O baile da saudade

RIO DE JANEIRO – A melhor coisa que o Rock in Rio teve em sua primeira semana de edição comemorativa de 30 anos foi o domingo. Provando que um festival – qualquer um – se sustenta com atrações de peso, com músicas (boas, de preferência), com presença de palco, com boas bandas e uma estrada pra ninguém botar defeito.

Ninguém há de questionar Os Paralamas do Sucesso e tampouco o Seal, embora eu saiba que o som do britânico neto de brasileiros pode não agradar a todos. E muito menos duvido que alguém tenha algum senão a fazer sobre o que fizeram Elton John e Rod Stewart no Rio de Janeiro.

Dois sujeitos com muito em comum além da música e de uma carreira longeva e bem-sucedida. São dois alucinados por futebol. Elton foi presidente e dono do Watford, que voltou após uma longa ausência à Barclays Premier League, talvez o melhor campeonato europeu de futebol hoje. Rod é torcedor de carteirinha do Celtic de Glasgow – e foi visto às lágrimas quando o alviverde escocês emplacou um triunfo histórico sobre o todo poderoso Barcelona.

E ainda conservam intacto o carisma que detém desde sempre. Elton é uma máquina de grandes sucessos, praticamente todos com o letrista Bernie Taupin – uma parceria que considero tão ou mais importante para a história da música do que Lennon & McCartney. Rod também carrega consigo um cartel de grandes canções, desde o tempo de Faces (afora que fora crooner da banda de blues de Jeff Beck), flertando com o gênero da discothèque, passando pelo pop-rock e, com o tempo, ambos se adaptaram à realidade. Afinal, se o tempo por vezes é cruel, por outras é muito sábio.

Foi também na minha infância que fiquei sabendo quem eram esses dois. Elton John foi o primeiro artista que ouvi na vida, foi dele o primeiro bolachão que ganhei – uma compilação com muitos de seus sucessos tocados ontem no RiR e foi lamentável que coisas como “Daniel”, “Crocodile Rock” e “Honky Cat” tenham ficado de fora. Mas foi bom: o “Capitan Fantastic” nos brindou com um show impecável, que lavou a alma depois do vexame de quatro anos atrás, quando ele fora enxotado pelos alucinados fãs de Rihanna, que fecharia a primeira noite daquele festival.

Roberto Medina prometeu ‘nunca mais’ convidar Elton John em nenhuma hipótese. Voltou atrás e, sem ressentimentos, o britânico lavou a alma e acabou com o baile. O dono da Artplan deve ter se arrependido do que disse antes…

Rod Stewart eu conheci um pouco depois, por causa de “Sailing”, baladinha matadora e maravilhosa que abria uma compilação da finada K-Tel, chamada Music Power, que tinha entre outras coisas o tema da S.W.A.T e alguns artistas do movimento “Made In Brazil”, como Julian e até o próprio Elton John esmerilhando o clássico do The Who “Pinball Wizard”, da ópera-rock Tommy.

E os dois estão aí, um com 68 anos e o outro com 70. Somando os dois, mais de um século e meio de vida, de energia, de boa música e, melhor ainda, de competência.

O clip da semana não é um, são dois: Elton John com “Bennie & The Jets” e Rod Stewart com “I don’t want to talk about it”. É o baile da saudade, pra mostrar que panela velha é que faz música boa.

https://www.youtube.com/watch?v=ZxeBccvWDRQ

Comentários

  • Concordo, Mattar. Um festival se sustenta com artistas de peso que correspondam no palco e que façam valer cada centavo investido no ingresso, por vezes caríssimo perante nossa situação financeira.
    Por essas e outras que sou critico ferrenho à versão brasileira do festival Lollapalooza, feito aqui em São Paulo desde 2012, cujos organizadores visam “fazer frente” ao Rock In Rio (vê se pode…) com um aglomerado de bandas desconhecidas da maioria do público, e que muitas vezes não fazem nada de excepcional no palco, uma ou outra de alguma relevância.
    Assisti pela tv o show do Rod Stewart e me lembrou aquele do Bruce Springsteen ano retrasado…impressionou muita gente mais nova, que pouco o conhecia, porque apavorou no palco…fora as moças lindíssimas da banda. Independente de ser ou não o meu estilo favorito, caras como Elton John, Rod Stewart, entre outros veteranos tem meu total respeito

  • Dois grandes.

