A Mil por Hora
Mundial de Endurance

Aula de estratégia dá vitória à Audi em Spa

RIO DE JANEIRO – Quem podia prever que as 6h de Spa-Francorchamps, disputadas neste sábado valendo a 2ª etapa do Mundial de Endurance (WEC), seriam ainda melhores que a corrida de abertura da temporada em Silverstone? Pois além da pista favorecer por ser a mais seletiva de todas, a disputa foi espetacular do início ao […]

Audi-Podium
Mais uma vitória – a 10ª em 26 provas do WEC – para o ‘dream trio’ da Audi formado por Bénoit Tréluyer/Marcel Fässler/Andre Lotterer

RIO DE JANEIRO – Quem podia prever que as 6h de Spa-Francorchamps, disputadas neste sábado valendo a 2ª etapa do Mundial de Endurance (WEC), seriam ainda melhores que a corrida de abertura da temporada em Silverstone? Pois além da pista favorecer por ser a mais seletiva de todas, a disputa foi espetacular do início ao fim. Valeu cada segundo. E não foi à toa que o recorde de distância foi estabelecido – mais de 1.232 km foram percorridos pelos vencedores da prova.

E a exemplo da primeira prova do ano, a Porsche mostrou que tem o carro mais rápido – só que a Audi, além de ter a melhor estratégia de todas, cortesia da engenheira Leena Gade, tem hoje o trio mais coeso de pilotos da LMP1. Não à toa, a formação do carro #7 com Marcel Fässler/Andre Lotterer/Bénoit Tréluyer, chegou ao total de 10 vitórias em 26 provas na história da competição. Um triunfo desenhado desde a quarta hora da disputa, quando Lotterer superou o Porsche #18 então guiado por Marc Lieb, que até então liderava a corrida.

Os Porsche 919 Hybrid são muito rápidos, mas faltam trincas mais consistentes e melhores estratégias de prova

No início da disputa, os 919 Hybrid se impuseram, com Brendon Hartley mantendo a liderança durante o primeiro turno, até o neozelandês cometer um erro e depois o carro enfrentar um problema técnico com Timo Bernhard a bordo. Uma penalização ao #17 tirou-o de esquadro e o #19 do estreante Nico Hülkenberg, em sua primeira prova de Endurance ao lado de Earl Bamber e Nick Tandy, também foi alijado da luta pelas primeiras posições num contato com outro Porsche – só que da LMGTE-PRO. Kévin Estre foi considerado culpado pelo acidente e punido pelos comissários. Um acidente evitável, concordo, mas faltou experiência a Nick Tandy, que guiava o LMP1 e na minha opinião se precipitou na tentativa de ultrapassagem.

Este foi o primeiro – de vários entreveros que aconteceram durante a disputa. Um deles tirou de combate o Corvette C7-R da Larbre Competition, que foi abalroado por um dos Ligier JS P2 Nissan da G-Drive Racing. O carro da LMGTE-AM guiado por Kristian Poulsen bateu numa barreira e ficou tão danificado que foi impossível voltar aos boxes para o conserto. Pela segunda corrida seguida, a equipe de Jack Lecomte não consegue acertar as contas com a má sorte.

Também por conta de um desses contatos imediatos, o Audi #8 do brasileiro Lucas Di Grassi perdeu qualquer chance de brigar por um pódio. Além da substituição da seção dianteira do protótipo, que fez o carro se atrasar na disputa, houve também um problema elétrico e, no finalzinho, uma saída de pista com Oliver Jarvis a bordo, enterrando todas as possibilidades. O 7º lugar foi um resultado absolutamente frustrante para a trinca.

Apanhando de Porsche e principalmente da Audi: mau começo da Toyota ao defender o título do WEC ano passado

Igualmente frustrante foi a corrida da Toyota, absolutamente sem ritmo nenhum para brigar pela vitória. Até que os pilotos – especialmente Alex Wurz e Stéphane Sarrazin, no carro #2 – se esforçaram bastante. Mas não houve possibilidade nenhuma para os japoneses lutarem por pódio: o melhor TS040 Hybrid terminou em 5º lugar, três voltas atrasado. Já os campeões mundiais Sébastien Buemi e Anthony Davidson se atrasaram por uma falha mecânica e não conseguiram nada melhor que a oitava posição.

