim, palco do GP da Alemanha, só Palmer largou. Choveu de novo e o piloto do carro #3 até que fez uma boa apresentação, chegando em décimo-primeiro.

A corrida seguinte foi no travado circuito de Hungaroring e foi outra daquelas para esquecer: 21º no grid, Jonathan Palmer completou só três voltas e desistiu com problemas de motor. Bailey, nem isso, já que amargou a segunda desclassificação consecutiva e a quinta em 10 corridas. A sexta (terceira seguida) viria na Bélgica, em Spa-Francorchamps, onde Palmer alinhou de novo em 21º para abandonar no finalzinho com problemas de acelerador – ainda assim, terminou em 12º lugar, ascendendo a décimo com a desclassificação das duas Benetton por problemas com o combustível dos carros de Thierry Boutsen e Alessandro Nannini.

Em Monza, surpresa: Bailey classificou-se – em último – batendo Palmer por 0″115. Foi a melhor (ou menos pior, dependendo da interpretação) atuação do britânico na Fórmula 1, terminando o GP da Itália em 12º lugar.

No GP de Portugal, a volta da rotina: só Palmer competiu, largando em 22º para abandonar após 53 voltas com problemas de superaquecimento em sua Tyrrell. Em Jerez de la Frontera, na Espanha, foi ainda pior: apenas quatro voltas antes de um furo no radiador do carro de Palmer, novamente o único piloto da equipe na pista.

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Os cinco pontos somados por Palmer deram à equipe o 8º posto no Mundial de Construtores em 1988

Após o fim da “temporada europeia”, a Fórmula 1 foi para Japão e Austrália para as corridas finais de 1988. Em Suzuka, os dois carros avançaram para a disputa com um bom 16º posto de Palmer e Bailey largando de último. Foi a primeira – e última – corrida que os dois DG017 chegaram, com os dois cruzando em 12º e 14º, respectivamente. Em Adelaide, só Palmer largou, enquanto Bailey – já demitido para a temporada de 1989 – contabilizou o décimo fracasso em 16 etapas. O ano terminou para a equipe com a quebra da transmissão do carro #3 na 16ª volta.

Com um piloto e meio dentro da escuderia, até que terminar em 8º no Mundial de Construtores com cinco pontos somados foi lucro para a Tyrrell. A contratação de Postlethwaite e o retorno de um velho conhecido, Michele Alboreto, poderia trazer melhores resultados para 1989? É o que veremos no 21º capítulo da história da equipe britânica muito em breve.

Comentários

  • Rodrigo, concordo que o desempenho de Julian Bailey em 1988 tenha sido abaixo da crítica, mas o carro era ruim demais nesta temporada, e os pontos obtidos por Palmer na temporada foram mais uma questão de experiência e méritos dele do que por ineficiência de Bailey.
    Anos depois, em 1991, Bailey foi para a Lotus, que estava em um momento sofrível com os motores Judd, tendo como companheiro de equipe o então jovem Mika Hakkinen. Apesar de não se classificar em três das quatro corridas em que participou no ano, em San Marino, Bailey conseguiu classificação. Se não me engano, ambos partiram da última fila, e chegaram em 5. e 6., sendo que Bailey andou a frente de Hakkinen por boa parte da corrida.
    O que quero dizer é que não havia uma diferença tão grande de performance entre um piloto e outro, ainda mais quando o comparamos com Mika Hakkinen. Os carros é que eram muito ruins, tanto que Johnny Herbert voltou à equipe Lotus no fim do ano e também não fez nada de excepcional com este carro.
    Não sei dizer se a performance de Ricardo Rosset na própria Tyrrell em 1998 contra Tora Takagi (que será abordada no último capítulo desta série) foi melhor ou pior que a de Bailey.
    Na minha opinião, talvez o maior braço-duro que já vi correr, sem nenhuma dúvida, foi Yuji Ide, da Super Aguri, em 2006. Este não tinha condições de ser piloto de F1.
    Voto dado. Grande abraço!

  • Rodrigo,

    Muito legal essa série sobre a Tyrrell .. simplesmente demais sua dedicação em escrever sobre essa equipe revolucionária como foi a Tyrrell … e mais para o fim dos anos 90 eles inventaram uns trambolhos de colocar na lateral do carro … nunca dava muito certo .. acho que era com o Mika Salo no volante …
    Parabéns !!!