Américas fora; Algarve, Imola e Nürburgring dentro

Registro da largada do GP do Brasil de 1973, o primeiro que contou pontos para a Fórmula 1 em caráter oficial: contando a corrida do ano anterior, o país está fora do calendário da categoria pela primeira vez em 48 anos, graças à Pandemia do Covid-19

RIO DE JANEIRO – Para surpresa de ninguém, o Liberty Media confirmou o que já se imaginava e especulava: após 48 anos, o GP do Brasil de Fórmula 1 deixa de acontecer de forma consecutiva pela primeira vez em sua história. Desde 30 de março de 1972 como evento não-oficial e posteriormente 11 de fevereiro de 1973, quando Emerson Fittipaldi venceu em Interlagos a primeira prova válida para o Mundial da categoria, fosse no Rio ou em São Paulo, o país nunca ficara ausente da competição.

O motivo todos sabemos: a Pandemia do Covid-19 e a péssima imagem do Brasil no cenário internacional, em quaisquer aspectos – social, econômico, político e, principalmente, sanitário. São mais de 2,2 milhões de casos (dados atualizados no fechamento dessa postagem, sem contar subnotificações) e 84.251 vítimas fatais (idem). Diante de números alarmantes e tristes, qualquer tentativa de se fazer o evento por aqui cai por terra.

De nada adiantaram as palavras do governador João Doria e do prefeito Bruno Covas, que há duas semanas, em coletiva sobre o panorama do Coronavírus no estado e no município de São Paulo, de que haveria o GP do Brasil porque “o contrato tem que ser cumprido”. O cancelamento é por motivo de força maior e reserva-se a prerrogativa ao dono do espetáculo, que é o Liberty Media – e não a esfera governamental.

Agora, São Paulo que lute – e muito – se quiser manter Interlagos no calendário. O Rio não tem autódromo – só as bravatas de presidente da república, governador do estado e prefeito, que pelo menos até onde interessava, estavam “unidos” nessa premissa. Mas, como sói, a cidade carioca e fluminense não tem perspectivas de ver a pista erguida num futuro próximo.

A extinção de Jacarepaguá foi um crime – dando lugar a outro, que é o abandono (previsível demais) do Parque Olímpico ali construído.  Ninguém cumpriu com a palavra dada desde então – e vocês acham que eu vou acreditar que será possível a um estado dilapidado por péssimas administrações e diversos casos de corrupção manter um Autódromo, ainda que sob os auspícios da iniciativa privada?

Azar do Brasil, azar das Américas, posto que não haverá nenhuma corrida na região, fora do calendário da F1 após 70 anos. Os EUA estiveram no calendário de 1950 com a Indy 500, que fazia parte da série. No total, os ianques receberam até hoje 68 provas da categoria.

O México também perdeu o direito de sediar sua corrida, considerada o melhor evento do calendário nos últimos anos, com grande afluência de público. O país latino iria fazer seu 21º GP da história após inúmeras interrupções. Os organizadores, contudo, confirmam que os espectadores com ingressos comprados podem guardar seus boletos e vouchers, porque serão abonados na volta do país ao calendário.

Quem entrou de gaiato foi o Canadá, que por casos e mortes por Covid-19 – pouco mais de 112 mil infectados e cerca de 8,8 mil vítimas fatais – seria teoricamente o menos afetado dos países da região e estaria apto a permanecer no calendário. Só que foi levado um fator muito maior em consideração do que o logístico – até porque o país já faz um evento isolado dos outros países acima citados: o frio.

A partir de setembro, seria praticamente inviável a realização de qualquer corrida de F1 no país. Tanto que decidiu-se a partir de 1982 pela mudança da corrida do segundo semestre para junho: em 1981, Jacques Laffite venceu uma corrida histórica disputada sob um temporal de Arca de Noé e, três anos antes, o GP do Canadá foi o mais frio que se tem notícia em sete décadas de provas – fazia apenas 5ºC quando a corrida vencida pelo ídolo local Gilles Villeneuve foi disputada.

