Discos eternos – Criaturas da noite (1975)

RIO DE JANEIRO – Sempre gostei de (boa) música, desde a infância até hoje, quando é realmente difícil encontrar algum artista que faça algo de qualidade. Por isso, como diria Arnaldo Baptista numa de suas canções, venho me apegando ao passado em busca de viagens sonoras cada vez mais enriquecedoras.

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Um dos grupos que conheci já depois dos 30 anos de idade, porque quando eles surgiram, não era o tipo de música que meu pai ouvia com regularidade foi O Terço. Banda carioca surgida em 1968 com Jorge Amiden (guitarra), Sérgio Hinds (baixo) e Vinícius Cantuária (bateria), começaram numa direção mais clássica, participando de alguns Festivais Internacionais da Canção (FIC), com “Tributo ao Sorriso” e “O Visitante”, conseguindo boas colocações.

Sérgio Hinds foi o primeiro a cair fora do grupo, dando lugar a Cézar de Mercês. Mas o antigo baixista regressaria logo depois, para tocar violoncelo elétrico. Outra novidade foi a criação da “tritarra”, uma guitarra de três braços empunhada por Amiden. A formação não duraria muito, pois Jorge brigou com Sérgio Hinds, que registrou o nome do grupo para si, e caiu fora, montando o grupo Karma em fins de 1971.

Foi uma época de grande influência do rock progressivo nas composições e da participação de Luiz Paulo Simas, então no Módulo Mil, no segundo disco do grupo. Vinícius Cantuária saiu para tocar com Caetano Veloso e entraram, logo depois, Sérgio Magrão (baixo) e Luiz Moreno (bateria).

O grupo foi convidado para tocar num LP de Sá & Guarabyra e essa participação influenciou fortemente a estética da banda, que mantinha-se antenada com os sons progressivos, mas aberta a novas sonoridades, mais rurais, mais Clube da Esquina.

Por falar em Clube da Esquina, foi Milton Nascimento o responsável pela entrada do mineiro Flávio Venturini no grupo em 1974, para pilotar teclados e viola. Sábia indicação. Com Cézar de Mercês fora do grupo (mas ainda colaborando como compositor), O Terço estava com Sérgio Hinds, Sérgio Magrão, Flávio Venturini e Luiz Moreno prontos para cometer um dos maiores discos da música brasileira: Criaturas da Noite.

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Com capa dos artistas plásticos Antônio e André Peticov, Criaturas da Noite é um trabalho marcante na discografia da banda. Começa com o baixo de Sérgio Magrão, abrindo os trabalhos de um dos hinos d’O Terço, “Hey amigo” (Hey amigo… cante a canção comigo… (…) nesse rock estamos todos juntos… nesse rock estamos perto de ser… a unidade final…).

A influência rural e do Clube da Esquina se faz sentir na segunda faixa, “Queimada” (Vira poeira… vira fogueira… vira poeira… fogo fogueira… vira o chão… vira poeira… vira o chão… vira fogueira… de carvão… de carvão), música que depois seria um dos grandes sucessos de Zizi Possi. Não é a única faixa nessa vertente, pois “Jogo das Pedras”, outra parceria de Flávio Venturini com Cézar de Mercês, assim como “Queimada”, segue a mesma toada melódica, com muitos violões.

Linda, marcante mesmo, é a faixa-título, composição inspirada de Flávio Venturini e Luiz Carlos Sá, com arranjo do grande Rogério Duprat. “Criaturas da Noite”, certa vez, tocada aqui em casa na gravação do DVD do grupo com parte da formação clássica – já que Luiz Moreno infelizmente faleceu vítima de um infarto – levou o blogueiro às lágrimas.

As raízes roqueiras e progressivas do grupo não foram esquecidas, em faixas como “Volte na próxima semana” (Sérgio Hinds) e “Pano de Fundo”, esta com um quê de Black Sabbath e até de Santana – por causa do órgão Hammond que Gregg Rolie tocava antes de ir para o Journey; e as suítes instrumentais “Ponto Final” (Luiz Moreno) e “1974” (Flávio Venturini), esta última de arrepiantes 12 minutos de duração.

O grupo transformou este trabalho em Creatures of the night, visando o mercado internacional, com todas as letras vertidas para o inglês. Não tenho dúvidas que, em tempos em que o rock progressivo dava as cartas, O Terço conquistou alguns fãs no exterior.

A formação com Hinds, Moreno, Magrão e Venturini durou até 1976. Flávio Venturini foi embora tocar com Beto Guedes e depois, com seu irmão Cláudio e Sérgio Magrão, que deixaria O Terço em fins de 1978, formaria o 14 Bis.

Entre idas e vindas da unidade final, velhas e novas parcerias, o grupo se reencontrou em 2001, mesmo após a morte de Luiz Moreno, com Sérgio Melo na bateria ao lado de seus “xarás” Hinds e Magrão e de Flávio Venturini. O grupo segue na estrada, não com a mesma frequência de outrora, mas emocionando novos e velhos fãs com músicas que marcaram todos os que gostam dos trabalhos pregressos d’O Terço.

Ficha técnica de Criaturas da Noite

Selo: Underground/Copacabana Discos
Produção: O Terço, Santiago Malnati e Mário Buonfiglio
Tempo: 37’00”

Músicas:

1. Hey amigo (Cézar de Mercês)
2. Queimada (Flávio Venturini/Cézar de Mercês)
3. Pano de fundo (Sérgio Magrão/Cézar de Mercês)
4. Ponto final (Luiz Moreno)
5. Volte na próxima semana (Sérgio Hinds)
6. Criaturas da noite (Flávio Venturini/Luiz Carlos Sá)
7. Jogo das pedras (Flávio Venturini/Cézar de Mercês)
8. 1974 (Flávio Venturini)

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