Outsiders: Bruno Giacomelli, o ‘gordinho’ veloz

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RIO DE JANEIRO – Nesta terça-feira, um dos nomes que povoou a minha infância quando comecei a acompanhar a Fórmula 1, completa 61 anos de idade. Refiro-me ao piloto italiano Bruno Giacomelli, que esteve na categoria máxima de 1977 a 1983 e depois, em 1990.

Nascido em 10 de setembro de 1952 na cidade de Brescia, Bruno começou a aparecer no automobilismo em 1976. Naquele ano, ele foi um dos grandes nomes da Fórmula 3. Com um March 763 de motor Toyota Novamotor, venceu o GP de Mônaco, preliminar da Fórmula 1, despertando de cara o interesse de alguns chefes de equipe da categoria máxima – o que naquela época era absolutamente normal, uma vez que a transição da categoria de base, com motores de 170 HP na época, para a F-1 com os Cosworth de 480 HP, não era considerada algo de outro mundo.

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Na Inglaterra, Bruno também destacou-se. Venceu o Shellsport, um dos dois torneios de Fórmula 3 realizados no templo do automobilismo europeu. Na outra série, a BP Visco, deu Rupert Keegan, que guiava um March 763 Toyota idêntico ao de Giacomelli. Os dois foram os grandes protagonistas do ano, ao nível do que fora a disputa quase suicida entre Gunnar Nilsson e Alex Dias Ribeiro, no ano anterior.

O passo seguinte foi o Campeonato Europeu de Fórmula 2. A estreia do piloto nesta categoria foi na veloz pista inglesa de Thruxton, na 2ª etapa, com um March 772 de motor Hart. Bruno não terminou aquela corrida, assim como a seguinte, em Hockenheim, na Alemanha. E em Nürburgring, marcou seu primeiro ponto no campeonato.

Já na etapa seguinte, disputada em Vallelunga, pista próxima à capital Roma, Bruno Giacomelli atuava como piloto oficial da March-BMW pela primeira vez, substituindo o brasileiro Alex Dias Ribeiro, que fora afastado do programa de F-2 do construtor de Bicester pela mente maquiavélica de Max Mosley. Giacomelli não decepcionou: venceu o GP de Vallelunga e mais outras duas provas, em Mugello e Donington Park, fechando o ano num promissor 5º lugar, com 32 pontos.

A confiança da March e da BMW em Giacomelli era tão grande que já na última prova de 1977, estreou-se o modelo 782 para o ano seguinte. E o italiano, claro, venceu.

Àquela altura, Bruno já começara sua carreira na Fórmula 1. A McLaren lhe deu uma chance no GP da Itália, em Monza, ocupando o terceiro carro com o numeral #14. Giacomelli largou na 15ª posição em um grid de 24 carros, mas o motor Cosworth quebrou e ele foi obrigado a desistir.

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No ano seguinte, ele era o grande favorito à conquista do título do Europeu de Fórmula 2, o que certamente alavancaria sua entrada definitiva na categoria máxima. Ao mesmo tempo, Bruno voltou a disputar algumas provas de F-1 com o terceiro carro da McLaren, com o qual conseguiu um 7º posto em Brands Hatch no GP da Inglaterra e o oitavo posto no GP da Bélgica, em Zolder. Como curiosidade, seu nome era grafado na parte externa do carro como Bruno Jack O’Malley, para facilitar a pronúncia do sobrenome do piloto pelos integrantes do time.

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O italiano não frustrou as expectativas e venceu com sobras na categoria de acesso. “Montado” no melhor conjunto do ano: chassi March 782, motores BMW com assistência de fábrica e pneus Goodyear de grande qualidade, Giacomelli venceu oito das 12 etapas do campeonato, quatro delas consecutivamente. Fez 10 pódios, somou 82 pontos e só abandonou duas vezes, em Nürburgring, na lendária corrida vencida por Alex Dias Ribeiro e em Donington Park.

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A partir de 1979, Giacomelli assumiria outro desafio: contratado pela Autodelta de Milão, seria o responsável pelos testes de desenvolvimento do primeiro chassis de Fórmula 1 da Alfa Romeo, que voltava à categoria máxima após quase 30 anos. Com o modelo 177, quase um trambolhão, ele promoveu o regresso do time durante o GP da Bélgica, em Zolder, acidentando-se após largar em décimo-quarto.

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Nesse primeiro carro, ainda estava montado o motor Boxer de 12 cilindros opostos, potente e pesado, o mesmo usado pela Brabham entre 1976 e 1978. Mas nas duas corridas finais do ano, no Canadá e nos EUA, previa-se a estreia do modelo 179, mais moderno e avançado, visando a temporada de 1980, com o uso de um motor V-12. Com esse carro, Giacomelli andou no GP dos EUA, onde largou em 18º e abandonou, novamente em razão de uma batida.

