Equipes históricas – Tyrrell, parte XXVIII

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O Tyrrell 024 deixou boa impressão no início do campeonato, mas ficou só nisso…

RIO DE JANEIRO – A Tyrrell deu sequência à parceria com os japoneses da Yamaha para a temporada de 1996 do Mundial de F1 com um novo motor: o OX11A V10 a 72º com 3 litros de capacidade cúbica substituiria o propulsor usado no ano anterior e que não trouxera os resultados desejados, afora a incapacidade do chassi 023 com a suspensão “Hydrolink” em conseguir um desempenho competitivo.

Outra novidade era o novo carro, o 024 projetado por Mike Gascoyne sob a supervisão de Harvey Postlethwaite e que resgatou uma característica que os três modelos anteriores não tinham – o bico levantado em relação ao aerofólio dianteiro, uma ideia original do próprio Postlethwaite reexecutada pelo aerodinamicista francês Jean-Claude Migeot. Os pilotos eram os mesmos: Mika Salo, que deixara ótima impressão em sua primeira temporada completa na Fórmula 1 e o japonês Ukyo Katayama, em seu último ano de contrato.

Para aquela temporada uma resolução da FIA deixou as equipes do meio para o fim do pelotão em polvorosa: a decisão de adotar a regra dos 107% da pole naturalmente deixou os times com menores recursos – e a Tyrrell era uma dessas escuderias – de sobreaviso. Mas havia ainda Forti Corse, Minardi e Footwoork-Arrows em situação relativamente pior, não só na parte financeira como também no aspecto técnico.

Na abertura do campeonato, realizada no mesmo país em que se encerrara o campeonato anterior, a Austrália, as coisas até correram bem: Mika Salo fez uma bela corrida e após uma disputa ferrenha com a Ligier de Olivier Panis e a Sauber de Heinz-Harald Frentzen, levou o primeiro pontinho do ano com o 6º lugar. Katayama largou mais atrás que o companheiro de equipe e terminou somente na décima posição.

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Katayama nada fez a bordo do 024 durante todo o campeonato, seu último pela Tyrrell

Os dois pilotos voltariam a terminar juntos a 2ª etapa do ano: num GP do Brasil marcado pela chuva, Salo andou novamente muito forte numa pista em que o nórdico já impressionara em sua estreia pelo time britânico. Beneficiado pela rodada da Jordan de Rubens Barrichello, que vinha em 4º lugar tentando roubar o lugar de Michael Schumacher no pódio, o finlandês chegou em quinto e somou pontos pela segunda corrida seguida no ano (terceira da carreira). Katayama largou em 16º para chegar em nono após andar embolado com as Forti Corse e com a Minardi de Pedro Lamy, numa performance medíocre do piloto japonês.

Nos treinos do GP da Argentina, Katayama conseguiu uma rara performance superior a de Salo no travado circuito de Buenos Aires: largou em 13º, chegou a ocupar o décimo posto, mas abandonou devido a um problema de transmissão. Salo caiu para último no correr da disputa e por lá ficou até desistir na 36ª volta em razão de um defeito no acelerador de seu carro. Em Nürburgring, por ocasião do GP da Europa, os dois pilotos de “Tio” Ken passaram por um vexame raro na história da equipe – ambos foram desclassificados, por motivos diferentes, da corrida ganha por Jacques Villeneuve (no primeiro triunfo do canadense na F1). Salo completou a prova em 10º, mas seu carro estava abaixo do peso mínimo de 595 kg exigido por regulamento. Katayama foi o 12º e acabou punido por receber ajuda externa, o que não é permitido na categoria.

Em Imola, no GP de San Marino, Salo conseguiu o melhor grid da equipe no ano: foi o 8º mais rápido, largou espetacularmente passando para quarto e com os reabastecimentos dos adversários, ocupou inclusive o terceiro posto atrás da Williams de Damon Hill e da Benetton de Gerhard Berger. Foi traído pelo motor, que estourou na 23ª volta, estragando sua excelente corrida. Katayama largou de um apagado décimo-sexto lugar e desistiu no 45º giro em razão de problemas de transmissão.

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Salo foi brilhante em San Marino e vinha muito bem em Mônaco. Até encontrar um Irvine pelo caminho…

No traiçoeiro circuito urbano de Monte-Carlo, Salo foi de novo destaque com sua Tyrrell, numa das corridas mais imprevisíveis do ano, chegando a ocupar a 4ª posição perto do fim. Tinha chance de conquistar um resultado ainda melhor, mas não contava com uma das inúmeras cagadas do irlandês Eddie Irvine, que bateu na Virage Massenet e levou não só Salo como Mika Häkkinen com ele. Mesmo a cinco voltas do surpreendente vencedor Olivier Panis, o finlandês chegou em quinto e somou mais dois pontos no campeonato. Katayama mal completou as primeiras voltas e desistiu com problemas de acelerador.

A partir daí, o campeonato seria um verdadeiro suplício para a dupla da outrora pujante escuderia britânica, em razão dos evidentes problemas de falta de potência do motor Yamaha. A começar pelo chuvoso GP da Espanha, onde tudo deu errado, inclusive a ideia de trocar Salo de carro quando já não era mais possível – o que custou a desclassificação ao nórdico, a segunda em todo o campeonato. Katayama não completou nem 10 voltas em Barcelona. No Canadá, o japonês bateu com o brasileiro Ricardo Rosset logo no início e o motor do carro de Salo quebrou após 39 voltas. Em Magny-Cours, o finlandês chegou em 10º e Katayama quebrou antes da metade da contenda.

