30 anos de Senna, parte XIV – GP da Espanha

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O GP da Espanha foi dominado por Alain Prost do início ao fim, enquanto Ayrton Senna voltou a não ter um bom carro – embora tenha coletado pontos importantes na pista de Jerez de la Frontera

RIO DE JANEIRO – A pista de Jerez de la Frontera, na região da Andaluzia, não era das que levava mais público na Fórmula 1. Mas teve um dos finais mais espetaculares de todos os tempos em 1986 e a corrida de 1987 fora das mais movimentadas daquele campeonato. Esperava-se no mínimo algo parecido no ano de 1988, com a batalha Senna versus Prost atingindo níveis máximos de excitação após as altercações em Portugal.

Mero coadjuvante naquele ano, Nelson Piquet teve problemas na pré-temporada com Ayrton Senna e os dois se detestavam. Mas o então tricampeão, que chegou de helicóptero à Espanha após a falha do seu jato particular, disparou após cruzar com o desafeto e compatriota. “Algo aconteceu no Estoril e na minha opinão Senna está psicologicamente afetado”, afirmou. “Parece que não suporta a menor insatisfação. No seu caso, toda a contrariedade, mesmo que menor, assume proporções inesperadas e transforma-se em drama. Ele suspeita de todos”, completa Nelson.

Um amigo próximo a Ron Dennis observa a tensão em torno do box da McLaren e não se furta em dar uma opinião. “Eles derrubaram a parede de desconfiança que os separava. Agora esta parede existe novamente. Ayrton tropeçou no Estoril. Alain permaneceu correto do começo ao fim. As coisas ficam complicadas de administrar”, revelou essa fonte.

Para aumentar essa tensão, quem aparece na Espanha é o sinistro Jean-Marie Balestre, presidente da FISA e da FIA, que chega a Jerez para “fazer reinar a paz e a ordem”. A imprensa internacional duvida veementemente das palavras do dirigente.

No paddock, Senna evita o contato com os jornalistas. Ron Dennis revela o teor de suas instruções. “O primeiro de vocês que realizar uma manobra muito audaciosa em relação ao outro e que porá em risco a performance da equipe será advertido via rádio”.

Será mesmo?

A batalha no treino classificatório foi intensa. Prost deu muito trabalho a Senna, mas o brasileiro faria sua 11ª pole position em catorze corridas até ali, com apenas 0″067 de vantagem – a menor diferença aferida num treino classificatório entre os dois em 1988. O travado circuito de pouco mais de 4,4 km deixava os carros aspirados à vontade para ter um bom papel e Nigel Mansell, veloz como sempre, brilhou com o terceiro lugar a dois décimos de Ayrton. Thierry Boutsen foi o quarto, seguido pelo parceiro de Benetton Alessandro Nannini e por Ivan Capelli.

Mais uma vez, os suspeitos de sempre não correram: as Zakspeed com Bernd Schneider e Piercarlo Ghinzani, Julian Bailey (agredido por Riccardo Patrese após os treinos) com a Tyrrell, Oscar Larrauri com a EuroBrun e Gabriele Tarquini dançou na pré-classificação com seu Coloni.

Na hora da largada, Prost tem um melhor arranque e assume a ponta do GP da Espanha. Senna não é superado apenas pelo francês como também por Nigel Mansell. Capelli larga bem e sobe para quarto, seguido por Boutsen e Riccardo Patrese.

Rapidamente o francês abre vantagem, mas Mansell dá tudo de si em sua Williams e com 10 voltas completadas, está colado no líder. Senna se distancia cerca de dez segundos, com Patrese à frente de Capelli e Nannini já em sexto. Boutsen precisou ir aos boxes e estava em 22º, à frente da Arrows de Eddie Cheever.

Em 1987, Piquet chamara Senna de “freio de mão”, porque o brasileiro bloqueara insistentemente a trajetória dele e dos adversários. Com um carro igualmente pouco colaborativo como em Portugal, Ayrton torna a ser incisivo na defesa de posição, evitando que os rivais o superem. Patrese não consegue superar a McLaren do brasileiro e isto exaspera Capelli, que também tenta superar o compatriota e partir pra cima de Senna.

Com 23 voltas, Mansell faz o giro mais rápido da pista em 1’29″567 e encosta de novo em Prost. O Leão é uma sombra no espelho retrovisor de “Le Professeur”. Senna, por seu turno, não dá sopa para Patrese. Alain responde ao ataque de Mansell e crava a melhor volta – 1’29″268.

Logo depois, um surpreendente Alessandro Nannini vira 1’28″576 e torna-se o piloto mais rápido da pista. Ele faz uso dos seus pneus novos e simplesmente voa baixo em Jerez, sendo na média dois segundos abaixo de praticamente todos os adversários. Na 34ª volta, Sandro já está em sexto, atrás de Capelli, superando Maurício Gugelmin.

Na 39ª volta, após ganhar o quarto lugar de Riccardo Patrese na marra, no setor mais lento do traçado, Capelli passa Senna na última curva do circuito e aponta na reta em terceiro. Senna perde o contato com o italiano e passa a receber a pressão de Patrese novamente, enquanto os pneus de Mansell botam a língua de fora e Prost aproveita para abrir cinco segundos na liderança.

Pouco depois, o motor do March de Capelli quebra e o italiano abandona. Nannini, por seu turno, ganha as posições de Patrese e Senna, pulando à terceira posição.

Faltando 22 voltas para o final, Ayrton Senna não tem mais condições de se manter em 4º e vai aos boxes, montando pneus novos. Volta em sétimo, entre o discreto Gerhard Berger e o eterno desafeto Nelson Piquet.

Sem trocar pneus em sua Williams, Mansell volta à carga e baixa o melhor tempo do dia para 1’27″999 – mas a embreagem de seu carro quebra e ele tem que moderar sua performance. Prost responde, faz 1’27″845, melhorando o tempo do britânico e a vantagem chega à casa de 20 segundos, mais do que confortável.

A esta altura, Senna já recupera posições e chega à 5ª posição, muito próximo de Riccardo Patrese. O brasileiro ultrapassa o italiano faltando sete voltas para o final e assume o quarto posto.

E nada mais acontece. Com extrema facilidade, Prost emplaca sua sexta vitória em 1988 e a 34ª da carreira. Mansell sobe ao pódio pela segunda vez no ano, assim como Alessandro Nannini. E Senna, com a quarta posição, não deixa que Alain lhe escape de seu alcance.

Apesar do placar do campeonato apontar uma vantagem de cinco pontos (84 a 79) a favor do francês, a matemática era favorável a Ayrton. A partir do GP do Japão, o que restava a Prost para levar a decisão até a última etapa era ganhar em Suzuka e também na Austrália. Com uma vitória simples, fosse qual fosse a posição de Alain na pista na penúltima etapa, Ayrton chegaria a 87 pontos líquidos e o rival teria o descarte de 18 pontos, já que abandonara duas vezes e Senna, três.

Com a categoria que Deus lhes deu e a calculadora no bolso do macacão, a próxima parada para Alain e Ayrton – e o próximo post – será o GP do Japão.

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