Saudosas pequenas – Minardi, parte VI

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Christian Fittipaldi e Fabrizio Barbazza na apresentação do modelo M193

RIO DE JANEIRO – Com o fim da “era V12” na Minardi e sem muito dinheiro para adquirir motores mais potentes e disputar o Mundial de Fórmula 1 em 1993, Giancarlo Minardi optou pelo simples para aquela temporada: pediu a Aldo Costa e Gustav Brunner um carro extremamente convencional, sem sistema de suspensão ativa ou controle de tração – posto que não havia possibilidade de voos mais altos.

O M193, que seria equipado com o motor Ford Cosworth HB Série VI, totalmente defasado em relação às unidades recebidas pela Benetton, teria a condução de Christian Fittipaldi e de Fabrizio Barbazza, que regressava à F-1 após uma má experiência com a AGS e atuações razoáveis na Fórmula Indy noutras temporadas.

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Christian conquistou resultados espetaculares na primeira metade do campeonato

Logo no GP da África do Sul, o primeiro do ano, Christian justificou plenamente a confiança de Giancarlo Minardi. Décimo-terceiro no grid, o brasileiro fez uma corrida excepcional com o carro que tinha e, com muitos méritos, escalou o pelotão até figurar entre os seis primeiros a partir da 34ª volta. Com alguns abandonos à sua frente, Fittipaldi chegou em quarto lugar, resultado muito festejado por toda a gente do time. Já a corrida de Barbazza acabou na 22ª passagem, numa colisão com Aguri Suzuki.

No Brasil, Christian tinha chances de fazer algo parecido com o que ocorreu em Kyalami. Perto da metade da corrida, sem trocar pneus, já ocupava a nona posição. Mas desabou um temporal histórico em Interlagos e o piloto saiu da pista na freada do Esse do Senna. O resto, todo mundo já sabe: Prost pegou o carro de Christian pela proa, bateu e a vitória, com muitos méritos, foi de Ayrton Senna.

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Barbazza andou muito em Donington e somou seu pontinho

Em Donington, na corrida marcada pela primeira volta monumental de Senna, Barbazza foi quem brilhou, com uma excelente atuação. Largando em vigésimo, o italiano andou totalmente à vontade na chuva. Emergiu para 12º logo na primeira volta e com o problema que tirou da pista o Footwork de Derek Warwick a nove voltas da quadriculada, foi premiado com um belo 6º posto. Christian, que fez a quinta volta mais rápida da corrida – atrás apenas de Senna, Prost, Hill e Zanardi – terminou em sétimo.

Àquela altura, a turma de Faenza morria de rir: a Minardi, a minúscula Minardi, tinha quatro pontos no Mundial de Construtores. A Ferrari, toda-poderosa, um. E a vantagem do Davi da Fórmula 1 aumentou no GP de San Marino, noutra corrida onde Barbazza – mesmo largando em último – foi melhor que Christian e chegou de novo em 6º lugar. Placar: Minardi 5, Ferrari 1.

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Num carro convencional ao extremo, o talento de Christian para terminar várias provas sem trocar pneus foi o grande trunfo da Minardi

Em Barcelona, o jeito para a Minardi figurar bem foi apelar para seus dois pilotos não trocarem pneus durante a disputa. Barbazza não cumpriu a ordem, pois rodou e ficou de fora. Christian fez uma corrida inteligente, galgou posições e mesmo com um carro muito mais fraco, andou muito melhor que os Footwork de Suzuki e Warwick e as Jordan de Boutsen e Barrichello. Chegou num impressionante 8º lugar para quem largou da vigésima posição.

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O brasileiro foi 4º colocado em Kyalami e quinto em Mônaco

Mas, mais espetacular ainda, seria o feito do brasileiro em Mônaco. Num circuito onde se sentia totalmente à vontade, Fittipaldi largou de décimo-sétimo e, mais uma vez sem trocar pneus no M193, avançou de forma incrível na classificação para terminar em quinto Um feito de Christian, que mantinha a Minardi ainda à frente da Ferrari no Mundial de Construtores. Por um ponto, é verdade. Mas mantinha.

