Direto do túnel do tempo (432)

Houston13

RIO DE JANEIRO (Parabéns, Baixo!) – Neste 11 de fevereiro, celebramos mais um aniversário do gigantesco Roberto Pupo Moreno. Data redonda, digna do registro aqui no blog: ele chega a 60 anos de idade – em maioria absoluta vividos em oficinas, com cheiro de graxa – e principalmente autódromos.

Filho de bancário, nascido no Rio e criado em Brasília, onde teve que tomar hormônio pra poder crescer um pouco mais, o Baixo era o capeta já com 13 anos. Fazia ligação direta em todos os veículos que pudesse – até ônibus” – e barbarizava pelo Plano Piloto da capital federal junto a um amigo de apelidos “Pobreza” e “Sujeira”, filho de ministro, que cultivava cabeleira e bigodnho.

Um certo Nelson Piquet.

Essa juventude nada “gente bem” do DF foi orgulho num esporte predominantemente ególatra. Piquet, todo mundo sabe, foi tricampeão mundial de Fórmula 1. Moreno pode não ter atingido patamar tão alto. Mas guiou o que quis e o que pôde guiar na vida. De verdadeiras cadeiras elétricas a carros de sonho como o McLaren de Ayrton Senna, num teste da Honda em Portugal.

E não podemos deixar de lembrar o pódio do Baixo no GP do Japão de 1990, ao lado do amigo de tantas jornadas? Aquele que dizia verdades com frases abertas. Aquele que o abraçou e o confortou quando após a bandeirada, Roberto se entregou ao mais incontido e sincero pranto convulso.

A verdade é que Moreno foi talvez o piloto mais subestimado de todos os tempos – e ao mesmo tempo tão estimado por quem o viu correr.

Tive esse privilégio quase a vida inteira. Nas “Quatro Rodas” dos anos 1980, tomei conhecimento daquele garoto então com 21 anos que explodia na Fórmula Ford inglesa pra cair nas graças de ninguém menos que Colin Chapman. Eram tempos em que rapazotes pulavam etapas direto. Mas eram épocas que exigiam urgência, dinheiro e sorte.

Faltou dinheiro a Moreno. E faltou também um pouco de sorte, porque na primeira experiência com Fórmula 1 saiu chamuscado e demorou a voltar.

Nesse interregno, fez Fórmula 3 (inglesa e europeia), disputou o GP de Mônaco de F-3, destruiu cobras criadas em provas de Fórmula Atlantic na Austrália, terçou bigodes nos EUA com Michael Andretti, andou de Porsche nas 24h de Le Mans e até sentou em Tyrrell de Fórmula 1 (na Fórmula 3000) e andou de Fórmula Indy. Tudo entre 1982 e 1986.

Moreno foi um cigano. Teo José, colega hoje no Fox Sports, costumava chamá-lo de “Operário da Velocidade”. Não era pejorativo. Era um reconhecimento ao caráter, à garra e principalmente ao esforço do Baixo em chegar lá.

E por vias tortas, o cara chegou.

Se não foi espetacular, foi digno. Fez 42 corridas de Fórmula 1 – o que, convenhamos, não é pouco. Perpetrou alguns pequenos milagres, como uma melhor volta em Spa na sua última corrida de Benetton; o ponto em Adelaide de AGS; classificou um EuroBrun numa oitava fila em Phoenix e um Coloni em Portugal; e botou a Andrea Moda num grid de largada pela única vez da história do time italiano.

Não sei quanto a vocês, mas isso pra mim é coisa de gênio.

E lá foi o Moreno ser feliz quantas e todas as vezes que foi preciso, pulando de galho em galho, guiando de um tudo com uma puta competência que só Deus explica.

Às vezes, nem ele, com toda a sua sapiência, pode explicar.

E para homenagear o Baixo por seu aniversário, por essa data especial em que celebramos um sujeito tão querido quanto ele sempre foi, por nós que amamos esse negócio, essa cachaça chamada automobilismo, o blog colocou lá em cima um dos carros mais espetaculares que ele pôde guiar: o Reynard 2KI de motor Ford Cosworth XF alinhado por U.E. “Pat” Patrick nas cores lendárias da Visteon.

Foi com esse carro que afirmo – sem medo de errar: o Baixo fez a maior temporada de sua carreira, em 2000, na CART. Lá, ele terminou o campeonato em 3º lugar e venceu de forma simplesmente brilhante o GP de Cleveland. Sem contar outros cinco pódios em Homestead-Miami, Twin Ring Motegi, Portland, Gateway e Fontana.

Há 19 anos, direto do túnel do tempo.

Comentários

  • Esse para mim é um dos caras que mereciam mais do que teve na carreira como piloto. A primeira passagem que me lembro foi pela F1 com a Benetton, e mais tarde, na antiga CART, lembro bem da temporada onde ele se destacou, chegando a liderar o campeonato.
    Só resta desejar muita saúde e agradecer aos serviços prestados aos amantes do esporte à motor.

  • Vi Roberto Pupo Moreno correr com uma Ferrari F-430 em Curitiba, pelo saudoso campeonato de GT-3. Colocou simplesmente 5 segundos no seu companheiro de equipe, o qual não me recordo quem era. Moreno, mais que um “Operário da Velocidade”, era um gênio das pistas, que poucas vezes teve um carro à altura. E discordo de você, Rodrigo, em apenas uma coisa: ele não operou milagres, mas sim mostrou sua enorme competência com aquelas cadeiras elétricas. No mais, belíssimo texto, assim como o do Boechat. Grande abraço.

  • Disputando campeonato contra Michael Andretti com um esquema bem menor.
    Pontuar para a AGS.
    Colocar Andrea Moda no grid de Mônaco.
    Cinco segundos no companheiro em Curitiba.
    Lembrei-me agora de José Carlos Pace. Foi disputar uma prova de carros esporte por uma fabrica italiana (AMS) e conseguiu o segundo lugar no grid. Num carro que não freava muito bem. Os donos ficaram tão contentes que ofereceram contrato para o Moco com as promessas de praxe. Mas ele não aceitou.

  • O Rodrigo Mattar sabe, como poucos, registrar a história de ‘feras’ como o Moreno. Alias, não apenas registrar mas, paralelamente, homenagear e reverenciar. Particularmente, pouco a acrescentar. Exceto, claro, que gostei do artigo e que, na condição de ‘big’ admirador do ‘Pupo’, eu penso que na lista das imensas injustiças que já assisti no Automobilismo, sem dúvida, a demissão que ele sofreu em 1991 certamente é destaque. Na boa: com tanta equipe disponível, o empresário do Michael Schumacher foi escolher justamente a Benetton? Alias, sempre me pergunto o que aconteceria SE o ‘sapateiro’ nunca tivesse nascido; 100% de certeza de que Moreno ficaria até o final de 1991 no time das ‘cores unidas’, Piquet permaneceria na equipe até 1992 — isto tudo sem falar que Rubens Barrichello seria para lá de reverenciado como campeão de F1 (condição que, sabemos, a Ferrari não lhe proporcionou…).

  • Lembro de duas pérolas em entrevistas AO VIVO na época da F-1 (Se não.me engano)
    Numa ele chama os mecânicos da equipe de “borracheiros”
    Em outra ele comenta que conseguiu um bom tempo em um treino na chuva porque mandou os mecânicos “abrirem um rêgo” nos pneus.