Saudosas pequenas – Minardi, parte IV

RIO DE JANEIRO – Vencido o obstáculo do primeiro ponto conquistado, a Minardi começou o ano de 1989 com boas esperanças na Fórmula 1. Como grande parte dos times médios/pequenos estava com motores Cosworth DFR feito o time de Faenza, Giancarlo Minardi era a imagem do otimismo – mesmo com o ano tendo sido inciado com uma versão ‘melhorada’, ou menos piorada, dependendo do ponto de vista, do chassis M188 do ano anterior.

Pierluigi Martini e Luis Perez Sala renovaram contrato com o time italiano e permaneceram por lá. A novidade, além do motor que era mais forte que o DFZ, com seus alegados 605 cavalos de potência, era o contrato com a Pirelli para o fornecimento de pneus. A decisão de manter os Cosworth foi tomada após Giancarlo Minardi negociar com Carlo Chiti a volta da Motori Moderni, através da Subaru, como fornecedora exclusiva de motores ao time de Faenza. Só que o motor era um boxer de 12 cilindros opostos e que, quando andou num “carro-mula” da Minardi, mostrou que era muito ruim. Giancarlo percebeu o tamanho da encrenca e, para sua sorte, encerrou as negociações.

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Martini começou de início em 1989 com o carro do ano anterior

Após os testes da pré-temporada, onde o carro com pontões maiores se revelou melhor que o modelo do ano anterior, Martini e Perez Sala foram esperançosos para o GP do Brasil em Jacarepaguá. Mas a corrida não foi das mais felizes para os dois: Sala abalroou a Tyrrell de Michele Alboreto e quebrou a suspensão. O motor do carro de Martini quebrou. Em Imola e Monte-Carlo, sempre com o italiano à frente do catalão nos treinos, mais abandonos. Aí o M188B virou peça de museu e o novo carro teve sua estreia programada para a quarta etapa do ano, no México.

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Luis-Perez Sala foi um dos primeiros a andar com o M189, projeto de Aldo Costa e Nigel Coperthwaite

Sem muita quilometragem de testes, o bólido novo foi para a pista às escuras. Como efeito da precipitada estreia do projeto de Aldo Costa e Nigel Coperthwaite, Martini foi apenas o 22º do grid e Perez-Sala foi eliminado por apenas 0″1 por um certo Nelson Piquet, que penava com o horroroso Lotus 101 Judd. O italiano abandonou por falha mecânica.

Nas corridas seguintes, no Canadá e em Phoenix, novos desastres em termos de resultado. Problemas de superaquecimento e acidentes tiraram ambos os pilotos destas duas corridas e na França, Sala novamente não se qualificou. Martini fez o 23º mas desistiu com queda de pressão de óleo do motor Cosworth.

Giancarlo Minardi estava preocupado: faltava uma corrida para a primeira metade do campeonato acabar, a Minardi não tinha pontos, seus carros não tinham terminado nenhuma das corridas anteriores e o caminho natural seria a pré-qualificação (na época o total de carros era de deslumbrantes 38 inscritos para 30 vagas nos treinos oficiais), às 8h da manhã de todas as sextas-feiras.

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Pier Luigi Martini acelera para conquistar um suado 5º lugar no GP da Inglaterra; equipe escapa da pré-qualificação

Porém, carro e pneu ‘casaram’ com a pista de Silverstone como até então não havia acontecido em todo o campeonato. Martini fez o 11º tempo no grid a menos de dois segundos e meio da pole position de Ayrton Senna – o que, dado o orçamento restrito da Minardi, era sensacional. Perez-Sala qualificou-se com a 15ª posição.

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Luis Perez Sala marcou seu único ponto na Fórmula 1 também no mesmo GP da Inglaterra, em Silverstone

E no meio do pelotão, os M189 pintados de amarelo, preto e branco emergiram durante a corrida. Da 39ª passagem até a última volta, Martini figurou entre os seis primeiros. Sala entrou na zona de pontuação quando o Leyton House de Maurício Gugelmin, que vinha em quinto, foi vítima de sua proverbial falta de confiabilidade. Deu tudo certo: Martini foi o quinto, Sala o sexto, a Minardi pontuou com seus dois carros pela primeira vez em sua história e escapou da pré-qualificação. Tudo ao mesmo tempo ontem.

