Há 50 anos: a estreia de Emerson fittipaldi na F1

RIO DE JANEIRO (Long, long time ago…) – Dia 18 de julho de 1970. Autódromo de Brands Hatch, Inglaterra.

Aquele dia marcaria para sempre a história de uma personagem e também do automobilismo brasileiro dali para a frente.

Sétima etapa do Mundial de Fórmula 1, o GP da Grã-Bretanha de 50 anos atrás assistiu à estreia de um jovem talentoso que em menos de um ano conquistara a Inglaterra, com vitórias na Fórmula Ford e Fórmula 3.

E com ótimas atuações na Fórmula 2, deixou Colin Chapman atento.

Emerson Fittipaldi, então com 23 anos, saíra das pistas nacionais em fins de 1968 e não precisou de mais do que meia temporada com um Lotus da equipe de Jim Russell para derrotar os pilotos de fábrica da marca, Roy Pike e Morris Nunn.

Com os Lotus, o “Rato” andou bem na F2 e em pé de igualdade com muitas feras da F1, que apareciam em diversas etapas do concorrido e competitivo certame europeu.

O chamado veio via Dick Scammell, um dos homens de confiança de Colin. Morando em Wimbledon com Chico Rosa, Emerson retornou a ligação de um telefone público.

“O patrão quer falar com você”, informou Dick.

Emerson foi a Norfolk e lá conversou com Chapman, acordando primeiro um teste de adaptação do píloto ao Lotus 49C, do qual participaria também – dizem que meio a contragosto, Jochen Rindt.

O austríaco, então líder após seis corridas disputadas com três vitórias e 27 pontos, não se mostrava lá muito disposto a andar num carro que já nem era mais dele. Desde o GP da Holanda, tinha à disposição a moderna Lotus 72.

Mas Rindt foi lá, deu as primeiras voltas de aquecimento e entregou, em Silverstone – local do primeiro treino de Fittipaldi – o volante ao brasileiro.

Além da posição desconfortável no banco, feito para o piloto titular, o novato brasileiro logo passou impressões de comportamento estranho do 49C.

“Sabe o que você tem que fazer? Senta a bota!”, recomendou Jochen.

Emerson obedeceu à risca. Fez ótimos tempos e, de repente, o narigudo Rindt estava na mureta de Silverstone dando placa de tempos ao brasileiro, entusiasmado com suas performances.

Sem transição, Colin deu o veredito. “Você estreia em Brands Hatch.”

“Ele (Emerson) tinha qualidades que se enxergava no escuro. Colin viu isso e percebeu que ali havia um campeão do mundo”, declarou Wilsinho Fittipaldi, muito tempo depois.

Inscrito com o dorsal #28, o jovem Fittipaldi era apenas mais um entre cinco pilotos com carros Lotus. Além dele, havia Jochen Rindt e John Miles com as Lotus 72, Graham Hill com uma 49C da equipe Brooke Bond Oxo Racing/Rob Walker e também Pete Lovely, estadunidense independente que corria com o modelo 49B do ano anterior.

Vinte e cinco pilotos fizeram tomada de tempo: Fittipaldi marcou 1’28″1, um décimo acima do March de Jo Siffert e três décimos melhor que Hill. O lento Lovely foi deixado a mais de dois segundos. Brian Redman, último classificado, não alinharia. Nem ele, nem Rolf Stommelen – que bateu nos treinos classificatórios, o que deixaria Emerson na 21ª posição de um grid com 23 pilotos à largada.

Andrea de Adamich enfrentou problemas com vazamento de combustível e na largada, efetivamente, partiram 22 pilotos. Na última fila, tendo o bicampeão Hill ao lado, Emerson não podia acreditar. A recomendação era de ser constante, prudente e levar o equipamento até o final.

O “Rato” passou a primeira volta em 21º e logo na segunda ganhou posições de George Eaton (BRM) e John Surtees, que guiava pela primeira vez sua própria criação.

Uma falha na BRM de Pedro Rodríguez deixou o mexicano em último e Fittipaldi seguia em bom ritmo, sem deixar Surtees, o grande campeão das duas e quatro rodas, fugir muito.

Na altura da 20ª volta, com quatro competidores fora, Emerson era 15º entre dezoito pilotos na pista. As posteriores desistências da Matra-Simca de Jean-Pierre Beltoise e do March de Mario Andretti fizeram o novato galgar mais duas colocações.

