Equipes históricas, Tyrrell: parte XXIV

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Andrea De Cesaris foi o responsável pelos melhores momentos da Tyrrell em 1992

RIO DE JANEIRO – Como diria o poeta, quando o ano de 1992 começou, Ken Tyrrell estava “sem lenço e sem documento”. Sua equipe tinha perdido os motores Honda, seus pilotos titulares do ano anterior e – pior – os patrocinadores foram embora. Para piorar, os V10 do construtor japonês foram rebatizados como Mugen e os orientais fizeram “Tio” Ken saber que poderia continuar com eles, mediante um pagamento de US$ 8 milhões pelo leasing dos propulsores. Como a equipe não nadava em dinheiro… buscou-se opções no mercado.

Com o apoio maciço da Elf, que surgiu como a tábua de salvação para os prementes problemas financeiros do time, Ken Tyrrell fechou um acordo com a Ilmor, dos engenheiros Mario Ilien e Paul Morgan, que estreara na Fórmula 1 em 1991 com a Leyton House após conquistarem prestígio na Fórmula Indy. O motor de arquitetura V10 era a solução para os problemas da equipe, além de ter 30 kg a menos que as unidades japonesas.

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Olivier Grouillard foi o outro piloto da equipe naquela temporada; o francês só deu prejuízo para o “Tio” Ken

Com o pacote técnico quase pronto e a contratação do engenheiro Mike Coughlan para trabalhar sob a supervisão de George Ryton, alçado ao posto de diretor técnico, faltava definir os pilotos. O apoio da Marlboro trouxe o eterno Andrea De Cesaris, então com 32 anos de idade, uma aposta arriscada demais pela fama que o italiano carregava, de emérito destruidor de carros. A vaga de segundo piloto foi decidida em cima da hora e entregue a Olivier Grouillard, francês de 33 anos que fizera campanhas pífias a bordo de Ligier, Osella, Fondmetal e AGS.

O chassi foi rebatizado de 020B, por conta das alterações propostas por Ryton e Coughlan. No campo das suspensões, houve mudanças por conta da saída dos pneus Pirelli, substituídos pelos Goodyear de composição única. Os radiadores foram desenhados para refrigerar melhor o motor e toda a seção traseira foi substituída. O carro tinha peso mínimo de 505 kg de acordo com as especificações da época.

A temporada começou em 1º de março com a volta do GP da África do Sul, na remodelada – e travada – pista de Kyalami. De Cesaris e Grouillard conseguiram resultados sólidos no treino classificatório, largando na primeira metade do pelotão. Mas ambos abandonaram por problemas mecânicos: o italiano por falha de motor e o francês com a embreagem quebrada.

Os primeiros pontos do ano vieram no México: De Cesaris terminou em 5º no circuito Hermanos Rodríguez

No GP do México, a Tyrrell arriscou largar com uma asa traseira sem nenhuma pressão aerodinâmica e o resultado foi que o 020B era um foguete na longa reta do circuito Hermanos Rodríguez. Andrea De Cesaris fez uma corrida excelente: marcou a quinta volta mais rápida da disputa e ainda chegou em 5º lugar, após sair em décimo-primeiro. Grouillard desistiu na 12ª volta: motor quebrado.

A equipe chegou motivada a Interlagos, para a disputa do GP do Brasil. Mas a corrida do italiano, que marcara os primeiros pontos do time em 1992, acabou de forma prematura com pane elétrica, na 21ª volta. Grouillard chegou a marcar o oitavo melhor tempo da corrida e estava igualmente em 8º quando mais um motor quebrou em sua Tyrrell. Na chuvarada da Espanha, os dois foram vítimas de aquaplaning durante a corrida em Barcelona e acabaram abandonando.

Na corrida seguinte, o GP de San Marino, os dois pilotos quase terminaram juntos pela primeira vez no ano, mas problemas de pressão de combustível tiraram Andrea da disputa pertinho do fim, quando o italiano estava em oitavo. Grouillard, após quatro desistências consecutivas, completou a corrida com a oitava posição. Em Mônaco, não deu para nenhum dos dois pilotos. Com problemas de transmissão e câmbio, o francês e o italiano desistiram com menos de 10 voltas completadas.