Comprovando o quanto a F-1 era competitiva naqueles tempos, Sala, sexto em Silverstone, sequer se qualificou em Hockenheim, onde Martini foi nono. O M189 melhorava a olhos vistos e mesmo sem testes, era o carro que mais evoluía na segunda metade do campeonato entre os times pequenos. Apesar dos dois carros não terminarem na Hungria, na chuvarada de Spa sobrou um nono posto para Martini e o italiano foi 7º no velocíssimo circuito de Monza, com Perez-Sala em oitavo.

Veio então uma corrida que entrou para a história da Minardi: o GP de Portugal, no Estoril.

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Momento histórico: no GP de Portugal, Pier Luigi Martini chegou a liderar uma volta com a Minardi!

A começar pelo que Pierluigi Martini fez nos treinos: um impressionante quinto lugar no grid, a melhor posição de largada de um carro do time de Faenza até aquela data. E não ficou só nisso: o #23 do piloto italiano ficou em posição de pódio por cinco voltas. Foi terceiro na 35ª volta, atrás de Mansell (que liderava) e Senna, quando Berger parou para trocar pneus. Segundo da 36ª à 39ª passagem, beneficiado pelo pit de Senna. E LÍDER DA CORRIDA na 40ª volta, quando Mansell fez a famosa cagada da marcha-a-ré no circuito português.

http://www.youtube.com/watch?v=blHFXVjbsh8

Sim, leitores e leitoras: todo mundo só lembra do Mansell fazendo bobagem (o que era usual, aliás), mas a Minardi e Martini lideraram em Portugal. Isso já era digno de uma estátua em praça pública para o piloto em Faenza. Mas o pit stop que veio poucas voltas depois deitou por terra todo o esforço do italiano. Só que o bravo Martini não quis sair do Estoril de mãos abanando: beneficiado pelo enrosco entre Senna e Mansell e pela quebra dupla das Williams, mesmo com a feroz perseguição à Benetton de Alessandro Nannini, o piloto ainda conseguiu um honroso quinto lugar.

A fase de Martini no fim do campeonato era mais iluminada que o Farol da Barra. Tanto que o italiano foi o 4º no grid em Jerez de la Frontera e ficou sempre entre os seis primeiros até rodar, talvez nocauteado pelo excesso de confiança. Já psicologicamente destroçado pelo companheiro de equipe, Perez-Sala estragou seu GP caseiro batendo com Maurício Gugelmin, quando brigavam pela nona posição.

Em Suzuka, Giancarlo Minardi precisou substituir Pierluigi Martini, afastado daquela corrida por um problema de última hora. Escalou para o #23 o também italiano Paolo Barilla, o herdeiro da indústria fabricante de massas. A embreagem do carro quebrou logo no começo do GP do Japão e Sala, que largou em 14º, bateu.

Na última corrida do ano, enquanto o espanhol selava sua despedida da Fórmula 1 sem conseguir se qualificar, Martini deu um show nas ruas de Adelaide. Terceiro mais rápido do grid, perdendo só para as McLaren de Ayrton Senna e Alain Prost. Melhor ainda: no mesmo segundo da pole. Fenomenal!

Porém, como todo mundo sabe, a corrida virou uma regata sobre rodas. Martini até andou as duas primeiras voltas em segundo, atrás de Senna. Mas resolveu pilotar com prudência e evitar acidentes – algo que aconteceu em profusão naquele molhado domingo. Sobreviveu ao fim de duas horas de carnificina e foi recompensado com a 6ª posição.

Saldo do Mundial de 1989: seis pontos no Mundial de Construtores e a décima posição ao lado da Onyx – e à frente de Leyton House, Rial, Ligier, AGS e Larrousse. Sem contar Zakspeed, Eurobrun, Osella e Coloni, que não marcaram nada. Um ano de sonho.

E Giancarlo Minardi empolgou-se. Já projetava constantes resultados entre os seis primeiros em 1990, talvez o primeiro pódio do time na Fórmula 1. Os trunfos – Pierluigi Martini e os pneus Pirelli – foram mantidos. Ao se livrar de Luis Perez-Sala, podia ter optado por subir Gianni Morbidelli da Fórmula 3000, mas veio mesmo o tal do Paolo Barilla.