Homologado como traçado “grau 1” pela FIA, o moderno Autódromo Internacional do Algarve, em Portimão, recebe a F1 na volta da categoria ao país após 24 anos

Vão-se os anéis, ficam os dedos: se as quatro provas nas Américas são descartadas e o total de eventos cancelados é ampliado para onze, FIA e Liberty Media bateram o martelo para mais três etapas no continente europeu.

A grande notícia do dia é a volta de Portugal ao calendário e ao radar da F1, ainda que por um motivo absolutamente excepcional que é a Pandemia, após 24 anos. O país europeu, que sediou corridas a partir de 1984 até 1996 no Autódromo do Estoril, recebe de volta a categoria no moderno circuito do Algarve, em Portimão. A corrida portuguesa será dia 25 de outubro.

Duas semanas antes, volta também o circuito alemão de Nürburgring: ausente desde 2013, a pista recebe o GP do Eifel. E no primeiro domingo de novembro, num evento de apenas dois dias – acontece o GP da Emilia Romagna, também marcando o retorno de outra pista conhecida dos aficionados: Imola, sempre na memória pelo fim de semana do GP de San Marino de 1994. A ausência do traçado italiano perdurou por 14 anos – de 1980 a 2006, quer fosse GP da Itália ou de San Marino, nunca deixou de haver corridas de F1 até o triunfo de Michael Schumacher, da Ferrari.

Triste por nós, pelo Brasil, pela sua tradição e pela incompetência absurda do presidente da república, do minstério da saúde e, por que não dizer, da ignorância de grande parte da população.

Feliz por Portugal. Os nossos “patrícios” mereciam e muito voltar. Não desse jeito, é verdade. Mas como a Pandemia e seus efeitos foram mais mitigados do que aqui – porque houve planejamento e respeito – haverá o GP luso para manter a lingua portuguesa de algum modo no calendário da Fórmula 1 em 2020.

Comentários

  • Com a entrada de Nurburgring, Portimão e Imola, são 13 corridas. O contrato com as TVs exige o mínimo de 15 corridas, para não ter uma multa.Suponho que entrarão as duas corridas no Bahrein. E, claro, podem tentar fazer mais duas e dar 17. Mais do que 17 eu acho muito difícil.

  • Rodrigo, você acha que se as corridas de Imola e do Algarve forem bastante movimentadas, com inúmeras brigas por posições, ultrapassagens, você acredita que elas tem potencial para retornarem ao calendario de maneira oficial (2021)?
    Contando que em 2021 seja possivel realizar o campeonato de maneira correta, com todas as etapas dentro do contrato.

    • Não sei. É uma boa questão mas considere que por enquanto ambas as pistas – e também Mugello e Nürburgring – são paliativos e não opções para o momento que o Liberty Media quer para a Fórmula 1.

      Mas com um expurgo do Brasil do calendário – um caminho que pode ser contemplado, infelizmente, por que não?

  • Gostaria muito que acontecesse a corrida no Vietnã. O Circuito de Hanói é lindo! Há uma longa reta entre as curvas 5 e 6, e as curvas 7, 8 e 9 são muito parecidas com o Hairpin, de Mônaco (aqui, acho que terão que reduzir de 8ª para a 2ª marcha). E logo depois desse “hairpin”, está a reta mais longa do circuito.

    Estou com “ansiedade” em relação a esse circuito desde o ano passado. Tomara que a estréia seja esse ano.Caso algum leitor desse blog ainda não tenha visto o traçado do Circuito de Hanói, recomendo googlar assim que for possível.

      • Supondo que os dois entrem no calendário esse ano: o anel externo do Bahrein será bem legal, mas acho que o Vietnã será o grande acontecimento de 2020. Tem tudo para se tornar um dos melhores circuitos da atualidade.

      • Pode ser uma boa também, mas o trioval teria uma média horário maior que o Vietnã, “pé no porão” quase o tempo todo!!!

  • É natural que cancelados Canada, USA e México, o GP do Brasil fosse cancelado, independente da condição da pandemia no Brasil. Não iriam vir para America pra correr só no Brasil, mesmo que aqui fosse uma ilha de prevenção do Virus, que infelizmente nao é o caso. Então, não dá pra chorar nem procurar culpados.