No Canadá, a alegria da turma de Faenza acabou: a Minardi foi superada pela Ferrari na pontuação graças ao 4º posto de Gerhard Berger no circuito de Montreal, enquanto Christian fez o que pôde para chegar em nono lugar. Em Magny-Cours, ele e Barbazza só foram mais rápidos que Andrea De  Cesaris, com a Tyrrell Yamaha e Michele Alboreto, com o bonde da Scuderia Italia. Outra vez Christian fez uma corrida tática e inteligente, sem parar outra vez para trocas de pneus. E enquanto Barbazza colecionava mais um abandono, o brasileiro percorria quilômetros preciosos, chegando em 8º lugar.

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No GP da Inglaterra, Fittipaldi ofereceu férrea resistência a Jean Alesi, com uma Ferrari e a Rubens Barrichello, então estreando pela Jordan

Em Silverstone, uma cena curiosa: Christian Fittipaldi em luta por posições com uma Ferrari e uma Jordan, teoricamente carros melhores. Mas o F93A de Jean Alesi estava pavoroso em curvas de alta e o carro de Rubens Barrichello também não vinha muito melhor. Christian guiou como nunca e chegou a ocupar a nona posição até o câmbio do M193 quebrar perto do fim da corrida.

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Pier Luigi Martini voltou à equipe no meio do campeonato

Nessa corrida, Giancarlo Minardi voltou a contar com seu velho recruta Pierluigi Martini, que fora de forma na ocasião, abandonou na 31ª volta. Em Hockenheim, onde o carro padecia de falta de potência em relação a todos os adversários, o jeito foi tirar asa e sacrificar o desempenho nas curvas. Martini chegou só em 14º e Christian foi o décimo-primeiro. E na Hungria, o experiente italiano brilhou como nos velhos tempos: largou em sétimo, chegou a andar em quarto e, quando já estava com um jogo de pneus macios, acabou batendo num guard-rail, jogando pelo menos um ponto pela janela.

Christian, que largou da décima-quarta posição, vinha em nono com Alesi em seu encalço. Na 23ª volta, os dois entraram juntos na curva 1 do circuito de Hungaroring. O brasileiro não cedeu e os dois bateram. “Não é porque ele está numa Ferrari e eu numa Minardi que vou deixá-lo passar”, afirmou.

Em Spa, duplo abandono e na mesma volta: Martini rodou e Christian perdeu uma roda do M193. E veio Monza, com a arrepiante cena da capotagem do brasileiro a mais de 250 km/h em plena reta de chegada, com Fittipaldi dando um looping histórico e caindo com as quatro rodas no chão, suspensão destruída, para cruzar em oitavo, atrás de Martini.

“Queria que ele caísse nos meus braços”, comentou o pai de Christian, Wilsinho Fittipaldi, que chorava nos boxes tamanha a tensão provocada pelo incidente.

As relações entre Christian e Martini azedaram completamente e os dois não se falavam nos boxes do Estoril, onde o italiano chegou em oitavo, logo à frente do brasileiro. Aí, dias antes do GP do Japão, Giancarlo Minardi anunciou que leiloava o cockpit do #23, que era de Christian, ao novato francês Jean-Marc Gounon, que vinha com dinheiro do fundo comunitário do tabaco, para os pilotos que tinham patrocínio de cigarro e não podiam expor as marcas diante da proibição existente através da Lei Evin. De acordo com Giancarlo, o dinheiro de Gounon salvaria o fim do ano dos seus funcionários e Christian, fulo da vida, quase processou a equipe. Mas resignou-se e foi procurar onde correr em 1994.

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Jean-Marc Gounon: nada a acrescentar

A troca foi péssima para a Minardi em termos de desempenho. Se Martini terminou em 11º no Japão, abandonando na Austrália por quebra de câmbio, Gounon fez ainda pior: último no grid em Suzuka e 22º em Adelaide, abandonou as duas corridas sem nenhuma atuação digna de registro.

Sem nenhuma evolução do M193, o 8º lugar no Mundial de Construtores podia ser considerado excelente. Afinal, a Minardi ficou à frente de Footwork, Jordan e Larrousse, sem contar a Tyrrell, que não fez ponto algum e a Scuderia Italia, que abandonou o campeonato antes mesmo do seu encerramento.

