Berta LR: uma história que vale a pena ser contada

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Largada dos 1000 km de Buenos Aires em 1970: em primeiro plano, o Berta LR com o numeral #2 enfrenta de igual para igual os protótipos europeus no Mundial de Endurance

RIO DE JANEIRO – Não foram só os irmãos Fittipaldi que desafiaram a lógica no automobilismo, construindo carros de corrida para competições internacionais fora dos grandes centros do esporte a motor.

Se os brasileiros foram ambiciosos e fizeram um Fórmula 1 após inúmeras experiências que incluíram um Fusca de dois motores, o Fitti-Porsche e prosaicos Fórmula Vê, Oreste Berta, o Mago de Alta Gracia, também fez história nos anos 1970.

Naquela época, a América do Sul vivia um intenso intercâmbio com o automobilismo internacional. Vieram para o Brasil e Argentina provas de Fórmula 3, Fórmula 2 e também do Mundial de Esporte Protótipos.

E foi para este último certame que Berta construiu sem dúvida o mais belo carro esporte já concebido por estas plagas: o Berta LR.

Este carro, concebido para receber um motor (Tornado) que o próprio Oreste desenvolveu com base no lendário Ford Cosworth DFV V-8 de 3 litros de capacidade cúbica, mostrou muito potencial.

Nos 1000 km de Buenos Aires, em 1970, o protótipo pintado totalmente de branco e pilotado por Carlos Marincovich e pelo lendário Rúben Luiz di Palma, partiu da terceira posição no grid, o que provocou espanto de muitos pilotos de fora e da imprensa internacional. Mas um problema besta – a perda de um dos pesos de balanceamento de uma das rodas, aliada a um vazamento de gasolina – tirou o protótipo portenho de combate.

O sonho virou sucata na semana seguinte, nas 200 Milhas de Buenos Aires, prova disputada em duas baterias. Logo na primeira série, Carlos Marincovich sofreu um forte acidente e o Berta LR ficou parcialmente destruído.

Mãos à obra e Oreste Berta o recolocou na pista para, em maio, embarcar rumo à Alemanha e à disputa dos 1000 km de Nürburgring. O lendário circuito de Adenau abriu passagem para o protótipo LR, que conquistou o 14º tempo no grid – resultado extraordinário para a mesma dupla de pilotos – Marincovich e di Palma. Mas um vazamento de água na quinta volta estragou a excelente performance do carro.

O Berta LR ganhou melhorias para o ano de 1971, com o apoio da estatal YPF. Oreste Berta encomendou junto a Keith Ducworth uma unidade do motor Cosworth para seu protótipo. O construtor de Córdoba acreditava que com os 480 HP do motor aliados ao baixo peso (678 kg) do Berta LR, o carro seria um dos mais promissores do ano.

A esperança caiu por terra rapidamente, pois o motor trazido da Inglaterra era recondicionado e tinha um problema grave. Uma das bielas apresentava uma fissura interna e, como não havia peças de reserva, Berta mandou forjar uma lá mesmo na Argentina. Não deu certo: a biela portenha media 45 unidades Rockwell contra 64 do Cosworth.

Nos treinos, fracasso: o carro fez o 22º tempo entre 23 inscritos e Berta retirou-se do evento.

A sina repetiu-se no ano seguinte e de novo o Berta LR (desta vez com o motor Tornado construído pelo próprio Oreste) gorou a expectativa da torcida, frustrada em não ver o principal protótipo argentino dos anos 70 na pista.

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Angel Monguzzi deixa os boxes de Interlagos para a disputa dos 500 km de Interlagos em 1972: nos treinos, o piloto argentino foi mais rápido até que o Porsche 908/2 de Luiz Pereira Bueno, mas o protótipo concebido pelo Mago de Alta Gracia teve problemas técnicos e abandonou a prova

Ainda em 1972, o carro regressou para os 500 km de Interlagos, com Angel Monguzzi ao volante. Nos treinos, o piloto brilhou – fez o 3º tempo na classificação, na frente do Porsche 908/2 de Luiz Pereira Bueno. Mas na corrida, um problema na injeção de gasolina fez Monguzzi desistir depois de uma única volta.

Outro carro correu com Rolando Nardi, igualmente veloz. E um acidente na 41ª volta demoliu o protótipo.

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Oreste fez um Fórmula 5000, adaptou o carro para tentar estrear na Fórmula 1 com Néstor García Veiga, mas o motor Cosworth montado no Berta era pouco potente. Curiosidade: quem esteve por um triz de emprestar uma unidade aos argentinos foi Wilsinho Fittipaldi e a Copersucar, que também estreava na categoria em 1975

Encerrada a aventura do Berta LR, o construtor ainda experimentou fazer um Fórmula 5000 e mais tarde adaptou o chassi para receber um motor Cosworth de F-1 e assim tentar competir no GP da Argentina de 1975 (coincidentemente, o mesmo onde estreou o Copersucar).

Mas como o motor só tinha 410 HP de potência, Berta desistiu do empreendimento.

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O Hollywood Berta-Ford que venceu o último Brasileiro de Divisão 4, disputado em 1975. Luiz Pereira Bueno só não levou o título invicto porque bateu num Bimotor apelidado de “Misto Quente” em Cascavel

Ele se redimiu nesse mesmo ano, quando a equipe Z (Hollywood) encomendou-lhe um projeto para o Brasileiro de Divisão 4. Não era novidade a parceria Berta-Hollywood, pois no ano anterior Tite Catapani correra num brabíssimo Maverick totalmente envenado na oficina de Córdoba e apelidado “Haras Hollywood”.

Assim surgiu o Hollywood-Berta-Ford, que nas mãos de Luiz Pereira Bueno só não conquistou de forma invicta o último certame da história daquela categoria na classe A, graças a uma barbeiragem de Aírton Szidlowski, um piloto de Cascavel que corria num estranho protótipo Bimotor Corcel-VW, apelidado de “Misto Quente”.

Comentários

  • O trabalho de Oreste Berta na Argentina, como um todo, é um ponto fora da curva: desenvolveu um trabalho improvável para o nível do automobilismo da America Latina, preparando e criando carros e motores sensacionais. E o Berta LR, alem do desempenho excelente, era lindo ! Assim como seu seguidor, o Berta Hollywood,
    Pena que Oreste nunca conseguiu atingir o nivel de desenvolvimento desejavel para o seu motor de 3 litros, que até apresentava bom desempenho, mas pecava em durabilidade.

  • O Berta tem uma bela história. Gostaria de descobrir mais, mas pesquisar em espanhol é complicado, e não confio muito na tradução automática.

  • Prezado Rodrigo, lembro muito bem do impacto que o LR causou à época na imprensa especializada internacional e acho que não há, fora dos grandes centros da Europa e América do Norte, história tão fenomenal como a do ousado e competente Oreste Berta. Houvesse então um pouco mais de apoio financeiro e fé e agora argentinos poderiam se vangloriar de possuírem uma marca de prestígio – Berta – equivalente a Ferrari, McLaren, Shelby etc. Como costumamos dizer hoje em dia: “Que oportunidade perdida!”

  • Procure: “84 hs de Nurburgring 1969”- Misión Argentina-Fangio -Oreste Berta e leia em espanhol que é melhor do que uma traducao automática.