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A Alfa Romeo não queria entrar na Fórmula 1 para ser coadjuvante. Além de assinar um bom patrocínio com a Phillip Morris (leia-se Marlboro), o construtor de Milão contratou Patrick Depailler, então com 35 anos, para ser o principal piloto do time – com quem certamente Giacomelli aprenderia muito. Mas o francês ainda convalescia de um grave acidente de asa-delta sofrido no ano anterior, a fisioterapia não tinha ainda deixado suas pernas com a firmeza suficiente para conduzir um carro de corrida e a condição física de Patrick não era, certamente, das melhores, no começo do ano de 1980.

Isto posto, Giacomelli começou o ano com a incumbência de dar à equipe os primeiros pontos. E logo conseguiria o feito no GP da Argentina, numa corrida difícil e acidentada. Largando em 20º, o italiano sobreviveu aos muitos problemas enfrentados pelos rivais e chegou em quinto, somando dois preciosos pontinhos. No Brasil, chegou em 13º lugar.

A temporada do time milanês começou a engrenar no GP dos EUA-Oeste, em Long Beach. Lá, Depailler, já em forma, classificou-se brilhantemente em terceiro, enquanto Giacomelli foi o sexto no grid. Pena que os dois não chegaram ao fim. Noutro circuito citadino, Mônaco, Patrick também andou muito forte, alijado da disputa na 51ª volta. Giacomelli foi atropelado pela Tyrrell de Derek Daly na curva Saint Dévote e nem passou da primeira volta.

O desempenho do 179 prometia muito para a segunda metade do ano. Aí, em 1º de agosto, num teste de pneus em Hockenheim, Patrick Depailler sofreu um sério acidente. A mais de 200 km/h, bateu com violência num guard-rail. O piloto teve as pernas seccionadas, várias lesões e traumatismos. Aos 35 anos, ele morria na mesma pista onde seu ídolo Jim Clark perdera a vida numa obscura corrida de Fórmula 2, em abril de 1968.

O moral da equipe ficou tremendamente abalado, mas o show tinha que continuar e Giacomelli seguiu como o único piloto da equipe por alguns eventos. De volta à Hockenheim, agora para o GP da Alemanha, o piloto chegou em quinto, novamente vindo do fim do pelotão.

A Alfa não baixou os braços – e nem Giacomelli. No GP da Holanda, o italiano teve atuação destacada, a melhor dele em 1980. Ele largou em oitavo e na 16ª volta, alcançou a terceira posição, atrás de Nelson Piquet e Jacques Laffite. Contudo, Bruno deu uma rodada quando estava prestes a assumir a segunda posição. O erro infantil do italiano o fez baixar para sétimo e ele ainda tinha esperanças de somar pelo menos um pontinho, quando constatou-se que a minissaia do carro fora danificada na rodada e ele não teve mais chance de seguir em frente.

Formula One World Championship

Na última prova do ano, o GP dos EUA-Leste, em Watkins Glen, Giacomelli surpreendeu: fez a primeira pole position dele e da Alfa Romeo desde 1951. E liderou com autoridade por mais da metade da disputa. Absoluto, Bruno rumava para uma primeira e merecida vitória na Fórmula 1. Mas uma pane elétrica, ocorrida na 32ª volta, tirou o #23 da pista.

Em 1981, o italiano teria um novo companheiro de equipe: Mario Andretti, então com 40 anos, juntou-se a Giacomelli para trabalharem juntos no desenvolvimento do 179C, o carro da Alfa Romeo para aquele ano, sem a minissaia proibida pelo regulamento técnico da época.

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Não foi uma temporada fácil, embora a Alfa tenha ficado feliz com o 4º lugar de Andretti no GP dos EUA-Oeste, em Long Beach. Giacomelli e Andretti foram vítimas da falta de confiabilidade do conjunto e Bruno colecionou muitos abandonos. Também não havia velocidade de ponta e frequentemente os dois largavam no meio do pelotão.

No fim do ano, a Alfa Romeo teve um pequeno surto de competitividade, que propiciou a Giacomelli chegar em 4º no temporal do Canadá e em terceiro no GP de Las Vegas, no inócuo circuito montado no estacionamento do Caesars Palace, onde Nelson Piquet foi campeão mundial de Fórmula 1. Com sete pontos, Giacomelli terminou o campeonato de pilotos em 15º lugar e à frente de Mario Andretti, cujos serviços foram dispensados.

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Em 1982, chegava à equipe Autodelta o insano Andrea De Cesaris, jovem promessa italiana de 22 anos, e que destruíra 22 chassis da McLaren no ano anterior, para dividir o time com Giacomelli. Foi outro ano de resultados abaixo da expectativa, com nove abandonos de Bruno – sete deles consecutivos. Sem ter muito o que fazer com o modelo 182, que era rápido em algumas pistas, mas muito pouco confiável, o piloto chegou em 5º no GP da Alemanha e foi tudo o que pôde obter na temporada. Desta forma, ficou difícil renovar o contrato e a Alfa Romeo dispensou Giacomelli, pondo em seu lugar o medíocre Mauro Baldi.

