Outsiders: Jean-Pierre “Jumper” Jarier

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RIO DE JANEIRO – A série dos outsiders do esporte a motor está de volta homenageando um dos aniversariantes do dia. Nascido em 10 de julho de 1946, Jean-Pierre “Jumper” Jarier completa 67 anos de vida. O piloto francês teve rompantes na Fórmula 1 que o deixaram com a pecha de um dos mais azarados e irregulares da história da categoria.

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A carreira de Jarier começou relativamente tarde, na Fórmula France, passando para a F-3 francesa, onde foi 3º colocado do campeonato de 1970. Com a parceria entre a Shell e a federação local, o piloto foi com tudo pago para disputar a Fórmula 2 europeia (acima) no ano seguinte, fazendo também sua estreia na Fórmula 1 com um March 701 no GP da Itália de 1971, em Monza. Jarier largou em último e chegou em 12º, oito voltas atrás de Peter Gethin, sem receber classificação.

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Em 72, por problemas financeiros, a equipe Shell Arnold teve que fechar as portas e Jarier ficou afastado do automobilismo nesse período. Voltou em 1973, em ponto de bala: como piloto oficial da March Engineering, venceu o Europeu de Fórmula 2 com um March 732 BMW, vencendo oito corridas. Ao mesmo tempo, fez uma série de corridas de F-1 com a equipe STP March, a bordo primeiro do velho 721G e depois do 731. Seu melhor grid foi um 7º lugar na França e o melhor resultado em prova, um 11º posto no GP dos EUA, em Watkins Glen.

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“Jumper” assinou um contrato com a Shadow, que estreara em 73, para correr ao lado de Peter Revson com o novo DN3. No início do ano, só havia um chassi “zero bala” e Jarier andou no DN1 em Buenos Aires e Interlagos. Na Argentina, demoliu um dos carros e o monocoque do carro destruído no acidente foi surrupiado pelo lendário Cardoso e trazido para o Rio de Janeiro, a fim de servir como base para a construção dos monopostos Polar da nova Fórmula Super Vê.

A partir do GP da Espanha, Jarier recebeu o novo DN3, com que conquistou seu primeiro pódio em Mônaco com um 3º lugar e depois uma quinta colocação na Suécia. Com uma segunda metade de campeonato bastante irregular, o francês terminou o campeonato em 14º lugar, com seis pontos.

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Em paralelo com seu primeiro ano de Shadow, ele disputou o Mundial de Carros Esporte pela equipe Matra-Simca com o lendário protótipo MS670C, com o qual venceu em Spa-Francorchamps, em dupla com Jacky Ickx e também nos circuitos de Nürburgring, Paul Ricard e Watkins Glen, tendo como parceiro Jean-Pierre Beltoise.

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No começo do campeonato de 1975, Jean-Pierre e a Shadow barbarizaram. O piloto espantou o paddock com a pole position para as duas corridas da perna sul-americana, em Buenos Aires e Interlagos. Se na Argentina, Jarier não teve sorte e o semi-eixo do carro quebrou antes do alinhamento para o grid, impedindo-o de correr, no Brasil ele deu show.

Para começar, Jarier tornou-se o primeiro piloto a fazer as saudosas curvas 1 e 2 sem tirar o pé do acelerador, totalmente flat. E na corrida, abriu uma vantagem imensa para o 2º colocado, que era José Carlos Pace, até o motor de seu carro quebrar na 32ª volta, a oito da quadriculada, na entrada da Curva do Sargento. Delírio total em Interlagos, pois com a quebra do Shadow, Moco venceu diante da torcida brasileira.

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Num ano de muitos problemas e poucos resultados, Jarier fez apenas 1,5 ponto com um 4º lugar no inacabado GP da Espanha, no circuito de rua do Parc Montjuich. A Shadow fez uma experiência com o motor Matra V-12 montado num carro do time e o francês serviu como “cobaia”, largando no pelotão intermediário para abandonar nos GPs da Áustria e Itália.

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Apesar das dificuldades, o piloto retornou em 1976 com o time e de novo barbarizou no GP do Brasil, que daquela vez abriu a temporada. Ele largou em terceiro e vinha seguindo Niki Lauda e James Hunt, que vinham respectivamente em primeiro e segundo. Quando o motor da McLaren de Hunt começou a perder rendimento e Jarier o ultrapassou, a diferença para Niki Lauda era de cerca de vinte segundos.

Em sete voltas, o francês conseguiu reduzir a distância e, quando já vislumbrava a chance de alcançar o austríaco, rodou no óleo deixado pelo motor quebrado do carro de Hunt. Foi o único momento de brilho do francês naquela temporada, pois depois – embora tenha completado 12 das dezesseis provas do ano – jamais teria a chance de marcar um único pontinho.

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Sem renovar o contrato com a Shadow, Jarier fechou um acordo com a nova equipe ATS, que estreou em 1977 com os chassis Penske PC4. Logo de cara, terminou em 6º na estreia do time em Long Beach. Mas nas demais dez corridas, nada mais aconteceria. O piloto ainda foi requisitado pela Shadow para substituir Riccardo Patrese, ausente no GP dos EUA por uma coincidência de datas com uma prova de Fórmula 2 e fez o GP do Japão num segundo carro da Ligier, abandonando por falha mecânica.