Metade da disputa, que teria 80 giros: Fittipaldi ocupava o 12º posto. Atrás dele, além de Lovely e Rodríguez, Henri Pescarolo e Ronnie Peterson, que tiveram problemas e se atrasaram.

Num espaço de três voltas, abandonaram a BRM de Jackie Oliver, que vinha em terceiro atrás dos líderes Rindt e Jack Brabham, além de John Surtees e o então campeão mundial Jackie Stewart. Fittipaldi passou também o March de François Cévert e instalou-se em nono lugar, subindo depois a oitavo.

Cévert não tardou a superar o brasileiro e recuperou a posição. Os últimos abandonos foram de Pedro Rodríguez, Dan Gurney e Pete Lovely, sem contar Peterson, que parou após completar 72 voltas e foi classificado ao final da prova.

Apenas preocupado em chegar, Fittipaldi não atrapalhava os líderes e nem deve ter imaginado como foram as últimas voltas. Faltando onze para o fim, o líder Rindt, que dominara a corrida, foi superado por “Black” Jack Brabham, que queria muito mais uma vitória naquele campeonato de 1970.

Só que, faltando 300 metros para o pano, acabou o combustível do líder, que tinha como mecânico-chefe na época um certo Ron Dennis…

Isso deixou Jochen Rindt em condições de triunfar pela quarta vez, dando ao austríaco a liderança isolada do Mundial com 36 pontos, enquanto Brabham resignou-se em terminar no 2º posto, seguido por Denny Hulme (McLaren), Clay Regazzoni (Ferrari), Chris Amon (March) e Graham Hill (Lotus).

Fittipaldi, que em ritmo de prova fez o 11º melhor giro da disputa – melhor que no treino classificatório – completou 78 voltas e foi o oitavo,

Fosse no regulamento atual e também no anterior, que vigorou a partir de 2003, o “Rato” teria marcado pontos em sua estreia.

Mas foi bom. Emerson ficou na equipe até o fim do ano, marcou pontos na segunda prova – ainda com a obsoleta Lotus 49C e, titular após a morte de Jochen Rindt, venceria em sua quarta apresentação na F1 com a 72, em Watkins Glen.

E o resto, leitoras e leitores, é história.

Comentários

  • Acho uma pena que haja tão pouco material sobre essa saga brasileira no automobilismo.

    Foram vários brasileiros para lá, muito bons, como Emerson e Wilson, Ricardo Achcar, Luiz Pereira Bueno, Jose Carlos Pace, Francisco Lameirão,.

    Emerson se destacou em não perdeu a oportunidade que Colin Chapmann deu a ele.

    A promoção dos pilotos acontecia pela morte dos demais; Rindt, Courage e tantos outros iam morrendo.

    Essa saga é genial e a virtude de Emerson é menos perceptível por causa da aposta que ele e Wilson fizeram, no seu próprio carro. Ele é um dos grandes do automobilismo.

    Salve Emerson” Salve, família Fittipaldi!

  • Isso é que é estrear metendo o pé na porta… Queria muito ter visto o Fittipaldi correr, e não deve ter sido fácil pra ele. Correu numa época muito perigosa pro automobilismo, perdeu vários colegas (ele já disse num comercial uma vez, se não me engano foram 35). Um ídolo pra sempre!

  • Já se tornou um clichê dizer que o Emerson foi “o pai de todos”, mas é a mais pura verdade. A saída dele do Brasil, em 1968, foi o ponto de partida para tudo que aconteceu depois com Piquet, Senna, Rubinho e Massa, entre outros.

    • Só um adendo, Jeferson:
      O Wilsinho havia ido antes e comido o pão que o diabo amassou.
      Daí foi obrigado a voltar com o rabo no meio das pernas.
      Mas foi essa sabugada levada por ele que serviu de orientação para o irmão mais novo não cometer os mesmos erros.
      O resto é história.

      • Bem lembrado, Zé Maria. O Wilsinho foi fundamental mesmo quando o Emerson já estava na F-1, pois em uma entrevista com o Reginaldo Leme, o Emerson disse que pensou em desistir, depois de ver tantos pilotos morrendo na pista.O Wilsinho “falou grosso” com ele e praticamente o obrigou a continuar. Se não me falha a memória, nessa entrevista o Wilsinho chorou ao contar essa passagem.