Jack Bruce (1943-2014)

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RIO DE JANEIRO – A música e principalmente o rock and roll estão um pouco mais tristes e menos criativos neste sábado. Morreu aos 71 anos, de causas não reveladas, o lendário baixista Jack Bruce, fundador de um dos grupos mais influentes da história do blues e do hard rock, o Cream.

Escocês de nascimento e batizado John Symon Asher Bruce, ele nasceu em 14 de maio de 1943. Estudou em nada menos que 14 escolas diferentes ao longo de sua vida acadêmica, antes de decidir seguir carreira musical. Especializou-se em contrabaixo acústico e violoncelo, tornando-se assim, antes de tudo, um músico de jazz.

Em 1962, antes de completar 20 anos, já estava na Blues Incorporated de Alexis Korner, pela qual também passaria um certo Eric Clapton, ainda menor de idade. Depois disto, com Graham Bond, Ginger Baker e John McLaughlin, que passaria pelos Yardbirds – assim como Clapton – formou a Graham Bond Organisation, grupo que tocava uma eclética mistura de bebop, blues e R&B. Casou-se jovem, aos 21 anos, com a companheira Janet Godfrey, com quem teve dois filhos. E depois de passar como um relâmpago pelos Bluesbreakers de John Mayall e pelo grupo pop de Manfred Mann, formou em 1966 com Clapton e Baker o Cream.

O Cream, logo contratado pela lendária Atlantic Records por indicação de Ahmet Ertegun, influente diretor no mercado musical, fez barulho em pouquíssimo tempo de vida. Gravaram quatro álbuns de estúdio, dois ao vivo e deixaram, com suas canções, um legado eterno para o rock e para o blues. Nos tempos do Cream, Bruce teve no letrista e poeta Pete Brown o seu melhor parceiro. Juntos, fizeram músicas que se tornaram definitivas, como “Sunshine of Your Love”, a espetacular “White Room” e “We’re Going Wrong”, esta resultante de uma briga entre Bruce e Janet.

A guerra de egos dentro do supergrupo matou o Cream de ‘morte morrida’ em fins de 1968. Jack enveredou por carreira-solo e em 1972 formou outro power trio: West, Bruce & Laing, aproveitando as sobras do Mountain, outro lendário grupo pré e pós-Woodstock, com o guitarrista Leslie West e o baterista Corky Laing. Juntos, gravaram dois discos de estúdio e outro ao vivo.

No fim dos anos 70, o consumo exagerado de drogas e álcool quase levou Jack Bruce à bancarrota. Enquanto isso, Eric Clapton voava alto em carreira solo após livrar-se do vício da heroína e seu antigo parceiro Ginger Baker fincava raízes na percussão afro, tocando com lendas do naipe de Fela Kuti. Jack tocou com outras lendas da guitarra, feito Robin Trower e Rory Gallagher. Mas o seu desejo mesmo era fazer o Cream voltar, como nos velhos tempos.

O baixista propôs a volta do grupo por volta de 1992 a Eric Clapton e Ginger Baker. Imerso em seus trabalhos solo, Clapton disse não, antes de dizer textualmente que, se o Cream voltasse, o band leader seria ele – proposta negada por Jack. O jeito foi chamar Gary Moore e emular o Cream no disco Around The Next Dream, com o mais novo power trio da praça, o BBM.

Os três fizeram vários shows ao vivo, com muito boa receptividade. Mas a relação entre Bruce e Moore deteriorou-se a ponto de Gary dar um pontapé nos fundilhos do BBM e voltar aos seus solos de guitarra nos discos que gravava sozinho. Jack voltou aos álbuns solo, às colaborações com trilhas sonoras e participou da gig de Ringo Starr, tocando na All-Starr Band do antigo baterista dos Beatles junto à lenda Peter Frampton, com sua guitarra.

A saúde de Jack Bruce deteriorou-se na década passada. No verão de 2003, foi detectado um tumor no fígado do baixista e em setembro do mesmo ano, recebeu um novo órgão em transplante. O organismo de Bruce chegou a rejeitar o novo fígado, mas a saúde do músico se recompôs a ponto dele finalmente realizar o sonho de, quase 40 anos depois da separação, reunir novamente o Cream.

Clapton desta vez não se opôs ao projeto e o velho power trio emocionou o mundo da música em quatro noites no lendário Royal Albert Hall, em Londres, no mesmo local dos concertos de despedida em 26 de novembro de 1968. O grupo também fez algumas apresentações no Madison Square Garden, em Nova York – e nunca mais o Cream se reuniria.

Bruce seguiu com participações nos álbuns de dezenas de amigos e músicos, além de seus trabalhos solo. Ao todo, ele fez 14 álbuns em estúdio, o último, Silver Rails, neste ano – e cinco ao vivo. Com o Cream, foram quatro trabalhos em estúdio, dois discos ao vivo e o CD/DVD de reunião em 2005, afora compilações editadas anos a fio nas décadas seguintes ao fim do grupo.

Jack deixa um legado importante para o blues e para o rock and roll. Foi um dos mais brilhantes baixistas de todos os tempos. Classudo, dedilhava suas harmonias ousadas com suas Gibson EB0 que se tornaram uma lenda. Assim como ele.

Vai em paz, Jack Bruce. Os fãs do Cream, do blues e do rock lamentam profundamente sua perda colossal.

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