A Fórmula 1, porém, trazia um argumento convincente para que o campeonato não fosse paralisado. O consumo de gasolina nas ruas era amplamente superior ao de um autódromo e assim a FIA dobrou a opinião pública, mantendo o calendário e programando o GP da África do Sul para 30 de março. Não bastasse a crise petrolífera, a 3ª etapa ocorreria num país que também sofria com o boicote na ONU por conta das questões raciais.
Na pista, muitas novidades: o Hesketh 308, projeto de Harvey Postlethwaite, finalmente faria sua estreia com James Hunt, livre enfim do March 731. Também o BRM P201, concebido por Mike Pilbeam, teria sua primeira aparição no circuito de Kyalami, substituindo o vetusto P160 – aposentado após dois anos de uso. Mas a grande revolução partia, mais uma vez, da Lotus.
Colin Chapman levou para o GP da África do Sul o modelo 76 para suceder o 72, que tinha quatro temporadas e muitas vitórias nas pistas. O carro era inovador: dois aerofólios traseiros e quatro pedais, um deles para o acionamento de um complexo sistema eletrônico de embreagem – pai dos conjuntos de transmissão semiautomática que invadiriam as pistas nos anos 80 e 90.
Entre os pilotos, a Iso-Marlboro finalmente inscrevia um segundo carro, com o dinamarquês Tom Belso e a March, com Howden Ganley fora, promoveu um estreante de 35 anos, oriundo da F2: o italiano Vittorio Brambilla, com o patrocínio das Ferramentas Beta. A escuderia Embassy inscreveu um único Lola T370 para Graham Hill. O contingente sul-africano era composto por quatro pilotos de três equipes diferentes: o Team Gunston, com modelos Lotus 72 para Paddy Driver e Ian Scheckter; a Blignaut Embassy Racing com Eddie Keizan a bordo de um velho Tyrrell 004 e, por fim, a Scuderia Scribante com Dave Charlton e um McLaren M23.
Uma semana antes dos treinos propriamente ditos, a pista foi aberta para sessões não-oficiais e mais uma vez a tragédia se fez presente na F1: o estadunidense Peter Revson, de 35 anos, sofreu um acidente fatal com seu Shadow DN3 Cosworth, após uma quebra de suspensão na curva Barbecue. O time dos carros de cor escura decidiu, em luto pela morte do herdeiro da Revlon, empresa de cosméticos, não competir em Kyalami.
Animado com a vitória no GP do Brasil, Emerson Fittipaldi, vice-líder do campeonato com 9 pontos, surpreendeu-se com a dinâmica dos treinos classificatórios que definiram o grid. A pole position do austríaco Niki Lauda, com uma veloz Ferrari 312 B3, era mais ou menos previsível. Surpresa mesmo foi o 2º lugar de José Carlos Pace com o Surtees TS16 e a terceira posição de Arturo Merzario com o Iso-Marlboro, mesmo com um motor que atingia o limite de giro na casa de 10.200 RPM.
Emerson ficou com o quinto tempo, a 0″24 da pole de Lauda, o que não deixou de ser positivo, pois Denny Hulme qualificou-se em nono com o #6 e Mike Hailwood, que salvara Clay Regazzoni da morte no ano anterior, em 12º num grid de 27 pilotos. Os dois Lotus 76 foram mal: décimo tempo para Jacky Ickx e décimo-sexto para Ronnie Peterson.
Baixada a bandeira, o motor do Surtees de Pace não rendeu como o esperado e o brasileiro foi engolido por vários adversários antes da curva Crowthorne, a primeira do circuito. Exatamente ali, um enrosco entre vários carros tirou de combate justamente as duas Lotus 76 de Ickx e Peterson, o outro Surtees com Jochen Mass e a BRM P201 de Henri Pescarolo. Lauda passou a primeira volta liderando, enquanto Carlos Reutemann passava de quarto para segundo e Clay Regazzoni de sexto para terceiro. Outro que começou bem foi Jody Scheckter, assumindo o quarto lugar. Emerson caiu para 6º e Moco despencou para décimo-primeiro.
Lauda liderou até a nona volta, pois na 10ª, com um Brabham muito bem acertado, Carlos Reutemann superou o austríaco e pegou a ponta em Kyalami. Pouco tempo depois, Hunt abandonava com a transmissão do Hesketh quebrada, oferecendo a Emerson o quinto lugar e a Mike Hailwood a sexta colocação.
