A Mil por Hora
Fórmula Indy

Não acredito

RIO DE JANEIRO – Quando nasci, Deus me deu crachá de carioca. Sei que não sou o moreno-surfista-bronzeado, mas nasci aqui e como tal, sei das dores e das delícias de ser carioca. Hoje, é muito mais doído do que delicioso ter nascido nesta cidade. Vamos em frente: este nariz de cera é pra dizer que […]

2018118102273_image_O
Esta é a reprodução do que poderia vir a ser uma suposta pista para a disputa de uma prova de Fórmula Indy no Rio de Janeiro, aproveitando a estrutura do Sambódromo. Eu não acredito que seja possível e vou explicar neste post

RIO DE JANEIRO – Quando nasci, Deus me deu crachá de carioca. Sei que não sou o moreno-surfista-bronzeado, mas nasci aqui e como tal, sei das dores e das delícias de ser carioca. Hoje, é muito mais doído do que delicioso ter nascido nesta cidade.

Vamos em frente: este nariz de cera é pra dizer que eu tenho suficiente PhD em Rio de Janeiro para não me deixar levar pelo papo de que a cidade e o país vão receber de volta a Fórmula Indy em 2020.

Liguem os pontos: 2020 é ano eleitoral. Marcelo Crivella, que faz gestão pavorosa como alcaide da outrora Cidade Maravilhosa, a ponto de fazer o escriba aqui engolir o ódio ao Eduardo Paes e votar nele em 2º turno contra o soturno Wilson Witzel, na disputa de governador do estado, já anunciou que concorre à reeleição. Ele quer ficar de bem com alguém de qualquer jeito – já que sua popularidade é próxima de zero e a maioria o detesta – e, num município e estado sem automobilismo e sem autódromo, quer engambelar a turma da velocidade com um pretenso projeto de pista.

Essa pista aproveitaria a já existente estrutura da Marquês de Sapucaí, como se vê na reprodução acima. O problema não é só esse. É a área pela qual a pista passaria. E que já não é muito suficiente para o próprio Carnaval: vou ao desfile do Grupo de Acesso desde 2013 e a cada ano que vejo é um puxadinho a mais que o outro ali na estrutura sonhada e concebida por Oscar Niemeyer por encomenda de Leonel Brizola e Darcy Ribeiro nos anos 1980.

Uma viagem no tempo: em 1938, na esteira do bota-abaixo do prefeito Pereira Passos, que conferiu no início do século passado uma nova cara ao Rio de Janeiro, o Estado Novo de Getúlio Vargas construiu a necessária via de ligação entre o Centro da Cidade e a Zona Norte. Em tempo recorde – três anos – mais de mil imóveis foram demolidos. A Praça Onze, como se conhecia, deixou de existir. Era por lá que aconteciam as grandes batalhas de confete e os embates de agremiações carnavalescas como os Fenianos e os Tenentes do Diabo.

Portanto, a Presidente Vargas existe desde 1941. E como sói, a via não seguiu a modernização necessária do Rio de Janeiro ao longo dos últimos anos. Se era larga na época em que foi idealizada e finalizada, hoje não atende à demanda de tráfego diário.

Além de tudo, a paisagem da via até a região do Sambódromo é sombria. Feia de doer. Só vai melhorar depois da Central do Brasil e do prédio onde era o Ministério da Guerra, com os inúmeros edifícios construídos até a altura da Igreja da Candelária.

Não dá pra imaginar um moderno Dallara de Fórmula Indy riscando o péssimo asfalto da capital fluminense e contornando uma curva tendo de fundo o “Balança Mas Não Cai”, a mais famosa cabeça de porco do Rio de Janeiro. Como não dá pra conceber uma prova de automobilismo passando por ruelas do entorno do Sambódromo e tendo por perto os morros da Mineira, Providência, Turano e da Coroa, conhecidos pontos de conflito entre traficantes e policiais da cidade.

Então, meus caros… de boa intenção o inferno está cheio. É sempre bom desconfiar de políticos, ainda mais de Marcelo Crivella. Não acharia ruim a Fórmula Indy voltar ao Brasil e ao Rio de Janeiro, mas desde que houvesse viabilidade financeira e condições de se realizar um evento esportivo com dignidade. A própria IndyCar não aprendeu com a prefeitura de São Paulo e com a experiência no Anhembi? Pelo visto não…

E vai aqui a estocada final: se é pra se fazer corrida no Rio de Janeiro, que seja num autódromo de verdade – que existia até não faz muito tempo e depois os senhores Nuzman, Paes e Maia fizeram questão de destruir.

Mas nisso, ninguém fala… nem mesmo o sr. Crivella, não é mesmo?