Equipes históricas – Tyrrell, parte XXIX

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Jos “The Boss” Verstappen fez companhia a Mika Salo na temporada de 1997 pela Tyrrell

RIO DE JANEIRO – A temporada de 1997 não seria das mais fáceis para a Tyrrell, numa Fórmula 1 em que o dinheiro falava cada vez mais alto. Com o fim da parceria entre a equipe de Ockham e a Yamaha, “Tio” Ken buscou a única alternativa viável para cumprir um papel ao menos digno: assinou com a Ford um fornecimento de motores ED V8 a 75º para equipar o novo carro, projeto de Mike Gascoyne com assessoria de Harvey Postlethwaite.

O novo 025, inspirado no modelo anterior, era mais elegante e com bico afilado. Mas era um monoposto convencional, sem muitas invencionices. Mika Salo renovou contrato para mais uma temporada e a Tyrrell recebeu o holandês Jos Verstappen, de carreira errática na categoria após passagens pela Benetton, Simtek e Arrows. A equipe tinha dois bons pilotos, rápidos e capazes. Mas faltava “tutu” para o desenvolvimento de um bólido cujo motor tinha pelo menos 60 HP a menos que os V10 que reinavam na categoria, a despeito dos patrocinadores conseguidos via Satoru Nakajima pelo diretor comercial do time, o ex-Lotus Rupert Manwaring.

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O Tyrrell 025 era convencional e elegante, mas ineficiente: não tinha motor de ponta e o Ford ED V8 era 60 HP pior que os propulsores V10 reinantes na época

A primeira prova não foi das mais auspiciosas, com os dois carros largando do meio para o fim do pelotão, o que era de se esperar em razão do déficit de potência do Ford ED4 V8 da equipe. Salo conseguiu um tempo melhor que Verstappen na qualificação e o holandês despediu-se do GP da Austrália, nas ruas de Melbourne, com uma excursão fora da pista na segunda volta. O finlandês andava em 12º quando abandonou por quebra de motor.

Sem a Lola, de participação vexatória na abertura do campeonato, o grid foi reduzido a 22 carros e, por conta de sua inferioridade técnica, a Tyrrell tinha como rival direta a Minardi, que usava motores Hart V8. No Brasil, os dois 025 foram inapelavelmente batidos pelos carros do time italiano e tanto Salo quanto Verstappen amargaram a última fila do grid. Os dois fizeram o que dava na corrida: 13º e 15º lugares foi o saldo da dupla.

No travado circuito de Buenos Aires, Verstappen deu o troco em Salo e conseguiu uma classificação melhor no grid, com o 16º tempo para o GP da Argentina. Mas a corrida de “Jos The Boss” foi encerrada de forma prematura por problemas mecânicos. Salo foi razoavelmente bem e chegou em oitavo, melhor resultado do time àquela altura do ano. Registre-se que, mesmo sem a chancela da Ford, a Tyrrell terminava as corridas, enquanto a recém-fundada Stewart, com um carro promissor e apoio de fábrica, pecava por falta de confiabilidade.

Em Imola, Salo foi de novo melhor que Verstappen em qualificação e os dois 025 se debateram numa pista veloz contra a falta de potência, duelando na cauda do pelotão com a Minardi. Ainda assim, Salo chegou em décimo e Verstappen em décimo-primeiro. Aí veio o GP de Mônaco, nas ruas de Monte-Carlo.

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A estratégia que deu certo: sem reabastecer, Salo brilhou no toró do GP de Mônaco e chegou em 5º lugar

Chovia a cântaros no dia da 5ª etapa do campeonato e aí Harvey Postlethwaite teve uma ideia simplesmente brilhante. Considerando a pouca capacidade do tanque de combustível dos F1 da época (estimada em 120 litros) e a autonomia do motor Ford ED4 V8, o engenheiro conversou com a equipe e principalmente com Mika Salo – que sempre andara bem no Principado – sobre a possibilidade de tentar fazer a corrida toda sem precisar parar para reabastecer.

E deu certo: mesmo com o bico dianteiro quebrado, o nórdico persistiu na disputa sem ter feito o pit stop. Na zona de pontuação desde a 11ª volta, Salo assumiu o quinto posto na trigésima-quinta, permanecendo por lá até a bandeira quadriculada, exibida quando a corrida atingiu o tempo limite de duas horas. Foram os primeiros pontos do time (e os últimos da história da equipe, também) em 1997.

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A polêmica asa “X-Wings”, montada dentro da altura limite do carro, foi uma cartada de Gascoyne e Postlethwaite para melhorar o downforce do 025 em circuitos de média e baixa velocidade

Nos treinos, Postlethwaite e Gascoyne também aprontaram mais uma: para melhorar a aderência do Tyrrell 025, os dois engenheiros conceberam aletas suplementares montadas nas derivas laterais do monoposto, dentro da altura máxima exigida pelo regulamento. As asas foram conhecidas como “X-Wings” e o insólito artefato seria usado no carro em pistas de média e baixa velocidade até o fim do campeonato.

O GP da Espanha foi um dos mais interessantes do campeonato, porque na guerra de pneus entre Bridgestone e Goodyear, o fornecedor japonês fez um composto muito veloz para o circuito da Catalunha. Como a Tyrrell usava a borracha da turma da Akron, não teve essa vantagem. Apesar disso, Salo fez um ótimo 14º tempo no grid – muito bom para o padrão do carro e cinco posições à frente de Verstappen. Mas um furo de pneu atrapalhou a corrida de Mika, fazendo-o desistir. O holandês foi mais feliz e chegou em 11º, à frente até da Ferrari de Eddie Irvine.

