Discos eternos – Nevermind (1991)

nevermind-nirvanaRIO DE JANEIRO – Esse disco nunca poderia ficar de fora da seção dos maiores da história. Espetacular do começo ao fim, desde a capa com o então bebê Spencer Elden nadando atrás de uma nota de US$ 1 presa num anzol, até sua última faixa, Nevermind foi o segundo e o mais importante trabalho de estúdio do Nirvana em sua curta existência.

Tão importante que, mais de 20 anos depois, o disco segue cultuado como um dos melhores do rock and roll, com quem muita gente voltou a fazer as pazes no início da década de noventa, após um período de ostracismo do gênero, onde derivados da dance music e artistas de ocasião como Mc Hammer e Vanilla Ice, sem contar o infame Milli Vanilli, venderam horrores mas, felizmente, acabaram esquecidos.

A história do Nirvana começou em Aberdeen, cidade próxima a Seattle, no estado de Washington. Lá, um jovem loirinho de pouco mais de 20 anos chamado Kurt Cobain, guitarrista e canhoto, juntou-se ao descendente de croatas Krist Novoselic e ao baterista Chad Channing para gravar no selo Sub Pop, de Bruce Pavitt, o disco Bleach, o primeiro do grupo. Channing caiu fora no início de 1990 e foi no Scream, um grupo punk da região, que Cobain e Novoselic descobriram o cara que faltava à banda: entrou Dave Grohl, assim que o Scream foi para o espaço.

Na época, o grunge já tinha sido descoberto pelas rádios e três grupos – Alice In Chains, Mother Love Bone e Soundgarden – já tinham contratos com gravadoras. Por intermédio de Kim Gordon, do Sonic Youth, a Geffen Records assinou com o grupo, que recebeu um adiantamento de US$ 287 mil para começar os trabalhos. A banda, que trabalhara com Jack Endino em Bleach, teve Butch Vig como seu produtor em Nevermind.

Apesar do clichê de que “rock é barato, fácil e rápido”, não foi simples gravar Nevermind. Algumas canções demoraram a sair, como “Something In The Way” e além disso foram usados três estúdios diferentes. “Polly”, da mesma leva do disco Bleach e que sairia anos mais tarde no álbum Incesticide numa versão mais punk, foi gravada por exemplo no Wisconsin, em 1990. As demais foram divididas entre o Sound City, em Van Nuys e o Devonshire, em North Hollywood, na Califórnia.

O disco começa com um dos hinos do grunge, o rock que mais grudou feito chiclete na minha cabeça e na de toda uma geração. Os acordes iniciais de “Smells like teen spirit” – uma referência nada velada no título a um desodorante à venda nos EUA – já estão entre os mais conhecidos da música em todos os tempos. E a faixa é uma porrada, com os gritadíssimos vocais de Kurt Cobain. Teve direito a um videoclip dirigido por Samuel Bayer onde, em dado momento da gravação, os figurantes começaram a quebrar TODO o cenário. Mais rock, som e fúria, impossível…

A reboque do estrondo que foi “Smells…” vieram para as rádios e paradas de sucesso todas as ótimas faixas seguintes: “Come as you are”, “Drain you”, “Stay away”, “On a plain”, “Breed”, “In bloom” e “Lithium”, esta última a preferida – incrivelmente – do público feminino nos EUA. Na gravação do disco, a grande surpresa é a química entre Grohl e os antigos integrantes, além da ótima performance do baterista como backing vocal em várias faixas. Muito provavelmente por conta disso, Grohl recebeu aí o incentivo para ser o frontman do grupo que formou após o fim do Nirvana, o Foo Fighters.

Voltando aos videoclipes exibidos nos bons tempos da MTV, “In bloom” teve, em sua proposta, uma referência muito bem-humorada ao conceito dos grupos de rock dos anos 50/60, na forma de se vestir e de se apresentar. Mas, ao vivo, a coisa era totalmente outra. O Nirvana ensandecia a plateia com seu som, Kurt Cobain – que, como eu já disse anteriormente, tocava com a mão esquerda feito um conterrâneo que se tornou um mito do instrumento, um certo Jimi Hendrix – fazia sua guitarra gritar até o limite máximo dos decibeis; Novoselic pulava alto com seu baixo a tiracolo e Dave Grohl quebrava tudo na bateria. Os shows acabavam, invariavelmente, com o público enlouquecido de tanto mosh pit, guitarras despedaçadas, amplificadores soltando fumaça e kits de bateria destroçados.

Nós do Brasil, inclusive, tivemos uma amostra da fúria do Nirvana no Hollywood Rock de 1993. Talvez tenham sido alguns dos shows de rock mais caóticos e furiosos que já existiram nestas plagas, com direito a cusparadas nas câmeras de televisão, torrentes de palavrões, referências irônicas ao patrocinador do evento e dezenas de músicas inéditas executadas – algumas delas ainda nem tinham nome – que viriam à luz no polêmico In Utero, lançado naquele mesmo ano.

