Direto do túnel do tempo (381)

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RIO DE JANEIRO (Saudade não tem idade…) – Das minhas memórias de infância, daquele moleque cheio de cabelo (quem diria…) que se apaixonou por automobilismo a ponto de fazer qualquer miniatura Matchbox de carro de corrida, indiscriminadamente, uma das mais tristes remete ao dia 11 de setembro de 1978.

Na verdade, quero lembrar do dia anterior àquela data, quando aconteceu o GP da Itália marcado pelo acidente do sueco Ronnie Peterson. “Fogo na pista!”, dizia Luciano Do Valle, narrador daquela corrida transmitida pela Rede Globo e comentada pelo então novato em televisão, Reginaldo Leme. Uma largada confusa, em que o diretor de prova não esperou pelo alinhamento completo dos 24 carros e em que a pista de Monza afunilava em direção à chicane.

Ninguém cedeu: Ronnie Peterson, Riccardo Patrese e James Hunt partiram decididos a não ser ultrapassados e deu no que deu. Outros pilotos se envolveram na carambola, mas o pior aconteceu com a Lotus #6. O carro de Ronnie bateu num guard-rail, os tanques de combustível quase explodiram como se fosse uma bomba a mais de 250 km/h e o pavor se instalou na pista italiana.

Lembro de quase tudo… da interrupção longa, de Scheckter derrubando um guard-rail da curva de Lesmo ao sair para o realinhamento do grid, que a corrida teve só 40 voltas e que de nada adiantou Mario Andretti e Gilles Villeneuve dispararem na frente e ganharem, com a Lotus #5 em primeiro: os dois foram punidos em um minuto por queima de largada e a vitória ficou mesmo com Niki Lauda.

Talvez fosse para ser assim mesmo, uma corrida melancólica, antevendo o que viria no dia seguinte.

Após uma operação longa, em que foram encontradas múltiplas fraturas que poderiam inclusive acarretar na amputação de membros inferiores, Ronnie Peterson – que parecia lúcido após a batida – morreu no Hospital Niguarda, em Milão. As circunstâncias são até hoje estranhas. Muitos dizem que um fragmento ósseo que não fora retirado se alojou na corrente sanguínea do sueco, provocando uma embolia. Outros atribuem a morte ao estado frágil de saúde do piloto. Certo é que foi um acidente chocante, que marcou fundo uma geração de fãs que tinham em Peterson um ídolo.

Estranha coincidência: tanto Ronnie quanto Gilles Villeneuve, que desapareceria em 1982, sequer foram campeões mundiais. Mas eram e ainda são amados por quem gosta de corrida de verdade. De raça, garra e destemor – características que ambos carregavam de sobra na condução de seus carros – fosse a merda que guiassem – e olha que os dois tiveram verdadeiras cadeiras elétricas nas mãos, os dois não davam 100%. Davam 110%.

Essa era a graça de ver o Sueco Voador e o Bombeiro Alucinado em ação.

A foto acima, como vocês podem notar, não é do carro de Ronnie e sim de Mario Andretti durante o fim de semana do GP dos EUA-Leste, em Watkins Glen, o primeiro disputado sem Peterson na Fórmula 1.

Na faixa, uma ordem da torcida ianque: “Mario, vença esta por Ronnie!” Nos treinos, o campeão antecipado daquele ano fez a pole enfiando um segundo em Carlos Reutemann, o segundo no grid. Mas o motor do Lotus 79 de Andretti quebrou na 27ª volta. O substituto do sueco, Jean-Pierre Jarier, vinha na 3ª posição quando teve um problema de alimentação de gasolina e foi obrigado a desistir, faltando apenas quatro voltas para o final.

Há 39 anos, direto do túnel do tempo.

Comentários

    • Todo mundo repete sempre a mesma ladainha. . .
      Escutaram o galo cantar, mas não sabem onde!
      Vamos aos fatos, daquilo que eu me lembro agora, sem qualquer consulta, ok!
      A F 1 em geral foi muito perigosa ainda durante as décadas de 70/80.
      Em 70, Courage morreu na Holanda em um De Tomaso construído em magnésio (surreal) e Rindt na Itália, muito mais por causa da falta do 5º ponto do cinto de segurança do que pelo acidente, sem contar que as lâminas do guard-rail estavam incorretamente posicionadas.
      Em 71, Siffert morreu na Inglaterra de BRM.
      Em 73 perdemos Williamson novamente na Holanda, pilotando um March e Cevert nos Estados Unidos, num Tyrrell.
      Em 74, Revson morreu na África do Sul num Shadow e Koinigg novamente nos Estados Unidos, num Surtees, numa repetição do acidente do francês no ano anterior.
      Depois desses, o próximo acidente fatal foi o de Ronnie, já em 78.
      Depois, em 82, perdemos Paletti e Villeneuve, de Osella e Ferrari.
      Não cito os acidentes graves como o de Stommelen na Espanha em 75 e o de Pironi na Alemanha em 82, de Hill e Ferrari.
      Tudo isso para dizer que essa história de que Chapman tem culpa no cartório como construtor de cadeiras elétricas, não se sustenta se confrontada com as estatísticas.
      Pelo menos é esse o meu pensamento.

      • Não me referia a falta de segurança dos carros (como você bem pontuou a F1 como um todo era insegura) e sim a falta de confiabilidade dos mesmos.

  • Lindo. Belíssimo texto. Grande homenagem para um REAL RACER . O oposto dos moleques mimados atuais que tem medo de chuva. Falando nela, o sueco era um assombro no molhado. Um dos maiores da história mesmo sem título. Nunca, nunca será esquecido.

    • Com direito a um erro do Luciano logo na abertura: o 300º GP da história foi naquele ano mesmo de 1978, mas não em Monza. Foi em Kyalami, no GP da África do Sul.