Equipes históricas – Prost, parte III

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Uniformizados: a Prost Grand Prix pronta para a temporada de 1999 em Melbourne, na Austrália, com o AP02

RIO DE JANEIRO – Antes de mais nada, milhões de desculpas aos leitores do blog que esperaram tanto tempo para ver retomada a série das equipes históricas da Fórmula 1, que começou tão bem com a Copersucar-Fittipaldi, contou a trajetória da Tyrrell e chegou à Ligier desaguando na Prost. Mas agora vamos tentar seguir em frente, apesar da carga de trabalho que me tira tempo para dedicar extensivamente a este tipo de postagem.

Mas vamos lá… prometi e vou cumprir. Chegou a hora de dissecar a temporada de 1999 da equipe francesa.

Seria o terceiro ano da escuderia após a mudança de nome e o segundo no contrato de três anos com a Peugeot – que, como pudemos descobrir anos mais tarde, numa entrevista dada por Alain Prost, que o fornecimento dos propulsores aos gauleses estava longe de ser gratuito como muitos pensavam. A marca do Leão cobrava (e não era barato) pelos motores, o que veremos futuramente o quanto isto custaria ao time do tetracampeão mundial de pilotos.

Após um ano desalentador, a Prost Grand Prix tinha um reforço dos grandes na parte técnica: ninguém menos que John Barnard. O celebrado desenhista do Chaparral de Fórmula Indy e depois dos McLaren que influenciaram toda uma geração de bólidos pelos anos seguintes, sem contar o trabalho na Ferrari com o carro de câmbio semiautomático, entrou na equipe de engenheiros que trabalhou na concepção do modelo AP02.

Sob a direção de Bernard Dudot, Loïc Bigois desenhou o carro, que contou com a colaboração do aerodinamicista Ben Wood. O Prost AP02 era um carro bem mais convencional que seu antecessor. O monocoque de fibra de carbono ancorava as suspensões de duplos triângulos com barras de torção atuando pelo sistema push-rod. A única inovação possível na aerodinâmica, com as X-Wings definitivamente banidas, foi o uso de pequenas aletas nas derivas laterais.

Os motores também tinham novidades: a mais recente versão do Peugeot V10 foi batizada de A18 e podia debitar 800 HP a mais de 17 mil rpm. Pelo sexto ano consecutivo – incluindo a Ligier – Olivier Panis permanecia fiel à equipe, com Jarno Trulli, seu companheiro de escuderia desde a temporada anterior, permanecendo a bordo para mais um ano.

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Seria o segundo e último ano da equipe com Olivier Panis e Jarno Trulli

A temporada da equipe não começou no melhor nível, embora Trulli tenha obtido um razoável 12º lugar no grid. Tanto ele quanto Panis, que partiu de vigésimo, abandonaram. Mas um presságio de um ano melhor que o anterior veio com um positivo 6º lugar de Panis no GP do Brasil.

Mas os problemas de confiabilidade enfrentados no ano anterior começaram a cobrar a conta e a primeira metade do campeonato não reservaria muitas emoções. No GP de San Marino, os dois pilotos abandonaram e em Mônaco, com uma ótima classificação de Trulli – 7º no grid – a equipe alimentou alguma esperança de conquistar um bom resultado. De fato, o italiano chegou a figurar entre os seis primeiros, mas acabou suplantado pelas Benetton de Fisichella e Wurz, amargando a primeira posição fora da zona de pontuação.

Em Barcelona, Trulli voltou a ser superior a Panis em ritmo de classificação e os esforços do piloto empresariado por Flavio Briatore pagaram dividendos no GP da Espanha. Com atuação sólida e combativa, em que inclusive alcançou o quinto posto, Jarno fez enfim seu primeiro pontinho no ano. No Canadá, o italiano novamente foi superior a Panis nos treinos, mas acabou abandonando após um acidente forte logo após a largada, no qual também se envolveu a Sauber guiada por Jean Alesi e a Benetton do austríaco Alex Wurz – uma carambola que aconteceu em circunstâncias muito parecidas com o ano anterior.

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Foi um ano de altos e baixos mas, sem sombra de dúvidas, muito melhor que 1998

No seu GP caseiro, a Prost tirou partido do amplo conhecimento da pista para ter uma boa performance em qualificação. Panis impressionou numa pista molhada e fez o 3º tempo do grid, enquanto Trulli classificou-se em oitavo. Na corrida, dominada pelo pole position Rubens Barrichello, a dupla da equipe francesa teve sua melhor performance em toda a temporada, andando em grande parte da disputa no top 6. Mas as reviravoltas do clima foram desfavoráveis à Prost e nenhum dos dois pilotos pontuou – apesar dos enormes esforços. Panis esteve várias voltas na 4ª posição e acabou num frustrante oitavo posto – logo atrás de Trulli.

A equipe voltaria ao meio do pelotão nas duas etapas seguintes, disputadas em Silverstone e Spielberg, onde o melhor resultado foi mais um 7º lugar, com Trulli. Na Alemanha, Panis novamente classificou-se bem e voltou à zona de pontuação, mesmo ultrapassado pela McLaren de David Coulthard nas voltas finais. Essa foi a corrida em que a Ferrari inverteu posições para possibilitar a liderança do campeonato para Eddie Irvine e em que o irlandês ofereceu – no pódio – o troféu de vencedor ao substituto de Michael Schumacher, acidentado na Inglaterra – o finlandês Mika Salo.