Enquanto o #17 de Webber/Bernhard/Hartley ainda se recuperou para a conquista de um importante pódio, os números mostram a superioridade da Audi sobre a Porsche nos pit stops, evidenciando uma melhor estratégia e a opção por duplos stints de pneus e pilotos. Enquanto no “DKW” #7 foram perdidos 7min36seg918 em sete paradas, os pits do “Fuscão” #18 – que também foram de sete, ao todo – totalizaram 8min12seg114. Foram 36 segundos a menos nos boxes para a turma de Ingolstadt e 12 de vantagem na pista, ao fim da emocionante disputa.

Registre-se também o bom desempenho do trio do Audi #9, que mesmo correndo com o modelo “standard”, já que os R18 e-tron quattro dos trios de todo o campeonato andaram com o kit “low drag” para Le Mans, com uma nova suspensão inclusive, conquistou um belíssimo quarto posto. Não fosse uma porta esquerda que se soltou, talvez o trio Marco Bonanomi/René Rast/Filipe Albuquerque pudesse chegar um pouco mais longe…

Na LMP2, o Team Jota Sport fez de novo o papel do visitante indesejado. O Gibson 015S Nissan #38 do trio Harry Tincknell/Mitch Evans/Simon Dolan dominou a corrida na segunda divisão dos Protótipos – lideraram 118 voltas e venceram com tranquilidade, chegando em nono na geral e uma volta à frente do segundo colocado. Porém, como este carro disputou as 6h de Spa-Francorchamps como preparação para Le Mans e não tem inscrição fixa ou parcial no WEC, os pontos do primeiro lugar ficaram com a tripulação que chegou em 2º. E essa tripulação tem um brasileiro.

Com o 2º lugar em Spa, Pipo Derani assume a liderança do campeonato entre os pilotos da LMP2. (Foto: Clément Marin/Divulgação)

Pipo Derani e seus parceiros Ricardo González e Gustavo Yacamán fizeram mais um belo trabalho e com o segundo pódio em duas provas, mais o fato da Jota Sport não pontuar na corrida belga – assumem a liderança do campeonato na categoria, com 44 pontos. Realista, ele sabe que a próxima corrida – as 24 Horas de Le Mans – representam o maior desafio de todo o campeonato.

“Estamos felizes, mas temos muito trabalho para fazer, especialmente para Le Mans, onde a gente vai competir também contra outras equipes do Europeu. Queremos sair daquela corrida também na liderança, mas queremos andar bem lá e disputar a vitória também. No geral, foi bom. Ainda temos algumas coisas para melhorar no carro e também em nós três, como um time, mas é óbvio que é algo que vai acontecendo naturalmente no decorrer do ano, vamos nos entendendo melhor e é isso. Agora é manter o foco e trabalhar bastante para as próximas provas”, completou o piloto.

O Team SARD Morand teve também um excelente resultado na prova de estreia da equipe no WEC: 3º lugar com o Morgan EVO SARD guiado por Zoël Amberg/Pierre Ragues/Oliver Webb, numa performance muito consistente do time de Bénoit Morand, que rendeu os 18 pontos do 2º lugar na classe para os helvéticos. A KCMG levou a pontuação relativa ao terceiro lugar, contando com o reforço de Nicolas Lapierre nesta prova. Os vencedores de Silverstone, Julien Canal/Sam Bird/Roman Rusinov, tiveram problemas: o motor quebrou no meio da disputa e, mesmo com o carro muito lento e soltando muita fumaça, a trinca do #26 voltou à pista para completar o número mínimo de voltas com direito a pontos e salvar alguma coisa pensando no campeonato – que é longo.