    Mas nesse domingo, enquanto o Elton John tenha me surpreendido, com uma performance de voz como não via há muito tempo (a última vez que tinha se apresentado no RiR foi péssima), o Rod Stewart tava mal, tendo que se apoiar o tempo todo no backing vocal. Espero que ainda possa vir a fazer shows como os antológicos do Royal Albert Hall.

  • Rod Stewart é um dos meus vocalistas preferidos, junto com o Paul Rodgers.

    Mas Mattar, peço licença pra fazer uma pequena correção: O Faces não tinha o Jeff Beck na formação. O Rod Stewart começou sim com o Beck, mas na primeira (e melhor, na minha opinião) formação do Jeff Beck Group (Beck, Rod, um Ronnie Wood espetacular no baixo (!!!) e um sujeito chamado Mick Waller na bateria, também impressionante):

    https://www.youtube.com/watch?v=dmhiFLspjDE

    o primeiro disco:
    https://www.youtube.com/watch?v=q_0r64yxygw

    achei um show de 68 com áudio mediano, mas excelente como todos os shows piratas que escutei:
    https://www.youtube.com/watch?v=z0AIRganLXE

    o Jeff Beck dessa época é dos meus guitarristas preferidos, mais que Page ou Clapton, (os três tocaram nos Yardbirds)

    em algum momento no final dos `60 essa primeira formação se dissolveu, (parece que Jeff Beck era um sujeito difícil de se trabalhar na época, acho que isso foi um pouco antes de Woodstock, sendo que eles iriam tocar no festival), e o pessoal da banda Small Faces (que tinha acabado de perder o vocalista, Steve Mariott, que acabara de formar o Hubble Pie como o Peter Frampton), convidou o Rod Stewart e o Ronnie Wood – aí sim como guitarrista – pra montar o Faces.

    Lembrando que o tipo de som dos Small Faces e do Jeff Beck Group foram forte inspiração pro Page montar parte do conceito do som do Led Zeppelin. O Page chegou a convidar o Mariott e mais um monte de gente muito boa antes de achar o Plant, Jones e o Bonham. Mas ninguém topava, porque ligavam o projeto do Page à um conceito de “new” Yardbirds. O pessoal achava que não iria funcionar isso de refazer uma banda a partir de um único componente (o Jimmy Page) que tinha sobrado…

    Mas voltando ao Rod Stewart, particularmente gosto mais dos discos solo que ele gravava paralelamente à banda do que o material dos Faces:

    https://www.youtube.com/watch?v=c8-KZWt-Oqc
    https://www.youtube.com/watch?v=c1szgbHU6ZA
    https://www.youtube.com/watch?v=iBpCFpJgbZk

    e depois de certo disco (o de 75, 76, não sei precisar) já não me interesso tanto pelo que o cara gravou.

    Já o Elton John eu nunca acompanhei.

    Mas é interessante ver que essa turma inglesa dessa geração toda começou tocando blues. Inclusive o Elton John, vi uma entrevista muito legal do Elvis Costello com ele contando sobre os primeiros anos, achei uns pedaços:

    https://www.youtube.com/watch?v=p27lD2a7hJ8
    http://www.rollingstone.com/music/videos/spectacle-elvis-costello-with-elton-john-part-1-20081114

    Foi mal o comentário imenso, é que a música pop inglesa dessa época, segunda metade dos anos 60, tem histórias interessantísimas. E as biografias dessa turma toda contam várias histórias em comum, é muito legal, todo mundo em algum momento tocou ou no mínimo circulava com todo mundo…

    • Grato por dividir seus conhecimentos conosco.
      Ambos tem belas músicas em seus currículos Que vivam longos anos sempre nos agraciando com sua arte.