Grandes fracassos de Le Mans – parte II
RIO DE JANEIRO – Na sequência do primeiro post sobre alguns dos grandes fracassos históricos nas 24h de Le Mans, vamos à segunda parte, com os carros que não deram certo nos anos 80 e 90, chegando aos dias de hoje.
A trapizonga que abre o post é o Ardex S80, protótipo apresentado pela equipe de Max Sardou na corrida de 1981. Com ninguém menos que Vic Elford como diretor de equipe, este protótipo tinha motor BMW M88 3,5 litros com 6 cilindros em linha, montado na seção dianteira. Notem as saídas de escapamento e a posição de pilotagem. Michel Lateste e Patrick Perrier foram os pilotos escalados (consta que o ator Jean-Louis Trintignant também) e o Ardex não conseguiu se qualificar, ficando com o tempo de 4’05″02, o 55º mais rápido.
No ano seguinte, ninguém menos que o campeão de Fórmula 1 e das 500 Milhas de Indianápolis Mario Andretti apareceu para disputar a prova com o filho Michael, então com apenas 19 anos de idade. A dupla estadunidense foi inscrita num Mirage M12 construído pela Tiga com motor Ford Cosworth DFL V8 4 litros e nos treinos o desempenho do carro foi até bom: Mario e Michael alcançaram o 9º tempo do grid, com 3’37″09. Porém, os comissários do ACO jogaram fora a corrida da família da Pensilvânia. Uma irregularidade no sistema de refrigeração simplesmente desclassificou os Andretti e impediu a participação do carro. Eles voltariam à pista no ano seguinte com um Porsche 956, correndo ao lado de Philippe Alliot: terminaram em 3º lugar, numa vingança silenciosa contra a eliminação sumária de 1982.
O francês Bruno Sotty, que participou algumas vezes da corrida de Sarthe, inscreveu o carro da foto acima na prova de 1985. O protótipo Lotec C302, com chassi alemão TOJ, tinha um antigo motor Ford Cosworth DFV V8 de Fórmula 1 e foi um retumbante fracasso naquela edição. Guiado por Martin Wagenstetter e Kurt Hild nos treinos classificatórios, o bólido #106 nunca foi veloz o suficiente para se classificar: com 5’10″560, ficaram logicamente de fora, na 54ª posição.
O ano de 1990 registrou dois retumbantes fracassos da história de Sarthe. O primeiro desastre foi um protótipo chamado Eagle 700, alinhado por um certo Paul Canary, dos EUA. Com chassi Lola, este carro tinha um inacreditável motor da Schubeck Engine Co. com 10 litros (!) de capacidade cúbica, montado numa bancada de oito cilindros em V. O próprio Paul Canary aventurou-se na pilotagem ao lado do compatriota Dennis Kazmerowski. Nos treinos, ficaram com o 52º tempo. Óbvio, não se classificaram.
Mas em matéria de projeto malfadado, o Norma 6 da ASA Armagnac Bigorre ganha de sobra do Eagle 10 litros. O carro da equipe francesa tinha um motor de 12 cilindros em W, projeto de Guy Nègre que chegou a ser oferecido para a Fórmula 1. A AGS efetivamente montou a unidade num de seus chassis, mas ao perceber o tamanho da encrenca, não embarcou nesse engodo. O carro #61, inscrito para a trinca Norbert Santos/Noël Del Bello/Daniel Boccard nem chegou a ser visto na pista. Pareceu mais uma armação da equipe de Bigorre para conseguir o dinheiro dos patrocinadores (os supermercados But e a fábrica de elevadores ATS).
Este Grã-Turismo da foto é o MIG-Tako M100 que tentou a classificação para as 24 Horas em 1993. Graças à iniciativa de Aleksandr Mirianachvizi, da recém-independente república da Geórgia, este carro que mais parecia um Lamborghini foi inscrito para a prova com um motor Motori Moderni V12 aspirado, provavelmente a última tentativa de Carlo Chiti para a Fórmula 1 – sem qualquer sucesso, o propulsor foi para Le Mans. O MIG-Tako M100 foi muito lento: com o tempo de 5’59″150 e os pilotos Pierre Honegger/Gianpiero Consonni/Philippe Renault, o carro ficou em 59º nos treinos e logicamente não pôde largar.
