30 anos de Senna, parte III – GP de Mônaco

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GP de Mônaco de 1988: sem exageros, a corrida em que Ayrton Senna perdeu para ele mesmo

 RIO DE JANEIRO – Empatado em vitórias com Alain Prost, Ayrton Senna buscava no mínimo o empate em pontos com o rival e companheiro de equipe na 3ª etapa do campeonato, que seria o GP de Mônaco. No ano anterior, o brasileiro conquistara sua primeira vitória ali, quebrando o protocolo com um belo banho de champagne na família Grimaldi e aplacando – um bom tempo depois – a tristeza da corrida de 1984.

Mas isso já era passado. Com nove pontos na tabela pela vitória em Imola contra 15 de Prost, Ayrton tinha em mente derrotar Alain e acirrar a luta pela liderança do campeonato. Nos treinos de classificação, o brasileiro quis provar que para vencê-lo nas ruas do Principado seria preciso o chamado “algo mais”.

A definição do grid de largada e a pole position de Ayrton Senna foram um momento histórico em Monte-Carlo. Poucas vezes se viu Senna tão obstinado e focado no objetivo de destruir Prost como naquele fim de semana.

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“Era algo além da minha compreensão humana”, definiu Ayrton, quando soube que tinha sido nada menos que 1″427 mais veloz que Prost no circuito então com 3,328 km de extensão.

Uma diferença abissal. Nascia o “Magic Senna”.

Quem viu, viu. O brasileiro fez misérias e descreveu a sensação de andar tão rápido com lâminas de guard-rail por todos os lados como uma experiência incrível. Depois de cair em si, tomou um susto. Entrou nos boxes e não foi mais à pista. Já tinha o suficiente para mostrar ao vizinho de garagens que a batalha seria de tirar o fôlego.

O mais incrível de tudo isto é que a Honda preferiu manter no McLaren de Senna a versão anterior de seu motor, oferecendo a Prost e Nelson Piquet a evolução batizada de XE3, com um melhor posicionamento da válvula pop-off do turbocompressor e, ao mesmo tempo, com uma resposta e torque melhores para circuitos sinuosos. O Lotus 100T do tricampeão também apresentava outras novidades técnicas implementadas por Gérard Ducarouge, mas o chassi ainda respondia mal. Prost, por seu turno, preferiu voltar ao mesmo motor de Ayrton no sábado em que levou uma lavada na qualificação.

Com Nakajima fora pela primeira vez na carreira, fazendo companhia a Bernd Schneider, Adrián Campos e Julian Bailey, o grid de 26 carros acaba reduzido em um piloto porque o AGS de Philipp Streiff tem problemas de última hora e o francês acaba não largando. O que não atrapalha a cotação do dólar.

Senna parte com perfeição na largada, enquanto Prost vacila e permite que a Ferrari de Gerhard Berger assuma o 2º posto. Ao ritmo de um segundo por volta, o brasileiro deixa o austríaco distante e o francês, sem conseguir encontrar brechas, fica preso atrás do carro #28.

Com seis voltas, a vantagem do líder é de sete segundos e seis décimos, ampliada para 13 na 10ª passagem. Na décima-terceira volta, Ayrton faz a melhor volta em 1’28″519 e Prost continua angustiado sem conseguir superar Berger.

Na 17ª volta de um total de 78 previstas, o líder enfia vinte segundos em Berger e Prost, que por sua vez começa a ver a aproximação da Williams de Nigel Mansell em seus espelhos retrovisores. Para Alain, o GP de Mônaco segue um pesadelo – e a diferença aumenta de forma constante, enquanto Nigel arrefece os ânimos: a temperatura do motor Judd foi às alturas e o piloto teve que tirar o pé para evitar os problemas crônicos de superaquecimento das primeiras etapas.

Trinta voltas completadas. Senna chega a 25 segundos de vantagem para a Ferrari #28, com Prost montado no austríaco e Mansell com Michele Alboreto muito próximo, em quinto. Os demais: Alessandro Nannini em sexto, Riccardo Patrese em sétimo, Derek Warwick em oitavo, Jonathan Palmer na nona posição e Thierry Boutsen em décimo.