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Garagem da equipe britânica em Montreal no GP do Canadá. Era outra Fórmula 1…

Em Montreal, De Cesaris voltou a fazer mais uma boa corrida. Livre de problemas, o experiente piloto foi rápido o bastante para levar seu carro de 14º ao quinto lugar, somando mais dois pontos no campeonato. Grouillard largou de último e chegou em décimo-segundo. Em casa, no circuito de Magny-Cours, o francês chegou em 11º e Andrea rodou, bem ao seu estilo, quando tentava tirar o máximo de seu carro.

Na Inglaterra, nova rodada tirou De Cesaris da disputa quando o italiano estava em penúltimo. Grouillard conseguiu a façanha de terminar três vezes seguidas, com mais um 11º lugar. Mas voltou a dar prejuízo ao velho Ken durante o GP da Alemanha, que terminou cedo para o piloto em razão de um superaquecimento. O motor do 020B de Andrea explodiu na 25ª volta, quando ele ocupava apenas a 16ª colocação.

O GP da Hungria não foi dos melhores para a equipe britânica. De Cesaris até levou o carro ao fim e chegou em 8º lugar, mas com desvantagem de duas voltas para o vencedor Ayrton Senna. Já Grouillard voltou a dar prejuízo, dor de cabeça e mais alguns fios brancos de cabelo ao “Tio” Ken, batendo com vários pilotos numa colisão múltipla na 13ª volta. Em Spa-Francorchamps, no GP da Bélgica, a mesma história: Andrea em 8º e Grouillard de fora, numa batida logo na segunda volta.

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De vigésimo-primeiro para sexto: e De Cesaris salvou um pontinho no GP da Itália, em Monza

Em Monza, mesmo com a posição bastante desfavorável no grid – 21º lugar – Andrea levou na manha o seu carro e salvou mais um pontinho, o quinto em todo o campeonato. Grouillard deu novo prejuízo, quebrando o motor de seu carro na altura da metade da disputa. No GP de Portugal, o italiano chegou na nona posição e o francês abandonou com problemas na caixa de marchas. Em Suzuka, De Cesaris não só fez o melhor grid do Tyrrell 020B no ano (9º lugar) como também a sua melhor corrida do ano, chegando num excelente 4º lugar. A história para Grouillard foi a de sempre: abandono, por mais um acidente.

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À frente de Erik Comas a bordo da Ligier: De Cesaris conquistou o 4º lugar no GP do Japão, como melhor resultado dele e da Tyrrell em 1992

A temporada se encerrou nas ruas de Adelaide, no GP da Austrália. Nos treinos, De Cesaris conquistou um ótimo 7º posto, mas sua corrida acabou com menos de 30 voltas, quando já estava em sexto, graças a problemas de pressão de gasolina. Grouillard, que já estava demitido para a temporada 1993, terminou sua passagem na Tyrrell com “fecho de lata”: bateu com Michele Alboreto e Pier Luigi Martini, abandonando antes mesmo de completar a primeira volta.

No fim de tudo, até que o ano não foi ruim. Muito pelo contrário: com oito pontos somados, a Tyrrell terminou o Mundial de Construtores na mesma sexta posição de 1991 e, para completar, ainda fechou um contrato de fornecimento gratuito de motores com a Yamaha para o ano seguinte. Nada poderia ser melhor… ou pior. Mas isso só saberemos no 25º post da série, sobre a temporada de 1993.

Comentários

  • Rodrigo, parabéns pelo trabalho na série Equipes Históricas, estou acompanhando todas é muito bom aprender, no meu caso, sobre as equipes que não vi correr e relembrar de outras.

    Duas perguntas, você está seguindo alguma ordem pra postar as histórias? Vai falar sobre todas as equipes?

    Abraço e parabéns mais uma vez.

  • Sensacional ter dois capítulos na mesma semana. Essa é a minha seção favorita no blog, mas entendo e imagino o trabalho que deve dar para montar esses posts. Me impressiona a riqueza de detalhes dos posts, você descreve o desempenho da equipe em todas as corridas de cada temporada. Como faz para levantar tantos detalhes corrida a corrida?

  • Impressionante perceber como a Tyrrell conseguia ter fôlego para sobreviver na F1 mesmo passando tantas dificuldades. Eles deviam ter muito bons valores no time mesmo com a grana curta.