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Verstappen deixando os boxes após um pit-stop de rotina: a principal adversária da outrora poderosa Tyrrell foi a nanica Minardi. Sinal dos tempos…

No Canadá, o desempenho do carro voltou a ser positivo, com o 14º posto alcançado por Verstappen na qualificação. Mas os dois 025 ficaram pelo caminho, com problemas de motor e caixa de marchas. Na França, onde Salo e Verstappen voltaram a figurar no fim do pelotão, novamente ninguém terminou, devido a falhas de freios e da eletrônica. Em Silverstone, novo malogro, com os dois abandonando por quebra de motor. Naquela altura, a Tyrrell já dispunha da versão ED5 do Ford V8, insuficiente porém para abrandar a diferença de performance para os outros times da categoria.

Em Hockenheim, nada restou aos pilotos além da penúltima fila, à frente das duas Minardi. Pelo menos Verstappen pôs fim a uma sequência de três abandonos consecutivos com o 10º – e último – lugar no GP da Alemanha. Salo desistiu com a quebra da embreagem. Na Hungria, nem as características da pista e as asas “X-Wings” ajudaram alguma coisa. O finlandês foi o único a terminar pela equipe, em décimo-terceiro, logo atrás da Minardi de Tarso Marques. No GP da Bélgica, numa corrida que começou com pista molhada e depois secou, Verstappen chegou a ocupar um excelente 8º lugar no início. Mas se empolgou demais: rodou na 25ª volta e saiu da corrida. O holandês, inclusive, vinha à frente de Eddie Irvine e do brasileiro Pedro Paulo Diniz, que chegaria em sétimo. Salo foi até o fim e terminou em 11º.

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Sem somar pontos, Verstappen pelo menos terminou algumas provas: seu melhor resultado foi um 8º lugar

No GP da Itália, os dois 025 até que tiveram um desempenho decente nos treinos, com alguma velocidade. Mas não resistiram à exigência da corrida. O câmbio tirou Verstappen da disputa e Salo saiu por quebra de motor. Na volta da Áustria ao calendário após uma década ausente, o holandês chegou na 12ª posição e Salo abandonou de novo, desta vez com problemas de transmissão. No GP de Luxemburgo, disputado em Nürburgring, na Alemanha, o finlandês foi 10º e Verstappen saiu da corrida. Em Suzuka, só Verstappen chegou – em 13º – enquanto Salo quebrava de novo.

E na etapa derradeira do campeonato, o GP da Europa, na pista de Jerez de la Frontera, a Tyrrell repetiu nos treinos o resultado do GP do Brasil e do Japão: última fila para seus dois carros. Ainda assim, Salo conseguiu um mais do que razoável 12º lugar e Jos Verstappen acabou a disputa em décimo-sexto entre 17 pilotos que terminaram a corrida que consagrou Jacques Villeneuve como o grande campeão daquele ano.

Para 1998, muita coisa mudaria: motor, carro, pilotos e inclusive a própria história da equipe, que se defrontaria com uma oferta irrecusável e determinaria o fim de uma longa trajetória de Ken Tyrrell como dono e chefe de equipe dentro do automobilismo mundial.

O próximo capítulo será o 30º e último da série sobre a escuderia britânica.

Comentários

  • Fala Rodrigo, blz ?

    Pena que já está terminando a saga da Tyrrell. Esse 025 com as “X Wings” eram maravilhosos. Aliás, essa fase da F1 até 1997, foram os carros mais bonitos já construídos, juntamente com o da Indy da mesma época.
    Uma curiosidade : Existe algum lugar onde esses carros da Tyrrell estão expostos, algo como um museu ? E que fim levou a estrutura da equipe, você tem essa informação ?

    Parabéns pelo blog !

    • Não sei se vc se refere a este modelo em específico ou aos carros da Tyrrell em geral, mas no Donnington Collection, museu de carros de corrida que fica em Donnington Park (a pouco mais de 1h de Londres), tem diversos modelos da Tyrrell expostos (003, 005, P34), bem como diversos outros modelos lendários. Aquele lugar é praticamente uma meca para o fã de automobilismo.

      • Não apenas a esse modelo. Me refiro por exemplo aos P34, quantos foram produzidos ? Onde estão esses carros? Colecionadores ? Sempre tive essa curiosidade, depois que um modelo de F1 é “aposentado” para onde vão esses carros ? Leilões ?

        Em relação ao 025 especificamente, tem um vídeo em francês bem recente no youtube de um cara que possui um desses modelos, assim como o capacete do Mika Salo e o uniforme do time. O ronco desses motores eram demais, como podem perder isso ? O dono acelera esse monstro na reta … cara impressionante.

  • Olá Rodrigo e Renan, e todos os amantes da f1 dos anos 90, tudo bem?
    Sou um aficcionado pelo Tyrrel 025 e o 026, mas o “elegante” 025, como destaca a reportagem era maravilhoso, apesar de ser um carro fraco pra andar no “meio do bolo”, mesmo em 1997.
    Procuro esse modelo de f1 feito em metal, no tamanho 1:18 e jamais encontrei, mas a oferta desses modelos escala 1:43 é farta em sites de compra.
    Nem parece que ano que vem serão 20 anos desse modelo, me lembro que em 1998 o Banco Safra patrocinou Ricardo Rosset no time, último da existência da landária Tyrrel na F1.
    Parabéns pela reportagem, raríssima falando do lindo 025, tendo até hoje um design e aerodinâmicas únicos, que proporcionaram fotos maravilhosas, mesmo Mika Salo e Jos Verstappen passarem longe serem grandes pilotos.
    Abraços
    Daniel de Freitas