Discos eternos – Os 3 Malandros in Concert (1995)

capa

RIO DE JANEIRO – Faz 25 anos que José Carreras, Luciano Pavarotti e Plácido Domingo se juntaram para um projeto pra lá de bem sucedido, que rendeu disco, especial de televisão e uma série de concertos com três das mais conhecidas vozes do erudito. Os Três Tenores estrondaram no mundo inteiro e até cantaram em época de Copa do Mundo. E por aqui, aproveitando o espírito galhofeiro e bem-humorado do brasileiro, tivemos Os 3 Malandros in Concert, cujo lançamento completou exatas duas décadas em 2015.

Registre-se que não foi um disco qualquer, pois reuniu a nata da malandragem carioca e do samba de breque e de morro, representada por Dicró (1946-2012), Moreira da Silva (1902-2000), o popular Kid Morengueira e Bezerra da Silva (1927-2005). Com produção de Esdras Pereira e arranjos e regência do maestro Jaime Alem, o mesmo que trabalha até hoje com a diva Maria Bethânia, o lançamento foi feito mesmo para sacanear os Três Tenores famosos e também as Óperas – desde a capa, com os três trajando elegantes smokings e posando na escadaria do Municipal – sem esquecer das marcas registradas: o chapéu panamá de Moreira e o bonezinho de Bezerra da Silva.

A produção caprichada não esconde o tom de galhofa dos três pagodeiros, abrindo com “O Recital”, cartão de visitas para um rosário de sacanagens destiladas nas faixas seguintes. “Os Três Pagodeiros do Rio” dá o recado na lata. ‘Não tem Pavarotti, nem José Carreras, nem Plácido Domingo… eu sou mais o Bezerra, Moreira da Silva e Dicró Rei do Bingo’. Já com 93 anos, Kid Morengueira deu claros sinais que o fôlego lhe faltava, mas a velha catiguria dos tempos de malandro-agulha na Lapa lá estava, apesar do seu fiapo de voz. Dicró e Bezerra do Galo (referência carinhosa do pagodeiro pernambucano ao Morro do Cantagalo, na Zona Sul do Rio de Janeiro, onde começou a carreira de sambista nos anos 1950) desfilam um rosário de provocações que arrancam boas risadas do ouvinte ao vê-los falando que são melhores que os gringos tenores.

A ótima “Ópera do Morro” parte para o desafio. ‘Quero ver Pavarotti, Domingo e Carreras cantando pagode’, provocam os reis da malandragem. Pensa que parou por aí? Então vejam só como começa a quarta faixa, “Malandros in Concert”: ‘Dá-lhe Cornetto! Epa! Cê me chamou de quê, rapaz?’, em que Bezerra da Silva fala de um imaginário show dos pagodeiros no Carnegie Hall (lendária casa de espetáculos em Nova York onde inclusive músicos e cantores brasileiros fizeram um show de Bossa Nova em que Tom Jobim e João Gilberto decolaram para a carreira internacional) em que “até o Carreras veio me cumprimentar” e em que Dicró armou um pot-pourri com direito a Puccini e outras lendas da Ópera. Kid Morengueira fez até Plácido Domingo chorar, ora vejam!

Após as quatro faixas divididas pelos astros cariocas, o disco parte para o show individual de cada um dos Malandros e aí Kid Morengueira mata a pau na divertidíssima “Chave de Cadeia” e na releitura de um dos maiores clássicos de sua carreira, o samba de breque “Na Subida do Morro”, com a narrativa peculiar das composições por ele imortalizadas – e lembro novamente, o sambista estava com 93 anos (!), assim como Bezerra dá o seu recado em “Malandro Não Vacila” (‘Malandro não cai, nem escorrega… malandro não dorme, nem cochila… malandro não carrega embrulho e também não entra em fila’) e na não menos sensacional “Lugar Macabro”, enquanto Dicró conta uma história hilária em “Dava Dois”, que, como o título da faixa conta, é sobre uma mulher que gastava todo o dinheiro do marido em maconha. ‘Só andava com o olho vermelho, falava gíria que eu não entendia… só vivia falando em papel, mas nem bem ela sabia… é porque ela dava dois e eu não sabia’.

Os 3 Malandros in Concert não fez tanto sucesso, não vendeu tanto quanto os Três Tenores gringos – mas é um disco histórico e eterno, que merece uma ouvida, por mais despretensiosa que seja. Garanto que vocês vão dar boas risadas com esses três cracaços do samba que deixaram em nós muitas saudades.

Ficha técnica de Os 3 Malandros in Concert
Selo: Companhia Industrial de Discos (CID)
Produzido por Esdras Pereira
Lançado em 1995
Tempo total: 41’32”

Músicas:

1. O Recital
2. Os Três Pagodeiros do Rio
3. Ópera do Morro
4. Malandros in Concert
5. Ressuscita Ele
6. Chave de Cadeia
7. Malandro Não Vacila
8. O Político
9. Na Subida do Morro
10. Dava Dois
11. Lugar Macabro
12. Jogando Com O Capeta
13. Rua da Amargura

Comentários