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Nunca se provou uma dúvida que existiu – e existe até hoje. Afinal, Senna quis ou não pôr uma volta em Alain Prost no GP de Mônaco de 1988?

Enquanto Senna passeia, no afã de se livrar de Mansell, Alboreto se precipita nos Esses da Piscina e no contato com a Williams #5, manda o Leão para o guard-rail. O italiano segue em frente, sem saber se seu carro tem danos que possam prejudicar sua participação na disputa. Logo depois, Patrese abandona quando pressionava Nannini, com a caixa de câmbio bloqueada.

Na metade da disputa, o tráfego intenso permite a Prost ensaiar uma ultrapassagem, mas Berger – muito atento – impede que o francês ganhe o segundo lugar. Quando a corrida chega à 40ª volta, Senna conta com quase 41 segundos de vantagem para o austríaco, enquanto Alain continua na carga para tentar a posição.

Impaciente, Alain pressiona mas não consegue seu intento. A esta altura, Ayrton vira dois segundos por volta mais rápido que qualquer um. A intenção do brasileiro é humilhar o adversário e companheiro de equipe. E ele vai demonstrando isso com uma superioridade poucas vezes vista no Principado de Mônaco naquela época da Fórmula 1.

Quinquagésima volta: Senna tem quase 52 segundos sobre Berger e Prost continua no encalço do austríaco. Um pouco depois, Ayrton começa a administrar a diferença. Já tem a melhor volta da prova e lidera de ponta a ponta. Só faltava levar o carro para a quadriculada e para a segunda vitória consecutiva nas ruas de Monte-Carlo.

A 24 voltas do final, finalmente Prost ganha de Berger a segunda posição. O francês consegue uma brecha, passa a Ferrari e despacha o rival. Mas a margem de Ayrton sobre ele é intransponível: quarenta e oito segundos separam os colegas de McLaren.

Sem o obstáculo à frente, Prost joga com as cartas que tem: faz a melhor volta da disputa em 1’26″714. Avisado pelo rádio, Ayrton replica na volta seguinte – 1’26″321. Não era necessário, mas o brasileiro volta a ganhar terreno e fica 52 segundos à frente. Tirando os dois e a dupla da Ferrari, os demais carros que continuam na disputa já têm uma ou mais voltas de atraso.

Ron Dennis intervém pelo rádio e alerta Senna de que o equipamento precisa ser poupado. Quando a vantagem chega a incríveis 55 segundos, o brasileiro passa a rodar na casa de 1’29”. As coisas parecem sob controle.

Mas…

A doze voltas para o final, Ayrton chega à parte baixa da pista. Faz a descida da Loews e se aproxima da Virage Portier, uma curva relativamente tranquila à direita, que leva para o túnel embaixo do Hotel que tem o nome da curva da antiga estação ferroviária. Num raro momento de hesitação, talvez de relaxamento ou de perda de concentração (na opinião de seus detratores), Senna se perde e bate.

É o suficiente para o brasileiro, que liderava facilmente, abandonar a corrida. E ser agraciado com o nada simpático título de “O Barbeiro de Mônaco”, dado por um jornal brasileiro.

Senna não vai para os boxes. Toma o caminho do edifício Houston, no Boulevard Princesa Grace, onde mora, a alguns quarteirões do local do acidente. Prefere esfriar a cabeça longe do burburinho do paddock e não ouvir sermões de Ron Dennis. Melhor assim…

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No pódio, Prost ergue satisfeito a taça pela vitória, quarta do francês em Mônaco e trigésima da carreira, ampliando o recorde histórico que na época era seu

Prost agradece. Ganha de presente uma liderança com a qual jamais sonhou e tampouco teve possibilidades de sequer alcançá-la em condições normais. Chega a abrir 14 segundos para Berger e, mesmo administrando, a vantagem vai para pouco mais de 20 segundos. É a 30ª vitória de “Le Professeur”, quarta dele em Mônaco.