Já com 30 anos, Bruno Giacomelli não podia ser considerado velho para a Fórmula 1, uma vez que Jacques Laffite, com uma década a mais de idade, ainda era veloz e relativamente competitivo. O piloto fechou um contrato de um ano com a Toleman e lá foi ele para a que seria sua terceira escuderia na categoria máxima.

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O ano de 1983 não foi bom para o italiano, que além de ficar de fora do GP de Mônaco pela primeira vez na carreira, só se classificou uma vez no grid entre os dez primeiros, marcando um solitário pontinho no GP da Europa, em Brands Hatch. Tal como na Alfa, a Toleman não exerceu a opção de renovação de contrato e Giacomelli, após um total de 69 corridas disputadas, deixava a Fórmula 1.

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Ainda com alguma vida útil nas pistas, Bruno foi para os EUA, tentar a sorte na Fórmula Indy, que por aqui chamava muito a atenção por conta da presença de Emerson Fittipaldi, com quem dividiu equipe na Patrick Racing. Ele fechou um acordo para disputar corridas em circuitos mistos e em ovais curtos. Na temporada de 1985, Giacomelli chegou em 5º na pista de rua de Meadowlands, foi sexto em Mid-Ohio e Laguna Seca e décimo em Cleveland. Com 32 pontos somados, fechou o campeonato em 19º. Ao todo, disputou 11 corridas no certame estadunidense.

Já naquele mesmo ano de 1985, Bruno disputou uma prova do Mundial de Grupo C, os 1000 km de Monza, com George Fouché e Sarel Van der Merwe, a bordo de um Porsche da equipe de Erwin Kremer, chegando em 8º lugar. Sem espaço nos monopostos, Giacomelli passou a fazer parte do círculo de pilotos que saíram da Fórmula 1 e migraram para os Esporte-Protótipos. Suas aparições esporádicas em 1986 lhe renderam, contudo, o 4º lugar nos 1000 km de Fuji, novamente com um Porsche da Kremer, em dupla com Volker Weidler.

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Em 1988, o piloto italiano venceu os 1000 km de Fuji, pelo Campeonato Japonês de Grupo C, tão forte quanto o Mundial da época, em dupla com Kris Nissen. Na época, um de seus patrocinadores era a Leyton House, de Akira Akagi, que desde o ano anterior passara a investir na Fórmula 1. O piloto também disputaria as 24 Horas de Le Mans, compondo trinca com Kunimitsu Takahashi e Hideki Okada, chegando em nono lugar.

Nos dois anos seguintes, em provas de Endurance, o melhor resultado do italiano seria um 3º lugar em Silverstone, com um protótipo Spice SE90C, em dupla com Fermin Velez. Naquele mesmo ano de 1990, Giacomelli, prestes a completar 38 anos, surpreendeu todo mundo quando aceitou um convite de Ernesto Vita e retornou à Fórmula 1 para tentar classificar o chassis Life, que tinha montado nele um motor de 12 cilindros… em W!

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O projeto de Franco Rocchi nunca foi competitivo. Mesmo assim, o piloto embolsava um fixo de US$ 30 mil por corrida, o que não era de se desprezar, nem mesmo quando o carro não completava uma única volta – algo frequente nas pré-qualificações. Nem a troca do motor Rocchi W12 por uma unidade Judd V8 melhorou as coisas e tanto Giacomelli quanto a Life saíram de cena do automobilismo no fim do ano.

Em 1995, quando já tinha 42 anos, Bruno ainda ensaiou um regresso às competições. Fez algumas provas de Endurance novamente e terminou as 4h de Nürburgring, em dupla com Wolfgang Kauffmann, em oitavo lugar, com um Porsche 911 Biturbo da equipe Freisinger. Foi com o time alemão que ele se despediu definitivamente do automobilismo em 1998, no dia 22 de março, nas 4 Horas de Jarama, na Espanha.

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A carreira de Giacomelli na Fórmula 1 teve 82 aparições do piloto italiano com 69 largadas, uma pole position, um pódio, 14 pontos somados, 31 voltas na liderança e 2.694 voltas percorridas, num total de 12.631 km.

Comentários

  • A Bruno lo recuerdo desde sus años de F2 con March; lo vi correr en 1981 en Buenos Aires con el Alfa 179. Me encantó ese F. Indy azul y rojo de STP, ¿es un March? Muy bello.
    Abrazos!

    • Si, Juanh. Es un March 85C, como lo que conducía Emerson Fittipaldi en equipo Patrick Racing y también Bill Whittington en los óvalos más largos.