Equipes históricas – Tyrrell, parte XVIII

RIO DE JANEIRO – Em 1986, a Fórmula 1 começava a primeira – e única – temporada de sua história com o grid 100% formado por carros cujos motores eram turbocomprimidos. Preocupada com a escalada de custos, que poderia inviabilizar a categoria para os anos seguintes, a FIA notificou as equipes que num prazo de três anos os motores voltariam ao sistema de aspiração normal e que unidades com turbo seriam varridas do mapa. A partir de 1987, seriam aceitos carros com motores atmosféricos, o que representaria a salvação de muitos times sem dinheiro. Era, aliás, o caso da Tyrrell, que se socorria da parceria tecnológica com a Courtaulds – que fornecia a fibra e materiais compósitos para a construção dos carros e do acordo costurado por Bobby Tyrrell, filho do velho Ken, com a Data General, válido por três temporadas, o que dava uma pequena salvaguarda financeira em tempos cada vez mais bicudos.

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Martin Brundle era o líder natural da Tyrrell em 1986; a equipe vivia percalços financeiros e ainda pagava pelos motores Renault Turbo

O dinheiro para 1986 serviu pelo menos para pagar pelos motores Renault V6 Turbo que a Tyrrell recebia como cliente e que seriam montados nos carros de Martin Brundle e Philippe Streiff. A dupla franco-britânica começaria o ano com o mesmo carro do ano anterior, enquanto Brian Lisles não concluía os trabalhos de projeto do 015, que estrearia no correr da temporada.

E o começo de campeonato até que foi bem razoável: na abertura da temporada, os dois pilotos largaram da 9ª fila de um grid de 25 carros em Jacarepaguá, palco do GP do Brasil. Após perder todos os pontos de 1984 e não ter marcado nenhum no ano seguinte, Brundle foi à forra, somando enfim os primeiros dois pontos da carreira para efeito estatístico, com o 5º lugar ao fim da disputa ganha por Nelson Piquet em dobradinha com Ayrton Senna. Streiff foi o sétimo.

A nova pista de Jerez de la Frontera, na região da Andaluzia, sediou a 2ª etapa – o GP da Espanha. Brundle foi bem melhor nos treinos do que Streiff, alinhando na sexta fila contra a décima do companheiro de equipe. Mas o fim de ambos foi o mesmo: abandono, em razão de um vazamento de óleo do motor Renault dos dois carros. Em Imola, no GP de San Marino, Brundle terminou em 8º na última corrida do modelo 014, enquanto a corrida de Streiff acabou antes do fim por uma falha na transmissão.

A estreia do novo 015 aconteceu numa pista das mais inadequadas para o lançamento de um carro: as ruas de Monte-Carlo, no GP de Mônaco. Largando em décimo com a máquina nova, Brundle fez uma boa corrida e andou por muito tempo na 7ª posição, bem perto da zona de pontuação. Mas o britânico não deu espaço na disputa por posição com o francês Patrick Tambay. O resultado foi que a Tyrrell virou rampa de lançamento na freada da Mirabeau e o piloto do Lola-Haas sofreu um acidente espetacular.

Streiff pelo menos salvou a honra da equipe, terminando a corrida num distante 11º lugar, quatro voltas atrás do vencedor, Alain Prost.

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Streiff em ação no circuito belga de Spa: os dois carros normalmente chegavam ao fim, mas faltava performance

No GP da Bélgica, em Spa-Francorchamps, os dois pilotos – mesmo largando do meio do pelotão para trás – começaram bem. Brundle chegou a ocupar a quinta posição, mas desistiu com problema de câmbio. Streiff alcançou o nono posto no início e teve problemas mecânicos que o atrasaram três voltas. O francês terminou a disputa em 12º lugar. O GP do Canadá foi o primeiro em que Streiff bateu Brundle em qualificação e os dois chegaram inteiros ao final: o britânico chegou em nono e o francês em décimo-primeiro.