Berger e Alboreto completam o pódio. Era o que dava pra fazer, com Warwick de novo em quarto lugar, Jonathan Palmer faturando dois pontinhos com a Tyrrell e Riccardo Patrese, numa luta hercúlea para segurar a Lola-Larrousse de Yannick Dalmas, marcou o último ponto do dia.

Mais tarde, passado o acidente e a corrida, Ayrton – ainda mortificado pelo acidente que lhe tirou a vitória – deu uma entrevista à Rede Globo, na qual disse o seguinte. “Eu diminuí a velocidade assim que Ron (Dennis) falou comigo pelo rádio para tirar o pé. Minha atenção foi relaxada, me distraí”, comentou.

Mas a outros órgãos de imprensa, Senna se revelaria contraditório. Admite o erro para alguns e para outros culpa um pneu que perdia pressão e que teria sido a causa de sua batida.

Prost não perdeu a chance de dar uma ligeira cutucada no ego do companheiro de equipe.

“Mônaco não é um circuito como outro qualquer”, explica. “Na minha opinião, ele bateu primeiro no guard-rail à direita, vi as marcas. Em qualquer caso, eu não entendo. Com cinquenta segundos de vantagem, os lugares estavam garantidos… Se ele cometeu um erro, ele não vai esquecer e não vai repeti-lo. É a experiência”, garante.

“A minha é sólida e me permite dirigir com serenidade, sem exageros. Meu companheiro de equipe chegará um dia nesse mesmo estágio. Levará menos riscos desnecessários. Senna é muito, muito motivado. Ele dirige como nunca. Ele tem tudo a provar, eu, nada. Então eu tenho que lutar com minhas próprias armas e não entrar no jogo dele”, acreditava o francês.

No fim de tudo, Alain dedicou seu triunfo ao presidente da Philip Morris Europe, o executivo italiano Aleardo Buzzi, que comemorava seu aniversário naquele dia 15 de maio. E o placar, agora em 2 x 1 para Prost, também revela que o Mundial de Pilotos tem o francês líder com 24 pontos em 27 possíveis, enquanto Berger tem 12 pontos e Senna cai para terceiro, com nove.

Ainda há muitas batalhas pela frente e a seguinte seria no México, o que será o nosso próximo assunto.

Comentários

  • Já peço desculpas aos sennistas e pachecos em geral em antecipação, mas as palavras de Prost pós vitória foram uma aula.

  • Ayrton deveria ter levado uma ação…
    Ele humilhava a f1..
    Sem graça..rsssssssssssssssssssssssss…
    O cara era de fuder até a primeida dama…
    quem andou de kart via que o cara só andava de lado..nessa barca louca..
    Great Driver ever… o foda é que o cara foi muito cedo…
    Se Fodan os amantes de pé de breque.. como o chiquinhu…etc etc..
    Esse era um cara fora de seu tempo…
    fazia a barca virar o que tinha que virar.. ver esse péssima gravação nota se que o cara na curva da piscina não usava marcha.. vinha no embalo..era anormal..
    Que sujetinho sacana..rsssssssssssssss..não sabia brincar..não..rsssss

  • Se eu como fã já fiquei muito puto da vida imagina o próprio piloto?!
    O lado bom foi que ali foi ao meu ver o ponto de virada do Senna.

  • Por várias vezes tive o privilégio de ver SENNA em ação no Kartódromo de Interlagos…absurdo….ele fazia aquela curva que antecede a reta de largada/chegada como nunca alguém ousou em fazer….admito que tantos e tantos outros pilotos eram “acertadores”…”cerebrais”…”professores”…SENNA não, SENNA era pilotagem pura.
    Não ví CLARK correr, mas li muito ao seu respeito, e na minha humilde opinião, AYRTON CLARK e JIM SENNA foram os melhores em toda a história da F1….

  • Estou adorando ler essa série do Mattar, mas… Sérião que vc postou o vídeo de um jogo de vídeo game simulando a volta do Senna em Monaco?? Ficou bizarro!