Equipes históricas – Ligier, parte XII (Prost)

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Ainda sem o patrocínio dos cigarros Gauloises: o Prost JS45 manteve o azul da Ligier para a temporada de 1997

RIO DE JANEIRO – A Ligier iniciava seus preparativos para a temporada de 1997 do Mundial de Fórmula 1, quando veio a bomba: por US$ 12 milhões da época, ninguém menos que o tetracampeão mundial Alain Prost adquiria de Flavio Briatore o controle acionário da tradicional equipe fundada por Guy Ligier. Assim, Alain realizava o sonho já acalentado desde 1992, quando propôs sociedade ao antigo dono e não houve negócio.

A base do projeto de George Ryton e Loïc Bigois para a Ligier não foi mudada. Nem a sigla do carro: com a anuência das demais equipes, a Ligier tornou-se Prost Grand Prix e o chassi JS45, último com a sigla em homenagem a Jo Schlesser, tinha motor Mugen V10, no último ano de contrato com os japoneses. A novidade estava nos pneus: a Bridgestone vinha para a batalha contra a Goodyear e após mais de dois anos de exaustivos testes de desenvolvimento, os japoneses chegavam para a primeira temporada completa após aparições esporádicas nos GPs do Japão em 1976/77.

O carro tinha novidades interessantes. Na suspensão dianteira, três amortecedores e geometria variável. A distribuição de massas foi melhor trabalhada em relação ao antecessor JS43, que se ressentia de falta de equilíbrio do conjunto. Também foram implantados novos dutos de freio para melhor eficiência dos mesmos. Na aerodinâmica, o carro tinha seção dianteira mais fina, um aerofólio traseiro triplano e um novo projeto de difusor e extrator traseiro.

Olivier Panis foi mantido como principal piloto e por influência da Mugen, veio um japonês: Shinji Nakano, então com 26 anos, egresso da Fórmula 3 japonesa e Fórmula 3000, que estivera na Inglaterra no início da carreira, defendendo a Paul Stewart Racing. O Prost JS45 mostrou de cara o seu potencial. Panis largou em 9º na abertura da temporada no GP da Austrália e logo marcou dois pontos com o quinto lugar. Nakano quase deixou o seu na estreia: foi sétimo.

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Impressionante em Interlagos: com uma única parada nos boxes, Panis fez uma grande corrida e terminou em 3º lugar no GP do Brasil

No GP do Brasil, a Prost voltou a impressionar. Com o 5º tempo, Panis foi o mais rápido entre os pilotos com pneus Bridgestone no grid e chegou a andar em segundo na primeira metade da disputa. Numa estratégia diferenciada, o francês caiu para 7º após sua parada para troca de pneus e reabastecimento. Os rivais parariam mais uma vez, mas o piloto do carro #14 não. E como resultado, Panis tinha um dos melhores carros da pista no final da disputa. Acabou a menos de 16 segundos do vencedor Jacques Villeneuve, para conquistar o quarto pódio da carreira, atrás também da Benetton de Gerhard Berger. Nakano fez uma corrida muito abaixo do colega de escuderia e fechou em décimo-quarto.

Panis estava mesmo em alta e os pneus Bridgestone, também. Na pista de Buenos Aires, o francês só perdeu em qualificação para os dois Williams de Jacques Villeneuve e Heinz-Harald Frentzen. Com a quebra da embreagem do carro do alemão logo na 6ª volta, Panis passou ao 2º lugar e por lá ficou, muito próximo do líder Villeneuve. Quando estava a quatro segundos e meio do canadense, pronto para de novo surpreender na estratégia, o motor Mugen Honda do carro do francês expirou. Sem ser brilhante, Nakano teve o mesmo destino, desistindo na 49ª volta. Em San Marino, o japonês se envolveu numa carambola com Damon Hill e abandonou logo no início. Panis completou a disputa em 8º, no pior desempenho da Prost no início da temporada.

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Celebração em Barcelona com Alain Prost: o 2º lugar no GP da Espanha, a menos de seis segundos de Jacques Villeneuve, foi o melhor resultado da história da equipe sob o novo comando

Voltando a Monte-Carlo, território de sua inesquecível vitória no ano anterior, Panis fez o 12º tempo na classificação e uma boa corrida numa pista absolutamente encharcada pela chuva. Desta vez, não deu para ganhar novamente, mas o quarto lugar não pode ser considerado um mau resultado. Nakano largou da última fila e vinha em 11º quando rodou na 36ª volta. E na Espanha, Olivier deu um novo show: largou outra vez em 12º no grid, caiu para décimo-terceiro ao fim da primeira volta, recuperou para quarto antes do primeiro reabastecimento e voltou à pista em oitavo. O piloto da Prost voltou a ganhar posições com várias ultrapassagens e já era segundo na 44ª passagem, quando fez sua segunda e última parada. Acabou depois bloqueado (junto com Alesi e Schumacher) por um pelotão de retardatários formado por Jarno Trulli, Jos Verstappen e Eddie Irvine.

A diferença de Panis para o líder Jacques Villeneuve era de 15 segundos a 10 voltas do fim e foi reduzida a 5″804 na quadriculada. Se o francês passaria o canadense? Isto jamais saberemos. Mas que ele tinha melhor desempenho que Jacques na reta final da corrida, ah… isso tinha. Mais uma vez Nakano foi ofuscado pelo colega de escuderia, desistindo na 34ª volta por quebra de câmbio.