Performance competitiva do início ao fim e primeira vitória para Fernando Rees e seus parceiros Alex MacDowall e Richie Stanaway no FIA WEC, na classe LMGTE-PRO (Foto: John Rourke/AdrenalMedia.com)

Pipo Derani não foi o único brasileiro a sorrir em Spa: Fernando Rees e seus parceiros Alex MacDowall e Richie Stanaway realizaram uma grande corrida a bordo do Aston Martin Vantage #99, com um ritmo de corrida muito bom. Não à toa, lideraram 131 voltas ao todo. E o único carro que podia incomodar – a Ferrari #51 da AF Corse guiada por Toni Vilander/Gimmi Bruni – foi penalizado por uma infração no último pit stop. A Aston Martin, que nada tinha a ver com isso, estava no lugar certo e na hora certa e venceu a corrida. É a primeira vitória de Rees, de 30 anos de idade, após sua 19ª corrida no WEC – e também dos parceiros MacDowall e Stanaway.

“Sabíamos que em termos de velocidade, a Ferrari estaria mais forte porque para evitar um splash and go no final, tínhamos que economizar combustível a corrida inteira!”, disse o piloto. “Eles (a AF Corse) não precisariam disso e então tivemos que aproveitar cada oportunidade para abrir distância – e deu certo. Entreguei o carro com 26 segundos de vantagem e depois o Richie ampliou para 30 segundos. Isso com 4h de prova. O Alex fez um stint de 50 minutos, mas perdeu tudo para o Bruni, que voava na pista”, prosseguiu.

“Então, na hora final me colocaram de novo para combater o Vilander. Mas a Ferrari viu que eu entrei no carro e aí decidiu manter o Bruni, porque ele era mais rápido. Seria uma briga boa nos últimos minutos, mas felizmente sob pressão a AF Corse errou e aí facilitou nossa vida”, conclui Rees.

Este foi o primeiro pódio em muitas corridas do Mundial de Endurance sem nenhuma dupla da AF Corse entre os três primeiros, pois os Porsche 991 RSR (apesar de várias punições por infringir o limite da pista e/ou por causar colisões, caso do #91) tiveram um ótimo ritmo de corrida, o que levou Richard Lietz/Fred Makowiecki ao 2º lugar e os estreantes Sven Müller/Kévin Estre abiscoitaram o terceiro posto – o que não deixa de ser importante para a Porsche na luta pelo título dos construtores.

Bruni/Vilander acabaram em 4º lugar, resultado que ainda os deixa na liderança do Mundial de Pilotos de Grã-Turismo com 37 pontos, um à frente de Lietz. A vitória deixa Rees/MacDowall/Stanaway em 3º no campeonato, a três pontos dos líderes.

Mais uma vitória para Paul Dalla Lana/Pedro Lamy/Mathias Lauda na LMGTE-AM (Foto: Nick Dungan/AdrenalMedia.com)

Na LMGTE-AM, a trinca formada por Paul Dalla Lana/Mathias Lauda/Pedro Lamy foi absoluta ao liderar 111 voltas na prova, embora tenha sido amplamente beneficiada pelo acidente que tirou da corrida o Corvette da Larbre, que vinha na liderança no momento da colisão com o Ligier da G-Drive. O Aston Martin #98 venceu com absoluta tranquilidade, mais de 1min45seg à frente da Ferrari #83 de Rui Águas/Manu Collard/François Perrodo. A SMP Racing faturou a terceira posição, numa boa performance do trio formado por Aleksej Basov/Andrea Bertolini/Viktor Shaitar.

Com mais uma vitória, a segunda no campeonato, a trinca do #98 lidera o campeonato com pontuação máxima, 16 pontos à frente de Águas/Perrodo/Collard. Basov/Bertolini/Shaitar também estão em 3º no Mundial da classe LMGTE-AM, somando 30 pontos.

Agora é começar a contagem regressiva para a corrida mais aguardada do ano: a edição 2015 das 24 Horas de Le Mans, com direito à estreia do Nissan GT-R LM Nismo e a volta da Rebellion Racing . Se já tivemos duas provas espetaculares, prevejo outra igualmente sensacional.

Quem viver, verá. É pena que existam analfabetos funcionais que não enxergam o potencial do WEC. Um campeonato que, em três anos, aumentou seu público em Spa de 35 mil para 54 mil espectadores, e que deverá levar 250 mil pessoas a Sarthe, ainda é chamado por uma minoria de “porcaria”. Azar da minoria. O blog continuará dedicando muito espaço a Endurance.

Não gostou? Só lamento.