A difícil pista de Detroit também não foi das melhores para a dupla da Tyrrell: Brundle desistiu logo no início com problemas elétricos e Streiff chegou em 8º. Incrivelmente, ao contrário do que acontecia nas equipes Lotus e Ligier, os motores Renault V6 Turbo não quebravam nos carros do time de “Tio” Ken. Mas aí justamente na terra da Régie, no circuito de Paul Ricard, calhou do carro de Philippe Streiff pegar fogo… Já Brundle sobreviveu, chegando em 10º – mesmo que três voltas atrasado.

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O primeiro ponto de Streiff veio com a 6ª colocação no GP da Inglaterra

Desde o GP do Brasil, nenhum dos dois pilotos pontuava e Streiff, inclusive, estava zerado no campeonato. A oportunidade surgiu no caótico GP da Inglaterra, o último disputado em Brands Hatch – aquele do acidente que acabou com a carreira de Jacques Laffite. A performance de Brundle em casa já vinha sendo elogiada desde os treinos e o piloto foi recompensado com a 5ª colocação ao fim da disputa. Streiff não ficou no zero: chegou em sexto e levou seu primeiro ponto do ano.

Já o GP da Alemanha foi pura desilusão: em termos de desempenho, o 015 era o pior dos carros com motor Renault numa pista de altíssima velocidade. E não houve atenuante para ninguém: os dois pilotos abandonaram com problemas mecânicos. O jeito foi tentar pontuar na nova pista da Hungria, construída perto de Budapeste e que recebeu um impressionante público na ocasião – superior a 200 mil espectadores.

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Brundle fazia o que dava com o 015: na Hungria, somou um pontinho com o 6º lugar

Apesar das dificuldades e das exigências da pista travada, Brundle fez uma boa corrida: largou de 16º e salvou mais um ponto no campeonato. Streiff fez sua parte e chegou em oitavo. Na Áustria, pista velocíssima ao oposto do traçado magiar, quebra dupla para os dois pilotos e o fim da corrida em menos de 15 voltas.

No GP da Itália, também não houve a menor possibilidade dos Tyrrell 015 chegarem à zona de pontos. O máximo que se alcançou foi o 9º lugar de Streiff, com Brundle logo após. Em Portugal, mais uma corrida em que nenhum dos pilotos terminou: os motores Renault se entregaram com menos da metade da disputa.

A penúltima etapa foi o GP do México, na volta do país à Fórmula 1 após 16 anos. Nos últimos momentos da parceria Tyrrell-Renault, o desempenho nos treinos foi o de sempre: Brundle em 16º e Streiff em 19º. O francês não conseguiu passar das dez primeiras voltas, com o turbo do motor de seu carro quebrando logo no comecinho. Brundle foi um pouco menos infeliz – chegou em 11º.

O fim do binômio foi em Adelaide, no histórico GP da Austrália do surpreendente título de Alain Prost ante as Williams de Nelson Piquet e Nigel Mansell. Foi a melhor corrida da equipe em todo o ano, ironicamente: Streiff assumiu o 3º lugar após o estouro do pneu da Williams de Mansell e caminhava todo pimpão para o pódio. Só que o motor Renault bebeu mais do que o previsto e o piloto ficou sem gasolina. Que castigo…

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O melhor resultado veio no GP da Austrália, último da parceria entre Tyrrell e Renault: Brundle chegou em 4º lugar e Streiff em quinto

Brundle, que não tinha nada a ver com isso, herdou mais uma posição e chegou ao fim da disputa em 4º lugar. Mesmo sem gasolina, Streiff ainda salvou dois pontinhos e o time, no frigir dos ovos, não tinha tantos motivos assim para ficar triste: mesmo sem muito dinheiro, a Tyrrell fez um ano bastante honesto, completando o campeonato em 7º lugar entre os Construtores.

A volta da equipe à seara dos propulsores aspirados foi em 1987, ano do 19º post da série.

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