Aliás, o fim do time de Brescia foi a tábua de salvação da Minardi para 1994, pois Beppe Lucchini propôs sociedade a Giancarlo e a equipe conseguiu ter uma guarida financeira bastante razoável para poder se preparar bem para mais uma temporada.

Como herança da Scuderia Italia, a Minardi voltou a ter Michele Alboreto a bordo, treze anos após sua passagem pela equipe na Fórmula 2. Pierluigi Martini permaneceu para mais um ano e o início do campeonato seria feito com o modelo M193 na versão B.

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O veterano Michele Alboreto fez sua última temporada na Fórmula 1 pela Minardi

A bordo do carro antigo, enquanto esperavam o novo M194 sair da prancheta para a pista, Martini e Alboreto tiveram alguns momentos razoáveis e outros de pavor. No sinistro GP de San Marino, o veterano italiano viu uma roda do seu carro voar após um pit stop e ferir mecânicos de outras escuderias em Imola. Por isso, foi de se impressionar vê-lo terminar em 6º lugar no GP de Mônaco, enquanto Pierluigi Martini conseguiu a quinta posição na corrida seguinte em Barcelona, na Espanha.

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Martini ainda conseguiu chegar duas vezes em 5º lugar com os carros do time italiano

O M194, novo projeto de Aldo Costa e Gustav Brunner, foi visto por alguns como uma cópia deslavada do natimorto projeto da Peugeot para a Fórmula 1, antes do construtor francês assinar um contrato com a McLaren para fornecimento de motores. Na verdade, era um carro concebido para andar com os Mugen-Honda V10 que estavam na Lotus, mas o acordo entre Giancarlo Minardi e Hirotoshi Honda, presidente da Mugen Power, miou e depois a subsidiária da montadora japonesa assinaria com a Ligier para 1995 por interferência de Flavio Briatore, o que deixou Minardi ainda mais desgostoso.

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A despedida: Alboreto fez sua última corrida em Adelaide

Apesar da acusação de cópia de projeto e de outros problemas extrapista, o M194 começou razoavelmente bem sua trajetória, na corrida do Canadá, com um nono posto de Martini e um 11º de Alboreto. Pierluigi ainda fez mais dois pontinhos com o quinto posto em Magny-Cours e foi só. Os dois carros se qualificavam da segunda metade para o fim do pelotão, mais pela falta de potência dos motores Ford Cosworth HB Série VIII do que pela qualidade do chassis, que era bom. Alboreto, em sua última temporada na Fórmula 1, passou perto dos pontos somente mais uma vez na Hungria, quando foi 7º colocado. Martini chegou em oitavo na Bélgica e foi isso. O ano acabou com a Minardi em décimo lugar no Mundial de Construtores, com cinco pontos somados – à frente da Larrousse e dos times que não pontuaram: a decadente Lotus e as estreantes Simtek e Pacific.

Amanhã, o blog volta a contar a trajetória da Minardi na Fórmula 1 com a 7ª parte do especial do time italiano, com os anos de 1995 e 1996.

Comentários

  • Sempre achei a Minardi de 1993 um belo carro, mas a pintura do modelo de 1994… não tenho palavras para descrever tamanha feiura…

  • Rodrigo

    Na verdade,a roda que se soltou do carro de Alboreto após sua parada naquel trágico GP de San Marino/94 atingiu mecanicos da Ferrari ferindo alguns, e também alguns mecanicos da Lotus,salvo engano.

  • e os pontos marcados por Alboreto em Mônaco e Martini em Magny-Cours na Temporada 94,Rodrigo foram os ultimos pontos que ambos marcaram em suas carreiras.

  • E o que aconteceu com o Barbazza? Tem um antiga revista Grid na casa dos meus pais que diz que por pouco ele não morreu em um acidente da antiga IMSA, acho que em 95 isso.

    • Isso mesmo. Deu uma porrada com um piloto chamado Jeremy Dale, que depois virou sócio da Brix-Comptech na Indy e hoje tem a JDX Racing na ALMS.

  • Os carros tricolores da Minardi eram os mais bonitos de toda F1 até hoje, mas esse branco e o que veio depois sao de doer os olhos.