Discos eternos – Cabeça Dinossauro (1986)

Titas_CabDinRIO DE JANEIRO – O período de apogeu do rock brasileiro foi marcado por grandes discos e o surgimento de grupos que ficaram para a história. Um deles, vindo de São Paulo, chamou a atenção inicialmente pelo enorme número de integrantes e por seu nome hilariante: Titãs do Iê-Iê, como se autodenominavam lá por 1982/83.

O grupo tinha então Arnaldo Antunes, Marcelo Fromer, Tony Bellotto, Nando Reis, Sérgio Britto, Branco Mello, Paulo Miklos, Ciro Pessoa e André Jung. Nove cabeças, nove ideias. Mas duas delas “rolariam”, no bom sentido: Ciro Pessoa saiu do grupo e André Jung, num troca-troca com o Ira!, deu lugar a Charles Gavin. Foi então com oito integrantes que o então chamado Titãs do Iê-Iê levou uma chuva de latas e vaias no Circo Voador e no Noites Cariocas, em suas primeiras apresentações no Rio de Janeiro.

Mas rapidamente o grupo, que passou a se chamar apenas Titãs quando assinou com a Warner, começou a cair no gosto popular. “Sonífera Ilha” foi o primeiro sucesso, em 1984. Vieram outros mais depois, é verdade. Mas o disco que alçou o grupo ao estrelato definitivo foi lançado em 1986: Cabeça Dinossauro.

Um episódio que contribuiu para o peso sonoro deste álbum, a autêntica porrada que é o disco do início ao fim, foi a prisão de Arnaldo Antunes e Tony Bellotto por posse de heroína em fins de 1985. Ronaldo Bôscoli, que ainda era uma “pena” respeitada, desceu o pau em sua coluna no finado jornal Última Hora, a discussão pegou fogo e o próprio Ronaldo seria homenageado pelo próprio grupo em “Nome aos bois”, faixa do disco Jesus Não Tem Dentes no País dos Banguelas, que viria a reboque de Cabeça Dinossauro.

O terceiro disco dos Titãs é sem dúvida bem mais direcionado que os dois primeiros, que continham ótimas canções, mas eram claramente irregulares. Em Cabeça… há uma uniformidade musical, nos recados abusados e também nos vocais, divididos quase irmãmente entre Branco Mello, Arnaldo Antunes, Sérgio Britto e Paulo Miklos.

Das 13 faixas editadas, praticamente todas fizeram sucesso. Apenas a velocíssima “A face do destruidor”, de 34 segundos e “Dívidas”, passaram em brancas nuvens. O resto do disco tocou incansavelmente nas rádios, em versões mixadas e/ou censuradas, como “Bichos Escrotos”, que tinha um sonoro vão se foder num trecho que até hoje é gritado a plenos pulmões quando a música é tocada em qualquer festa; “Porrada”, repleta de ironias (Medalhinhas para o presidente… condecorações aos veteranos… congratulações para os bancários… gratificações para os banqueiros) e a herege “Igreja”, cantada por Nando Reis, que diz que não gosta de bispo, de Cristo e não diz amém. Polêmica, tanto quanto “Polícia”. (Dizem que ela existe… pra ajudar… dizem que ela existe… pra proteger… eu sei que ela pode te parar… eu sei que ela pode te prender… polícia para quem precisa… polícia para quem precisa de polícia), faixa composta por Tony Bellotto, provavelmente motivada por sua prisão já citada neste texto.

Outras ótimas músicas merecem destaque, feito “AA UU”, “Homem Primata”, “Família”, “Estado Violência”, a faixa-título, e principalmente “O que”, uma das primeiras obras-primas de Arnaldo Antunes como letrista, especialmente inspirada na poesia concretista de Décio Pignatari e Augusto de Campos.

Cabeça Dinossauro contou com o auxílio luxuosíssimo do grande Liminha na produção, auxiliado por Peninha Schmidt e Vítor Farias, além de uma capa que realmente chamava a atenção, com desenhos de Leonardo Da Vinci na capa e contracapa, chamados A expressão de um homem urrando Cabeça Grotesca. Foi chocando, abusando, verbalizando e botando para quebrar que os Titãs ganharam seu primeiro disco de ouro e fizeram desse trabalho um dos mais representativos do rock nacional. Tanto que a Rolling Stone brasileira o colocou em 19º lugar na lista dos 100 melhores álbuns brasileiros de todos os tempos.

Ficha Técnica de Cabeça Dinossauro
Selo: WEA/Warner Music
Gravado no Estúdio Nas Nuvens, entre março e abril de 1986
Produção: Liminha, Peninha Schmidt e Vítor Farias
Tempo: 38’41”

Músicas:

1. Cabeça Dinossauro (Arnaldo Antunes/Branco Mello/Paulo Miklos)
2. AA UU (Marcelo Fromer/Sérgio Britto)
3. Igreja (Nando Reis)
4. Polícia (Tony Bellotto)
5. Estado Violência (Charles Gavin)
6. A Face do Destruidor (Arnaldo Antunes/Paulo Miklos)
7. Porrada (Arnaldo Antunes/Sérgio Britto)
8. Tô Cansado (Arnaldo Antunes/Branco Mello)
9. Bichos Escrotos (Arnaldo Antunes/Sérgio Britto/Nando Reis)
10. Família (Arnaldo Antunes/Tony Bellotto)
11. Homem Primata (Ciro Pessoa/Marcelo Fromer/Nando Reis/Sérgio Britto)
12. Dívidas (Arnaldo Antunes/Branco Mello)
13. O que (Arnaldo Antunes)

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