A Mil por Hora
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15 anos…

RIO DE JANEIRO – A memória por vezes é madrasta. E numa ocasião que considero uma das mais importantes da minha vida, justo ela, que é normalmente minha aliada, me traiu. É que eu achava que hoje, 26 de maio, eu tinha completado exatos 15 anos trabalhando como comentarista de automobilismo desde minha estreia. Na […]

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João Guilherme foi o companheiro deste que vos escreve na primeira transmissão, em 25 (e não 26) de maio de 2003. Quinze anos…

RIO DE JANEIRO – A memória por vezes é madrasta. E numa ocasião que considero uma das mais importantes da minha vida, justo ela, que é normalmente minha aliada, me traiu.

É que eu achava que hoje, 26 de maio, eu tinha completado exatos 15 anos trabalhando como comentarista de automobilismo desde minha estreia. Na verdade, foi ontem…

Era maio de 2003. Prestes a completar 32 anos, vivia uma fase nova no jornalismo. Permitam-me contar rapidinho como comecei, tarde, é verdade, aos 25 anos, como estagiário do Jornal do Brasil, primeiro na área de Esporte e depois na Geral (Cidade), voltando ao Esporte e ficando dias na editoria de Economia. Comecei a me sentir desconfortável, sei que fazia parte do rodízio, mas trabalhar insatisfeito é a pior experiência de um ser humano.

Nisso, tive uma proposta pra sair e arrisquei. Fui trabalhar com assessoria de imprensa, um negócio que também satura, mas tive lições que trouxe pro resto da vida, dadas por um sujeito formidável e que não está mais entre nós, chamado Eduardo Regal.

Graças a ele, conheci várias pessoas, trabalhei na Indy 400 e na MotoGP em 1997, sem contar que o ajudei com a divulgação das 24h de Le Mans e de Daytona para a Stuttgart, que começava naquela época seus primeiros passos como importadora dos modelos Porsche e tinha sua base – ainda – no Rio de Janeiro.

Mas aquilo não era o que eu queria na vida. E como eu ainda não tinha terminado o curso, me inscrevi no “Estagiar”, o programa da Globo para trazer os chamados focas. Já tinha passado por uma primeira prova e não fora aprovado. Na segunda, fui até o fim e acabei escolhido. Tive alguns problemas – principalmente com o Décio Lopes, que supervisionava os estagiários – e não tive sequência após o fim do contrato em fevereiro de 1999. Mas o Emanuel Castro, gerente de eventos, dizia. “Você é bom”.

Acho que eu só precisava de um empurrão, mas como ele não veio, voltei a trabalhar como frila, ganhando um trocado para não ficar duro. Fiz revista com o Jorge Velloso (Club Motor), programa de bolso dos GPs do Brasil de Fórmula 1 e Fórmula Indy, voltei a ter contato com o Regal – que na épóca fazia o “Karting”, programa da faixa Grid Motor do SporTV. Foi nessa época que conheci o que seria o meu ‘outro lar’, sem que ninguém se desse conta disso.

Mas ainda em 1999, o Emanuel me telefona. Com o jeitão que lhe era característico e com que tratava as pessoas – não sei se ele ainda é assim, pois perdemos contato – disse.

“Fala, maluco! Precisamos conversar. Tá de bobeira em casa?”

“Tô sim.”

“Então vem pra cá, agora.”

Fui. Não tinha nada a perder e, coração aos pulos, ele me avisa que gostaria de me contratar como temporário por 3 meses para ajudar no Pan-Americano de Winnipeg. Quando vi quanto podia ganhar, nem pensei duas vezes e voltei pra Globo. Dei adeus pro Regal de uma forma que, confesso, não foi legal. Mas eu precisava voltar a trabalhar em TV porque tinha certeza que era minha praia.

Dei muita cabeçada por lá de 2000 até 2002. Mas foi um imenso aprendizado. Principalmente lidar com pessoas tão diferentes quanto nós mesmos, que são os companheiros de trabalho. De alguns não gostava – e não gosto, até hoje. De outros tenho enorme saudade, como o Kaká Langer, o Fernando Condé, a Monika Leitão e por aí afora.

No fim de 2002, começaram a rolar uns papos de que o SporTV seria absorvido pelo que na época ainda se chamava Organizações Globo e que o Emanuel estaria à frente de tudo. Então ele foi franco. “Te prepara, maluco, que eu vou te mandar pro SporTV.”

E foi o que aconteceu. Na despedida, numa das reuniões de segunda-feira, palmas. Acho que pra muitos foi um alívio e pra mim, com certeza foi. Não sei se os dados rolariam a meu favor na Globo como rolaram lá no velho prédio do Rio Comprido.

O Grid Motor tinha como editora responsável uma mulher loucaça, chamada Deborah Ribeiro. Sabia que não seria fácil lidar com a figura e o Emanuel me alertou pra ficar de olho no que ela fizesse – ou não. Na transição, isso seria importante. Os primeiros três meses foram tranquilos e em maio, ela vai para Indianápolis. E depois dessa viagem, ela acabaria saindo do canal – mas isso é outra história…

Nessa mesma época, pintou um problema. O SporTV tinha dois comentaristas – Lito Cavalcanti e Gualter Salles, este, piloto da Stock Car. Num mesmo dia, 25 de maio de 2003, o Gualtinho iria correr na Stock Car em Jacarepaguá e a prova seria transmitida ao vivo. E depois, entraria no ar as 500 Milhas de Indianápolis, onde o Lito seria o comentarista ao lado do Sergio Mauricio. Não estava sabendo o que se passava na outra sala, que ficava longe da nossa redação, mas de repente vem um telefonema disparado de lá, me mandando chamar para uma conversa.