    Agora, dá pra procurar os culpados por esse paragrafo do Rodrigo: “A extinção de Jacarepaguá foi um crime – dando lugar a outro, que é o abandono (previsível demais) do Parque Olímpico ali construído. Ninguém cumpriu com a palavra dada desde então…” Só que isso não interessa a ninguém !!!!! Nem mesmo o acordo feito na Justiça (existe Justiça nesse país ???) de que o estado deveria devolver ao Automobilismo uma praça de Esportes similar a que foi tomada na mão grande, foi ou será honrado, nem agora, nem no futuro.

    Mas o que me irrita mesmo é ver todo mundo contra a construção do autódromo em Deodoro, porém sem reclamar o direito de construir o autódromo do Rio, em qualquer lugar que seja. Tem negociata ?? Sejamos contra. Tem bombas não detonadas ?? Sejamos contra. Tem arvores ou animais a serem protegidos ?? Sejamos contra ??? Mas vamos pedir que o autodromo seja construido em um outro lugar, porque é divida registrada na justiça.

    Porém, assim como ninguém (mais uma vez, exceto o Rodrigo Mattar) se insurgiu contra a destruição de um autodromo Classe A, Grau 1 da FIA, em muito boas condições, ninguém se apresenta pra pedir o cumprimento do que foi acordado na justiça, de DEVOLVER ao Rio o autódromo destruído.

    Cadê a CBA, Cadê a Federação do Rio, Cadê o jornalismo esportivo, cadê o jornalismo de automobilismo, os pilotos, as equipes, etc ???? Ninguem pra lutar pelo cumprimento do acordo na Justiça ???? Cadê a Justiça ???

    Que parte do dinheiro que foi recuperado dos Srs. Cabral, Nuzman e outros seja direcionado a construção do autódromo que eles “roubaram” pra plantar um elefante branco no local. Que parte do dinheiro que está sendo recuperado dos roubos dos governos anteriores, posto que o Governo Federal se comprometeu, através da palavra da D. Dilma, a investir num autódromo, seja direcionada para isso. Isso seria justo.

    Então, se não temos nem teremos autódromo no Rio é porque os políticos brasileiros, seja de que partido, ideologia ou de que época forem, são safados, desonestos, picaretas. E são assim, porque nós, brasileiros, somos cúmplices-calados. Porque acreditamos em picaretas, votamos em picaretas, e depois não reclamamos os nossos direitos diante das promessas não cumpridas por esses picaretas.

  • Eu não consigo entender porque, tendo OUTROS autódromos excelentes na Europa, não tentar programar as corridas que faltam, neles: na França tem Magny Cours, Paul Ricard e Circuit Bugatti, Na Alemanha tem Hockenheim. na Inglaterra tem Donignton Park, na Belgica tem Zolder, na Holanda tem o novo Zandvoort, Na Espanha tem Jarama e Jerez, na Italia tem Misano Adriatico. Só pra citar alguns…
    Pelo menos uns 4 deles estão em regiões mais ao Sul, que permitiriam realizar corridas depois do final de outubro. Portimão poderia ser remanejado mais pro meio de dezembro, pra permitir a inserção dos outros.
    Daria sim pra fazer 17 -18 corridas na Europa, sem traslados de avião, a custo menor, e com menos tempo perdido entre corridas.
    Questão de arrumar patrocinadores e fazer acordo com federações.
    Enfim, como eu não sou da Liberty Media, não adianta berrar daqui do meu mundo dos sonhos.
    já temos 13 GP’s garantidos, e pra quem “respira F1” é melhor do que nada.

    • Antonio, concordo que seria mais prático, mais inteligente e mais econômico, que todas as corridas fossem na Europa, mas penso que a Liberty Media quer evitar que o ano de 2020 entre para a história da categoria como sendo apenas um Campeonato Europeu de F-1. É um argumento fraco e bobinho, mas acho que eles pensam assim.