Então veio o GP do Canadá, no dia 15 de junho. Panis fez o 10º tempo no grid, mas acabou se envolvendo numa colisão com a McLaren de Mika Häkkinen e precisou parar nos boxes, caindo para último. Em grande corrida de recuperação, alcançou a 7ª posição e chegou a recuperar a volta perdida, ao superar o líder Michael Schumacher. Mas na 52ª volta, o piloto perdeu o controle do carro e bateu de forma violenta numa proteção de pneus à margem de um trecho de esses em alta velocidade. A direção de prova deu Safety Car e depois, bandeira vermelha, interrompendo a disputa. Panis sofreu fraturas em ambas as pernas e ficaria um bom tempo fora das pistas. Antes do acidente, marcara 15 pontos e dois pódios. O acidente beneficiou Shinji Nakano, que fez enfim uma corrida bastante razoável e conseguiu a 6ª colocação e seu primeiro ponto na F1.

A Prost tinha um pepino para resolver. E Flavio Briatore, como sempre muito esperto, acenou com uma saída barata para o time de Alain Prost: “emprestou” um dos pilotos dos quais era agente, o jovem italiano Jarno Trulli, que fazia boas apresentações no modesto carro da Minardi. A estreia foi logo no GP caseiro do time em Magny-Cours, na França. E Trulli andou muito bem nos treinos: fez o 6º melhor tempo no grid. Mas na corrida choveu, a equipe errou a mão na estratégia e o jovem italiano chegou em décimo. Nakano conseguiu o 12º lugar no grid e rodou logo no início. Em Silverstone, o italiano chegou em 8º e o japonês, que vinha num sólido sexto posto, conquistado com o abandono de Mika Häkkinen, teve o motor de seu carro estourado na última volta. Castigo imerecido que rendeu a Damon Hill, então na Arrows, o primeiro ponto do campeão de 1996 naquela temporada.

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Estreante na Fórmula 1 em 1997, o japonês Shinji Nakano pontuou duas vezes, no Canadá e na Hungria

Tendo iniciado sua carreira nos monopostos na Alemanha, com o título da Fórmula 3 naquele país, Trulli tinha ótimas lembranças da pista de Hockenheim. E fez uma ótima corrida: passou em 7º ao fim da primeira volta, vindo de décimo-primeiro. E com os problemas de outro oriundo da Minardi, Giancarlo Fisichella, chegou num ótimo quarto posto após andar em segundo durante os reabastecimentos dos adversários. Nakano novamente esteve próximo de beliscar um pontinho e foi novamente sétimo. Mas em Hungaroring, mesmo largando da 16ª posição, o japa fez uma ótima corrida e chegou em sexto – pela segunda (e não primeira) vez no ano. O mais incrível: à frente de Trulli.

Na Bélgica, Trulli largou dos boxes numa corrida para esquecer: perdeu duas voltas e chegou em décimo-quinto, mesmo com três pilotos enfrentando problemas no final. Nakano desistiu na quinta volta com pane eletrônica em seu Prost. Em Monza, no GP da Itália, os dois carros não conseguiram velocidade por conta do sobrepeso do motor Mugen Honda e chegaram só em 10º e 11º, respectivamente. E a grande forma da equipe no início do campeonato foi revivida na Áustria, numa atuação magistral do italiano: terceiro no grid, Trulli liderou com autoridade – e maturidade, sem cometer nenhum erro e abrindo vantagem – as 37 primeiras voltas, até parar. A estratégia era perfeita e podia ter rendido o pódio à equipe e ao piloto, mas o motor estourou na 59ª volta. Com Trulli em segundo e razoavelmente próximo de Villeneuve, que venceria a corrida. Para tristeza dos japoneses, o motor do carro de Nakano estourou na mesma volta.

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Quarto colocado no GP da Alemanha e líder no GP da Áustria por 37 voltas, Trulli deixou ótima impressão e conseguiu um contrato para a temporada seguinte na Prost

A melhor corrida de Trulli em sua curta carreira na Fórmula 1 foi a última dele naquele ano de 1997. Porque Olivier Panis, recuperado da dupla fratura, voltou ao cockpit após um teste com um Fórmula 3 que motivou o piloto a voltar ao carro #14. O italiano não saiu de mãos abanando: ganhou um contrato para ser piloto da equipe em 1998 – o que significava a saída de Nakano da escuderia. E ao mesmo tempo, foi anunciado um acordo com a Peugeot, que fornecia motores para a Jordan desde dois anos antes, para a temporada do ano seguinte.

Panis regressou no GP de Luxemburgo, em Nürburgring. E voltou bem: chegou em 6º lugar, somando um pontinho. O demissionário Nakano teve o motor quebrado na 15ª volta. No Japão, terra da Mugen Honda, os dois Prost desistiram: Olivier por quebra de motor e Nakano por pane de transmissão. E em Jerez de la Frontera, na eletrizante decisão da temporada que marcou o GP da Europa, Panis chegou em sétimo e Nakano, encerrando sua trajetória pelo time gaulês, foi décimo.

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Panis voltou com um pontinho somado no GP de Luxemburgo e o time fechou o Mundial de Construtores em 6º lugar com 21 pontos. Nada mal…

A equipe impressionou com o novo nome, principalmente na primeira metade do ano, com as ótimas performances dos pneus Bridgestone e de Panis, antes do grave acidente do Canadá. O 6º lugar no Mundial de Construtores com 21 pontos foi comemorado e muitos passaram a imaginar o que o time de Prost poderia fazer com os motores Peugeot, uma vez que a Jordan marcara 12 pontos a mais, sendo a melhor equipe depois das quatro grandes forças da categoria àquela época – Williams, Ferrari, McLaren e Benetton.

No próximo post, falo do que aconteceu com a ex-Ligier nos anos de 1998/99.

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