Outra experiência frustrante foi a deste WR LM94 com motor Peugeot 2 litros turbo batizado com o nome do construtor sul-coreano Ssangyong. O carro #14 guiado por Bertrand Gachot ficou com o 31º tempo no treino de pré-qualificação para a edição da prova de 1996 e o protótipo, inscrito na divisão LMP2, foi impedido pelo ACO de competir. Gachot, que tentava reerguer sua carreira após inúmeros fracassos no automobilismo, tendo como ponto culminante uma prisão por agressão a um taxista com spray de pimenta no início dos anos 90, resolveu dar um ponto final à sua trajetória no esporte.
Este carro com aparência de Riley & Scott é o Matrix MXP1 com motor Nissan que apareceu para tentar a sorte nas 24 Horas de Le Mans em 1997. Inscrito com o numeral #16, o carro contou com gente experiente a bordo, feito Bernard De Dryver e Robin Donovan, além de Tim Richardson. Mas sem um desempenho aceitável na pré-classificação, ficou com a 47ª posição e foi considerado inapto pelo ACO para participar dos treinos oficiais.
Em 2000, a Chrysler, após várias vitórias na divisão LMGTS, a principal dentre os modelos Grã-Turismo, patrocinou um ataque ambicioso à classe LMP900 de protótipos, usando dois chassis Reynard 2KQ nos quais foram montados os motores Chrysler Mopar V8 6 litros. A escolha se justificava porque a marca de Adrian Reynard estava com tudo noutras categorias, especialmente na Fórmula Indy. Mas o carro mostrou desempenho pífio nos treinos e o #5 inscrito para Yannick Dalmas/Nicolas Minassian/Jean-Philippe Belloc só completou uma volta, abandonando com queda de pressão de óleo. O #6 de Didier Theys/Didier Andre/Jeffrey Van Hooydonk ainda conseguiu chegar ao fim em 20º lugar, só que 76 voltas atrás…
Oito anos depois, a Racing Box apareceu na lista de entradas com um protótipo italiano Lucchini LMP2-08 com motor Judd XV V8 3,4 litros. O carro #30 que seria guiado por Ferdinando Geri/Andrea Ceccato/Filippo Francioni participou do Journée Test, fez o pífio tempo de 4’24″058 e ainda por cima acabou excluído da disputa por um lugar no grid por falhar a inspeção técnica, abrindo espaço para a participação de um segundo protótipo Epsilon Euskadi ee01.
E o último – e histórico – fracasso que presenciamos em Sarthe (até agora) foi patrocinado com pompa e circunstância por ninguém menos que a Aston Martin Racing. Aproveitando a mudança de regulamento técnico, o construtor britânico apareceu para o ano de 2011 com o estranho protótipo AMR-One, dotado de motor 2 litros turbo e seis cilindros em linha.
Após a péssima estreia na abertura do Le Mans Series em Paul Ricard, a Prodrive arriscou todas as suas fichas nas 24 Horas com dois carros: o #007 para Darren Turner/Stefan Mücke/Christian Klien e o #009 para Adrián Fernández/Harold Primat/Andy Meyrick foram para os treinos e fizeram, disparadamente, os piores tempos entre os LMP1 – 23 segundos mais lentos que a pole position. Os crônicos problemas de motor se manifestaram na corrida: o #009 completou apenas duas voltas e o #007, quatro. O destino do carro foi o museu, exceto um dos chassis – que serviu de base para o malfadado Pescarolo 03, que só correu as 24 Horas de Le Mans de 2012 e nunca mais foi visto nas pistas.
Um desses chassis do AMR-One tbm não serviu de base para o Deltawing?
Também! Muito bem lembrado, Geraldo!
Demais essa matéria, Rodrigo. Parabéns. Não tenho certeza mas acho que teve um Peugeot que competiu em LeMans, lá por 1988, e que era um monstro na enorme reta Mulsanne mas provavelmente era deficiente no restante do circuito, ou quebrava fácil, sei lá. Esse aqui: http://www.ultimatecarpage.com/cg/5221/WM-P88-Peugeot.html
Esse é o WR Secateva que bateu o recorde de velocidade com 405 km/h.
Esqueceu do Mercedes-Benz CLR, uma fracasso total. Culparam as chicanes, pediram para os pilotos não seguirem carros de perto, adicionaram dive planes. E de nada adiantou. Três decolagens, uma na qualificação, uma no warm-up e uma na corrida. Sendo que duas com Mark Webber. Depois desse vexame, eles chamaram o carro remanescente para garagem e nunca voltaram a Sarthe.
Tem toda razão, meu caro Felipe. Mas o Mercedes CLR será lembrado num post à parte. Abraços!