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Gunther Schmidt o contratou para mais uma temporada e em 1978 lá estava Jarier ao lado de outro veterano, Jochen Mass, na ATS. O ano começou de forma bastante razoável, com um 12º lugar na Argentina e um oitavo na África do Sul, antes do caldo entornar e patrão e piloto brigarem após a desclassificação no GP de Mônaco, culminando com a demissão de Jarier. Incrivelmente, o piloto voltaria para o GP da Alemanha… e seria novamente despedido – de vez, é claro.

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A trágica morte de Ronnie Peterson abriu-lhe uma inesperada chance na Lotus e ele substituiu o sueco nas duas corridas finais de 1978. Esteve perto de um pódio em Watkins Glen, mas um problema de combustível o fez perder a 3ª posição quase certa. No Canadá, em Montreal, voltou à velha forma: fez a pole position e seu proverbial azar apareceu após liderar quarenta e nove voltas, abandonando em razão de um vazamento de óleo.

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Já às vésperas de completar 33 anos, Jarier mostrou que ainda podia ser útil na Fórmula 1, desde que seu irascível temperamento não colidisse com o dos chefes de equipe que se interessassem por seus préstimos. Ken Tyrrell o chamou e assinou com ele um contrato de duas temporadas. O francês conquistou dois pódios em 1979 nos GPs da África do Sul e Inglaterra, numa época em que a Tyrrell já não era mais a mesma. E acabou o campeonato em 11º lugar, a melhor posição de toda a carreira na F-1. Em 1980, somou seis pontos com três quintos lugares na Bélgica, Inglaterra e Holanda, acabando o Mundial de Pilotos na 13ª posição.

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Porém, em 1981, ele não tinha uma vaga fixa de piloto titular. No começo do ano, aceitou substituir o ainda convalescente Jean-Pierre Jabouille, contratado pela Talbot-Ligier e que se acidentara gravemente em Montreal, no ano anterior. Fez duas corridas, em Long Beach e Jacarepaguá, a bordo do JS17 do time francês. No Rio, com pouco treino, largou em penúltimo e chegou em sétimo.

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A Ligier voltou a contar com Jabouille e Jarier ficou a pé. Por pouco tempo, porém. Enzo Osella lembrou-se dele e o convidou para guiar um de seus carros na segunda metade do campeonato. Em apenas sete corridas, terminou quatro, com dois oitavos, um nono e um décimo lugares – resultados muito bons para um time de pouquíssimo orçamento. E o francês permaneceu para o ano de 1982, onde só conseguiu marcar pontos no GP de San Marino, boicotado pelos times da FOCA, com um 4º lugar.

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Em 1983, o francês foi de novo requisitado pela Ligier, desta vez para ser o piloto titular, ao lado do brasileiro Raul Boesel. Com um carro ruim, o JS21, nenhum dos dois fez grande coisa ao longo do ano. A situação de Jarier era até um pouco melhor, porque ele tinha privilégios dentro do time, principalmente com relação a motores e pneus novos. Mas tirante uma boa performance em Long Beach, ele nada mais pôde fazer ao longo do ano. Despediu-se da Fórmula 1 com um 10º lugar no GP da África do Sul, tendo disputado 134 GPs em 148 possíveis, com três pole positions, três recordes de volta em prova, três pódios, 31,5 pontos somados e 79 voltas lideradas, num total de 453 km.

A irregularidade de Jarier, que abandonou nada menos que setenta vezes nas corridas que disputou, chamava a atenção da dupla de narrador/comentarista da BBC, formada pelo lendário Murray Walker e pelo ex-campeão mundial James Hunt, que certa feita disparou a metralhadora e elegeu o “Jumper” como alvo.

“Ele tem uma idade mental de um menino de 10 anos de idade”, disse James, criticando o piloto por uma manobra temerária no GP dos EUA de 1983. “Em todos os meus anos como comentarista, nunca vi um piloto tão grosseiro na pista quanto Jarier”, avaliou Hunt.

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Após o fim de sua carreira na F-1, Jarier concentrou-se nas provas de Grã-Turismo e Endurance. Disputou mais algumas vezes as 24 Horas de Le Mans (acima), além de provas da Porsche Supercup. Em 1993, venceu as 24 Horas de Spa-Francorchamps, interrompidas pela morte do Rei Balduíno, em parceria com Christian Fittipaldi e Üwe Alzen. De 1997 a 2002, competiu no FIA GT e em 98 e 99, levou o título do FFSA GT, equivalente ao Campeonato Francês de Grã-Turismo. Com sua vasta experiência de piloto, ajudou John Frankenheimer nas cenas de Ronin, dirigindo alguns dos carros do filme nas cenas de alta velocidade. Hoje ele tem uma agência, chamada Monaco Media International, responsável por cursos de direção, passeios off-road e de helicóptero. Na parede de seu escritório, aliás e a propósito, descansa o monocoque de um dos carros que o “Jumper” conduziu na categoria máxima.

Comentários

  • Excepcional Rodrigo, obrigado mais uma vez.
    Nao lembro de ter visto aquela ATS ali na lista dos carros “mais feios” da historia da F1!!! Ou devo dizer, bons tempos onde aerodinamica era apenas um dos componentes de um carro…

    • Complementando o Fernando, aquela ATS de 78 era mais feia que . . .
      E suprema ironia, o ano começa naquela cadeira-elétrica e termina naquele tapete-mágico mais conhecido como Lotus 79!
      Antes tarde do que nunca, obrigado Rodrigo pela continuação da série!
      Sem querer polemizar, tinha na minha lembrança de que o primeiro a fazer a 1 e 2 flat havia sido Peterson, primeiro de March 712M em 71 e depois de Lotus 72D em 73.
      Abraço do Zé Maria