Incrivelmente, embora a performance em qualificação e corrida fosse de mediana para medíocre, a Tyrrell conseguia se sobressair nos treinos livres. Mas isso não era suficiente: o desempenho do 024 decaía a olhos vistos e Harvey Postlethwaite tentou lutar com as armas que tinha, dentro dos limites do regulamento. Em alguns treinos, Salo e Katayama foram vistos, principalmente nas pistas de maiores velocidades de ponta, com quatro pneus dianteiros montados nas rodas de seus carros – inclusive nas traseiras.

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Mesmo com experimentos realizados em treinos como o uso de quatro pneus dianteiros e a redução da área frontal do 024, para minimizar o déficit de potência do motor Yamaha V10, as performances da Tyrrell caíram bastante na segunda metade do campeonato de 1996

Não resultou, embora Salo quase conseguisse pontuar no GP da Inglaterra, em que terminou em sétimo e na Alemanha, quando foi nono. Katayama, cada vez mais na curva descendente da parábola, só colecionava um abandono atrás do outro. Incrivelmente, o japonês quase quebrou o jejum de pontos ao chegar em 7º no difícil circuito da Hungria e em oitavo na Bélgica, logo atrás de Salo.

Com o fim do ano se aproximando, a Tyrrell também teve a notícia – pouco surpreendente, aliás – que a Yamaha se retiraria da equipe ao fim daquele ano, seduzida por um mirabolante plano de Tom Walkinshaw, que comprara a Arrows e contrataria Damon Hill para ser seu piloto em 1997, levando consigo o número #1, já que o filho do bicampeão Graham levantaria o caneco ao fim daquele campeonato. O jeito foi levar as corridas finais com o que havia e nas três corridas finais, tudo o que os pilotos conseguiram foi um 10º posto com Katayama na Itália e um 11º com Salo em Portugal.

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Ano frustrante e fim da parceria: apenas cinco pontos somados e a Tyrrell chegou em penúltimo no Mundial de Construtores

O fim da parceria Tyrrell-Yamaha após quatro temporadas, no GP do Japão, foi absolutamente frustrante. Ambos os pilotos desistiram com quebra de motor em suas Tyrrell 024 e o campeonato, que começara tão bem, terminou de forma melancólica. A Tyrrell fez apenas cinco pontos – todos com Salo – e pelo menos cumpriu a obrigação de ser melhor que Footwork-Arrows e Minardi, uma vez que a Forti Corse sucumbiu durante a temporada. Mas a Sauber, 7ª colocada e com menos tempo de categoria, fez o dobro de pontos que a tradicional escuderia do velho Ken.

Outra vez, tempos bicudos? Pois é: o 29º e penúltimo capítulo dessa trajetória vai contar o que tivemos em 1997 na história da Tyrrell na Fórmula 1.

Comentários

  • Rodrigo,

    Demais essa série sobre a Tyrrell. Sensacional!
    Como essa “Saga” está perto de terminar, você ´pretende escrever sobre alguma outra equipe tradicional e que já não existe mais ? Ligier / Arrows / Minardi (Claro que todas essas sem o mesmo tamanho da Tyrrell).

    Abraços e parabéns!

    • Leia a última linha do post sobre o Guy Ligier e saberá qual é a próxima equipe da lista.

      A Minardi e a Arrows, por não ganharem corrida alguma, já tiveram suas histórias contadas. Procure aqui pela série “Saudosas Pequenas” e divirta-se.

      • Fala Rodrigo, tudo bem ?

        Estava aguardando para ler o post sobre o Guy Ligier com mais tempo, pois como o post é longo, eu gosto de ler com calma. Em todo caso, vou acompanhar a “Saga” sobre a Ligier com o mesmo entusiasmo da Tyrrell, porque cara, é sensacional. Sério!

        Não sabia que existia esses tópicos sobre essas equipes menores, vou procurar com certeza.

        Mas diga a verdade, aquela vitória do Vettel em Monza pela Toro Rosso, foi como se a vitória tivesse sido da Minardi. Todo mundo torceu para eles aquele dia. Foi ou não foi ? Rsrs.

        Sobre a Arrows … Hungria 1997 … aquele carro Azul e Branco maravilhoso indo de um lado para o outro apresentando problemas me fez soltar um xingamento na hora. Conta como vitória também né ? Acho que não.. rsrsrs .Tempos bacanas.

        Abraços.

  • Fala Rodrigo, tudo bem ?

    Ainda não dei uma lida no post sobre o Gui Ligier, pois como o texto é relativamente longo, gosto de ler com calma. Mas com certeza vou acompanhar a “Saga” da Ligier assim como estou acompanhando a da Tyrrell, porque é sensacional. Sério!

    Até hoje não consigo acreditar que o Vettel não ganhou Monza de Minardi .. rsrs.
    Assim como, não acredito que aquele carro maravilhoso (Branco e Azul) da Arrows 1997 não ganhou na Hungria no final da corrida. Poderia dar um crédito para essas 2 aí né ? Brincadeira.

    Abraços e obrigado pela resposta.

    PS : Tenho um amigo francês que trabalha na Renault na França e indiquei seu blog para ele dar uma olha e ele elogiou bastante o conhecimento técnico assim como o conteúdo do blog! Parabéns !