A Geffen Records jamais imaginou que Nevermind atingisse o patamar que alcançou no mercado musical. A gravadora projetou um limite de 250 mil cópias para o álbum, mas só em território estadunidense foram vendidos 10 milhões de discos que, somados a mais 20 milhões no planeta inteiro, puseram o Nirvana no patamar de uma grande banda de rock em curtíssimo espaço de tempo. Para quem fez um disco orçado em US$ 65 mil, números inacreditáveis, não acham?

Só lamento que Kurt Cobain não tenha sabido conviver com o sistema e o guitarrista acabou por dar um fim à sua própria vida em 5 de abril de 1994. Se em sua canção “American Pie”, Don McLean afirma que a música morreu junto com Buddy Holly, Big Bopper e Ritchie Valens, muita gente diz que no dia em que Cobain saiu da vida e virou história, o rock morreu também.

Ficha técnica de Nevermind
Selo: David Geffen Company/Universal Music
Gravado em abril de 1990 e entre maio e junho de 1991 nos estúdios Smart Studios (Madison, Wisconsin), Sound City (Van Nuys, Califórnia) e Devonshire (North Hollywood, Califórnia)
Produção de Butch Vig
Tempo: 42’38”

Músicas:

1. Smells like teen spirit (Kurt Cobain/Dave Grohl/Krist Novoselic)
2. In bloom
3. Come as you are
4. Breed
5. Lithium
6. Polly
7. Territorial pissings (Kurt Cobain/Chet Powers)
8. Drain you
9. Lounge act
10. Stay away
11. On a plain
12. Something in the way

Todas as demais músicas compostas somente por Kurt Cobain

Comentários

  • Esse disco, na época, me soou como um tapa na orelha, e levei um certo tempo para digerir.

    Depois que passei a entender a proposta e a “estética” musical do grunge, a coisa mudou: hoje, é um dos meus favoritos.

    Algum tempo atrás, comprei um DVD com um documentário sobre a produção do Nevermind, e ela realmente foi complicada: Kurt achou que as letras haviam ficado muito “pop”, daí a opção em fazer um instrumental bem sujo, para compensar isso.

    O lance do clipe de Smells Like Teen Spirit tbm foi legal: aquele quebra que se viu foi real! Não me lembro bem agora, mas, depois de praticamente 12 horas de filmagem, todos estavam de saco cheio, e aí alguém deu essa idéia da quebradeira no último take, e que acabou aceita pelo diretor.

    Com esse começo de férias, vou aproveitar pra escutar esse CD de novo, pq merece!

  • Acho o Nirvana uma consequencia natural do que vinha acontecendo no universo indie americanos e ingles.As guitar bands inglesas da epoca abriram as portas pra sonic youth, mudhoney e dinosaur jr fazerem turnes bem sucedidas junto a bandas como loop , telescopes e swervedriver , sem contar o My bloody valentine .N minha opinião os pixies foram a melhor banda americana , inclusive , quando lançaram discos no esquema organico e barato.As colege radios tiveram muita responsabilidade pela cena da decada de 80 e inicio dos 90.Smells … achei uma cópia deslavada dos pixies e o proprio cobain admitiu isso mais tarde, mas nevermind é um belo album e por curiosidade tenho dois.não porque seja tão fã do nirvana.é que ganhei um de um amigo que tem a contracapa diferente.houve uma arte na contracapa diferente de uma tiragem pra outra.Gosto mais de mudhoney, e tenho uma versão do disco em vinil azul do superfuzz bigmuff.o canal bis até passou por esses dias um documentário sobre heavy metal influenciando o grunge.

  • Disco clássico, banda clássica, lamento por quem não aprendeu a degustar. Mesmo quem ouve e toca Hendrix, Purple e Sabbath deve muito a Cobain. Lembremos que as paradas em 1991 eram dominadas por Michael Jackson, Madonna, MC Hammer e outras chaturas. Nunca esquecerei da capa da Bizz da época: NIRVANA EM PRIMEIRO NAS PARADAS! MICHAEL JACKSON DESTRONADO! OS GUERRILHEIROS TOMAM CONTA DO PALÁCIO

  • Foi uma das bandas que mais demorei pra digerir. Mas depois que eu vi o clip (caraca!) e , claro, ouvi “In Bloom”, eu disse: “Esse é o caminho”.
    Aquilo tudo no CD, meio despojado e sujo,
    meio fúria, meio depressão, uns lampejos de guitarra que realmente era um estilo de rock , a priori, confuso, mas com essência própria – as vezes difícil de entender. Assim como a morte de Kobain.

    Abr