Nessas situações a gente gela, ainda mais com menos de três meses de casa. Pensei… “lá vem merda”. Mas o que veio foi surpreendente.

“Precisamos de alguém pra fazer a Stock Car e queremos fazer um teste de vídeo com você”, comunicou o então gerente, Paschoal Filho. “Topa?”

Por mim, estava topado. Fiz o teste de vídeo sem entender nada. E aí, surpresa. “Você faz a Stock Car domingo, com o João Guilherme.”

Nossa… foi demais receber a notícia e, ao mesmo tempo, me ocorreu que nada podia dar errado. E no dia da corrida, eu tremia. Da cabeça aos pés, nervoso, com a responsabilidade.

O João, que já tinha uma estrada bem razoável e tinha começado no rádio, se apressou a me acalmar. “O conhecimento você tem. Se acalma. O microfone é seu amigo.”

A transmissão rolou, achei uma merda, não gostei mesmo (ah… a vitória foi do David Muffato, que seria o campeão da categoria naquele ano).

De casa, mandei um e-mail pro Emanuel. A minha resposta à pergunta que fizera: “Da próxima vez, só faz direito a barba.”

Sim, haveria uma próxima vez. E vieram várias, ainda naquele ano de 2003, com Nascar (mais uma vez, graças ao Gualter Salles, que foi para a Fórmula Indy) e até Fórmula 1, no histórico hexa do Michael Schumacher, prova que gravei com o Lucas Pereira, outro querido narrador que trabalhava lá, hoje na Record.

Até 2012, além de trabalhar no Grid Motor e depois no Linha de Chegada em seus inúmeros formatos, fiz narração de corridas de categorias menores, de highlights, comentários de provas ao vivo, enfim… foram incontáveis horas ao lado de quase todos os narradores do SporTV no Rio de Janeiro – e creio que as únicas exceções foram o Roby Porto e o Luiz Carlos Júnior. Naquele ano, tive um problema que muitos de vocês têm conhecimento e fui demitido.

Fiquei afastado por seis meses, mas o destino – sempre ele – ajudou e, por indicação de alguns antigos colegas de SporTV, que estavam num novo canal – o Fox Sports – lá fui eu comentar como convidado uma prova da Nascar, os Duels de Daytona, em fevereiro de 2013. Em 6 de maio, eu adentrava o casarão da Marechal Pires Ferreira, o primeiro endereço da emissora no Rio, e minha história na nova casa começava naquele dia.

Hamilton Rodrigues foi companheiro de dezenas de transmissões no Fox Sports

Se não me engano, minha primeira transmissão ao vivo foi uma prova da American Le Mans Series. Já um fã confesso de Endurance, deitei e rolei. Já não era mais um novato. Estava perto dos 42 anos e bem menos inseguro do que em 2003, com certeza. Depois, vieram outras categorias e tudo fluiu ao natural.

Agora, além dos comentários, estou como fechador do Fox Nitro. Não digo que sou o fechador porque no jornalismo a gente não é nada de fato, por conta da volatilidade da profissão. Uma hora a gente serve, noutra não. Infelizmente somos facilmente descartados ou descartáveis.

Além de eventualmente participar do Fox Nitro, também estou responsável pelo formato do que vocês veem todas as noites de segunda-feira

Então prefiro dizer que estou fechador e estou comentarista. E estive, por esses 15 anos todos. E espero estar, por muitos mais.

Por isso, esse post. Por isso, a mais profunda gratidão a todos os que contribuíram para que essa caminhada chegasse aqui nesse ponto. Por isso, minhas palavras de carinho especial às seguintes pessoas.

Edgard Mello Filho: mais do que uma referência, um mestre, um monstro, um mito. Orgulho por trabalhar com esse cara!

A Emanuel Castro, pela loucura.

A Eduardo Regal, in memoriam, pela primeira chance.

A Paschoal Filho e Gilberto Conde, igualmente in memoriam, que acreditaram.

A Ricardo Porto e Eduardo Abbas, chefes com quem aprendi muito. Explosivos, difíceis, mas extremamente competentes.

A Reginaldo Leme e Edgard Mello Filho, minhas referências dentro do jornalismo de automobilismo, pelo caráter, competência e, sobretudo, amor ao esporte.

A Marcus Zamponi, o saudoso Zampa, o melhor texto da nossa profissão.

Ao Flavio Gomes e equipe do Grande Prêmio, que me estendeu a mão numa hora que precisava. E que formou uma parceria que, aqui, já dura quatro anos.

A Eduardo Zebini, Luciano Callegari, Márcio Moron, Sidnei Bortotto e Fernando Moraes, pelo que foi feito desde 2013 até aqui.

O agradecimento final é para outras duas pessoas, que não são jornalistas, mas são parte fundamental da minha vida. Minha mãe, d. Eliana e minha companheira Gleice, que foram e têm sido importantes até aqui, segurando barras, aturando muita coisa e, principalmente, torcendo e apoiando.

Nessa vida louca na fábrica de doidos, também tive o privilégio de dividir transmissões no SporTV e Fox Sports com os narradores a quem, agora, também agradeço: Sergio Mauricio, Guto Nejaim, Paulo Stein, Jáder Rocha, Júlio Oliveira, Daniel Pereira, Lucas Pereira, Claudio Uchoa e Eusebio Resende. E agora aos companheiros do Fox Sports, sem nenhuma exceção: Teo José, Flavio Gomes, Felipe Motta, Hamilton Rodrigues, Thiago Alves, João Guilherme e Sergio Lago.

Valeu, gente. A caminhada foi longa. Espero repetir a dose quando completar 20 anos, 25, 30…