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GP dos EUA, em Phoenix: no circuito do Arizona, Martini coloca o M189 na primeira fila do grid

Pois que fosse assim, então. O M189 ainda era competitivo no começo do ano e Martini, que já tinha barbarizado tudo no ano anterior, iniciou a nova temporada em altíssimo estilo: num treino louco em Phoenix, conseguiu pôr a Minardi na primeira fila de um grid de largada, à frente de 24 outros pilotos (Senna, Piquet, Mansell, Prost, Patrese entre eles, só para constar) e atrás só do pole Gerhard Berger. Se já merecia uma estátua por ter liderado em Portugal, o 2º posto num grid era caso pra estátua e chafariz.

Mas o conto de fadas desvaneceu-se na corrida: Martini largou mal e chegou em sétimo, fora da zona dos pontos. Ofuscado pelo colega de time, Barilla abandonou tanto em Phoenix quanto em Interlagos, onde o #23 largou em oitavo e terminou em nono na volta da F-1 a São Paulo.

Projeto de Aldo Costa com o auxílio de Tommaso Carletti, vindo da Osella, o M190 tinha a estreia programada para o GP de San Marino, em Imola. E aconteceu um incidente chato: Martini tinha o 10º tempo na qualificação, mas bateu e se machucou a ponto de não poder correr. Barilla, último no grid, terminou em décimo-primeiro.

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Marco Apicella, então na Fórmula 3000, testa o Minardi M190

A equipe, por precaução, escalou Marco Apicella (testando na foto acima), que corria na Fórmula 3000, como o reserva imediato de Martini caso o italiano não reunisse condições para correr em Mônaco, 4ª etapa do campeonato. Martini não só conseguiu passar pelo teste físico da FIA, deixando o carro dentro de um tempo limite imposto pelos médicos, como classificou-se em oitavo no grid, abandonando com uma falha na ignição.

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Martini não consegue ser tão competitivo com o M190 como o fora com o M189

Ao contrário do M189, extremamente promissor e “amigo” dos pneus Pirelli, o M190 não casou com os compostos do fabricante italiano. O rendimento do carro novo não era nem parecido com o modelo anterior. E Giancarlo Minardi teve um ano frustrante, com Paolo Barilla colecionando uma desclassificação atrás da outra – foram cinco ao longo do ano e três delas seguidas. Mesmo com todo o dinheiro de sua família, ele não era do ramo e recebeu o bilhete azul do patrão.

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Gianni Morbidelli substitui Paolo Barilla nas corridas finais e estreia pela equipe italiana

Gianni Morbidelli, em quem o chefe deveria ter apostado no começo do ano, chegou para as corridas finais, onde Martini foi 8º em Suzuka e nono em Adelaide. O novo contratado, que assinou com o time para 1991, teve desempenho discreto, abandonando ambas.

Quer saber se a Minardi melhorou em 1991 e o que aconteceu com a equipe? Acompanhe então o quinto post da série, no ar nesta segunda-feira.

Comentários

  • o negócio é que nessa época a safra de pilotos era talentosa,e o carro nasceu bom os resultados aparecem,naturalmente e veja que mesmo com patrocínio o Barilla não ficou se fosse hoje aguentariam com ele infinitamente.O desempenho dos carros de ponta era muito grande podia dizer que até era covardia,os caras andaram muito nessa fase,hoje o troço tá mais parelho,com os motores congelados,agora HRT,de hoje é uma aberração que nem devia ter autorização para competir.

  • Fico me perguntando,como vi o Martini correr apenas as temporadas de 94 e 95(a qual ele se retirou na metade do campeonato),não sei realmente o seu real potencial,mas pela análise das temporadas de 1989 e 90 nunca surgiu uma boa oportunidade p / ele em uma equipe maior ?Estou aguardando a próxima parte pois arrumaram um bom companheiro p/ ele em 91.

  • Além da história deliciosa de uma F1 bem menos lógica, e muito menos cara, tenho que dizer uma coisa: Esse M189 tricolor é um dos carros mais bonitos a disputar um grande prêmio.

    • Corrigindo:
      Pra ficar completo,só faltou colocar as conversações da Minardi com Carlo Chitti pra correr com os Subaru Motori Moderni V12 desta em 1989.

      • No site do Rianov o F1 Nostalgia tem uma foto do Motor Subaru Motori Moderni que que a Minardi testou,Jesus!,me pergunto como é que aquele trambolho enorme coube no carro.

        E quanto a ausencia do Martini no Japão/89,qual foi a razão do Martini não correr lá,Rodrigo?

  • Rodrigo

    Retornando ao assunto da ausencia do Martini em Suzuka/89,qual foi o problema que o impediu de participar daquele fim-de-semana histórico e tumultuado?