Nas três etapas seguintes, o desempenho dos pilotos da Prost voltou à normalidade. Trulli foi 8º em Budapeste enquanto Panis foi décimo naquela corrida. Após mais uma performance sofrível na Bélgica, novo abandono duplo em Monza, no GP da Itália, em que o motor do carro de Panis quebrou na última volta – o que não fez nenhuma diferença ao fim da disputa. E aí veio o imprevisível GP da Europa, no circuito de Nürburgring.

Àquela altura, a briga pelo título se resumia a três pilotos: Eddie Irvine e Mika Häkkinen empatados com 60 pontos e um incrível Heinz-Harald Frentzen, que renascera na Jordan, estava a dez pontos dos dois e, ao vencer o GP da Itália, entrou de vez na briga pelo título. Correndo em casa, já que a corrida era em território alemão, Frentzen largou na pole e rumava para a vitória, num início marcado ainda pela pista seca. Mas o abandono do piloto, na 32ª volta, em razão de uma pane elétrica, mudou os rumos do campeonato.

A corrida já se tornara uma autêntica loucura por conta de um erro terrível dos mecânicos da Ferrari, que não levaram os pneus para o pitlane quando Eddie Irvine parou. Desastre completo para um dos líderes do campeonato. Pouco depois da metade, uma chuva torrencial caiu com tudo no circuito e levou de roldão o escocês David Coulthard, um dos favoritos.

Mas a água não demoraria muito tempo a cair. Ralf Schumacher segurou-se o quanto pôde, mas teve que parar. Giancarlo Fisichella arriscou tudo: manteve-se na pista de forma brilhante com pneus para piso seco, mas… rodou na 49ª volta. Àquela altura, a pista começava a secar e alguns pilotos foram certeiros no bote para trocar de pneus. Um deles foi exatamente Jarno Trulli. O outro, Johnny Herbert, companheiro de equipe de Rubens Barrichello na Stewart.

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Espirrando champagne no pódio de Nürburgring: com uma troca certeira de pneus de pista molhada para seca, Jarno Trulli conquistou o melhor resultado da Prost em 1999… e um contrato para mudar de equipe no ano seguinte

O nível de loucura do GP da Europa pôde ser medido quando vimos em quarto a Minardi de Luca Badoer, com Marc Gené em sétimo. Mas a transmissão do carro do italiano quebrou e ele abandou, em prantos. Mas desde a 50ª volta, o pódio já estava desenhado e a corrida terminou com Herbert vitorioso, Rubens contente pela equipe e pelo parceiro – mas certamente frustrado por não ter sido ele o vencedor (aliás, Jackie Stewart afirmou no último GP do Brasil que acreditava que o brasileiro venceria aquela corrida) e com Trulli ofertando à Prost um ótimo resultado, muito melhor do que podiam imaginar – e uma injeção tremenda de ânimo para o ano seguinte.

Mas as consequências seriam outras, pelo menos para os pilotos: Jarno Trulli foi seduzido por uma boa oferta da Jordan e assinou contrato com uma nova equipe para 2000, enquanto Olivier Panis, cansado de levar ferro com um carro não competitivo, aceitou ficar fora da categoria no ano seguinte para um ano sabático. Nas últimas duas etapas, na Malásia e no Japão, só desilusão, apesar de um ótimo grid da dupla em Suzuka, onde Panis desistiu com problemas elétricos e Trulli com pane no motor.

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Nos boxes de Sepang: a Prost fechou o ano em sétimo entre os Construtores e teria caras novas em 2000, graças as saídas de Trulli para a Jordan e de Panis para um ano sabático

A Prost fechou o ano com nove pontos somados e o 7º lugar no Mundial de Construtores. O resultado deveria impulsionar a equipe a um melhor patamar, certo? Veremos se isto aconteceria de fato no próximo post – prometo que não vai demorar muito.

Comentários

  • Duas observações sobre esse inesquecível GP da Europa:

    1 – Tivemos uma das maiores demonstrações de pilotagem na F1, com Half Schumacher numa decadente Williams. As circunstâncias da prova o impediram de vencer aquela corrida;

    2 – Ninguém me tira da cabeça que o Irvine foi sabotado naquele pit stop… tinha gente dentro da Ferrari que não queria vê-lo campeão e, por consequência acabar com o jejum da Ferrari.

    Esse GP foi um dos melhores de todos os tempos da F1…

  • Minha equipe favorita, considerando também o passado como Ligier, claro! E que carro lindo esse AP02! Para mim, como fã de carteirinha da equipe, o mais belo da Formula 1.

    Torço muito que com a gestão da Liberty, haja um envolvimento mais honesto das fábricas na Formula 1. Sem essa de compra/descompra/recompra que faz os times da categoria mudarem de nome todo ano. Mas sim, com a promoção de um ambiente estável que permita a real entrada de mais fábricas e um acréscimo no número de carros. Dentro disso, penso que a Onroak seria uma candidata perfeita para levar a França de volta para a F1, tendo uma operação já responsável por contruir um F3 nos EUA, e a proximidade logística com a DAMS.

    Quem sabe, até mesmo usando o nome “Ligier”.

    Seria perfeito!

  • Primoroso.

    Mas queria fazer uma pequena correção: A nova carambola da largada do GP do Canadá desta vez não havia envolvido o Wurz,mas sim a Stewart de Rubens Barrichello.