Enquanto teve fôlego, o brasileiro da McLaren andou bem. Superou Scheckter, que perderia muito terreno em razão do crônico desgaste de pneus da Tyrrell 006 com sua suspensão de barras de torção – e chegou ao 4º lugar. Na segunda metade do total de 78 voltas previstas, o carro #5 começou a perder rendimento e Fittipaldi acabou superado por Mike Hailwood, na McLaren pintada com as cores da Yardley. E não foi só isso: até Jean-Pierre Beltoise, com a nova BRM P201 apresentando um desempenho acima do esperado com os pneus Firestone, também conseguiu a ultrapassagem, relegando Emerson ao 6º lugar.
Com o carro cada vez pior, Emerson perdeu posições para a Tyrrell de Patrick Depailler e o March do novato Hans-Joachim Stuck. Nesta altura, quando o pódio parecia definido, uma boa notícia: Regazzoni, 3º colocado e líder do campeonato, desistiu com queda de pressão de óleo no motor de sua Ferrari.
Mas ainda haveria mais, porque a outra Ferrari, com Niki Lauda a bordo, sofreu uma pane na ignição e o austríaco precisou deixar a disputa. Isto propiciou um dos mais surpreendentes pódios da F1 naquela década, pois Jean-Pierre Beltoise ascendeu ao segundo posto no novo BRM P201 e Mike Hailwood deu a volta por cima após as queimaduras sofridas em 73 para chegar em 3º com a McLaren #33.
Patrick Depailler fez ótima prova com o Tyrrell 006 e chegou em quarto. Hans-Joachim Stuck fez os dois primeiros pontos da carreira com seu March e Arturo Merzario, mesmo com o motor rendendo pouco, ainda salvou o último ponto do GP da África do Sul em que Emerson acabou fora dos pontos e José Carlos Pace, de segundo do grid, acabou num frustrante décimo-primeiro.
Carlos Reutemann venceu pela primeira vez na F1 dois anos após sua estreia na categoria, tornando-se o primeiro argentino a ganhar na África do Sul e o primeiro piloto do país a vencer uma corrida desde 1957, quando ainda corria o mito Juan Manuel Fangio. A disputa pela liderança do campeonato ganhava ali mais um forte concorrente.
O resultado final:
1º Carlos Reutemann (Brabham), 78 voltas em 1h42min40seg96, média de 187,049 km/h
2º Jean-Pierre Beltoise (BRM), a 33seg94
3º Mike Hailwood (McLaren), a 42seg16
4º Patrick Depailler (Tyrrell), a 44seg19
5º Hans-Joachim Stuck (March), a 46seg23
6º Arturo Merzario (Iso-Marlboro), a 56seg04
7º Emerson Fittipaldi (McLaren), a 1min08seg39
8º Jody Scheckter (Tyrrell), a 1min10seg54
9º Denny Hulme (McLaren), a uma volta
10º Vittorio Brambilla (March), a uma volta
11º José Carlos Pace (Surtees), a uma volta
12º Graham Hill (Embassy-Lola), a uma volta
13º Ian Scheckter (Lotus), a duas voltas
14º Eddie Keizan (Tyrrell), a duas voltas
15º François Migault (BRM), a três voltas
16º Niki Lauda (Ferrari), a quatro voltas (ignição)
17º Richard Robarts (Brabham), a quatro voltas
18º Henri Pescarolo (BRM), a seis voltas
19º Dave Charlton (McLaren), a sete voltas
Não completaram:
20º Clay Regazzoni (Ferrari), 65 voltas (pressão de óleo)
21º John Watson (Brabham), 54 voltas (tubulação de combustível)
22º Jacky Ickx (Lotus), 31 voltas (freios)
23º James Hunt (Hesketh), 13 voltas (transmissão)
24º Jochen Mass (Surtees), 11 voltas (suspensão)
25º Paddy Driver (Lotus), 6 voltas (embreagem)
26º Ronnie Peterson (Lotus), 2 voltas (direção)
27º Tom Belso (Iso-Marlboro), não completou a primeira volta (embreagem)
Melhor volta: Carlos Reutemann, na 58ª – 1’18″16, média de 189,028 km/h