A Mil por Hora
Fórmula 1

O mentiroso

RIO DE JANEIRO – Em 1997, o ator e comediante Jim Carrey estrelou o filme “O mentiroso”. O canadense deu vida à personagem Fletcher Reede, um advogado que era um mentiroso compulsivo e que, depois de um caso de adultério, aceita a defesa de uma mulher que perderia todos os direitos no acordo pré-nupcial se […]

RIO DE JANEIRO – Em 1997, o ator e comediante Jim Carrey estrelou o filme “O mentiroso”. O canadense deu vida à personagem Fletcher Reede, um advogado que era um mentiroso compulsivo e que, depois de um caso de adultério, aceita a defesa de uma mulher que perderia todos os direitos no acordo pré-nupcial se fosse provada sua culpa. Subitamente, ele se torna incapaz de mentir e as situações que se seguem na película são hilárias.

Mas o que vou comentar agora no blog não tem nada de engraçado. É coisa muito séria.

Vinte e dois anos depois, uma continuação em cores vivas de “O mentiroso” insiste em eclodir pelos lados da Terra de Vera Cruz.

Jair Bolsonaro, que de Messias só tem o sobrenome mesmo, não nos poupa e nos salva de suas mentiras.

Sobre Fórmula 1, foram duas. A primeira, do Autódromo do Rio de Janeiro em Deodoro e do GP do Brasil. A segunda, recém-conhecida, foi sobre o contrato entre McLaren e Petrobras.

Segundo o chefe da nação, em sua conta de Twitter, da qual parece governar o país como se ainda estivesse na campanha presidencial, o valor do acordo entre a empresa e a equipe britânica seria de R$ 782 milhões. Para justificar uma possível rescisão do acordo, ele chutou um número absurdo. Mais uma cortina de fumaça, para seu gado ou seus minions acreditarem no que escreve.

Só que Bolsonaro mente. Deslavada e novamente.

Porque o contrato, que ao contrário do que o próprio diz, é por seis anos e não cinco. E o valor é muito menor que o divulgado por ele em sua conta de twitter, especialista em disseminar Fake News.

Os termos do contrato prevêm um pagamento de £ 10 milhões (R$ 51 milhões) por ano. São £ 60 milhões no total, equivalentes a R$ 312 milhões e, portanto, menos da metade do valor estapafúrdio que Bolsonaro afirma ser o do acordo entre as partes.

Com R$ 782 milhões, a Petrobras estamparia seu nome na carenagem de QUALQUER carro da Fórmula 1. E só para vocês terem uma ideia, a Petronas, que há anos é parceira técnica da Mercedes-Benz, tem um contrato cujo valor não é tão maior que o da Petrobras com a McLaren. Só que, evidentemente, o retorno de mídia que a petroleira da Malásia tem com a equipe alemã é monstruoso.

E é isso que as pessoas não querem parecer entender agora. Gozado que quando a Petrobras esteve – duas vezes – nos carros da Williams e patrocinou uma equipe de Fórmula 3000 com pilotos do país – ninguém falou um “a”, nenhuma vírgula foi publicada, nenhuma crítica.

Eram outros tempos, talvez. Hoje, a ignorância faz com que as pessoas não se deem ao trabalho de raciocinar e muito menos questionar.

Um dos grandes absurdos foi a atitude dos pilotos brasileiros da Fórmula E, Lucas Di Grassi e Felipe Massa. O primeiro mostrou toda a sua ‘indignação’ com o suposto valor extrapolado por Bolsonaro e o comentário de Massa, que retuitou o colega de profissão e adversário na categoria de carros elétricos foi um “Mamma Mia”.

“Mamma Mia” digo eu. LDG fala em “função cívica” achar o que está errado no acordo entre a Petrobras e a McLaren.

Função cívica, respondo eu, é a da imprensa, de apurar os fatos e mostrar que o presidente mente. E ao contrário do que ele pensa, do alto de sua suposta inteligência, o governo e o estado NÃO negociaram este patrocínio.

A Petrobras é uma empresa mista, de capital aberto e cuja qual podem ser compradas ações na Bolsa de Valores. Eu não entendo de negócios. Muito menos o piloto da Fórmula E, que deve desconhecer completamente tais fatos. Porém, eu sei do compromisso que tenho com os leitores em trazer os fatos e as verdades como elas realmente têm que ser expostas, sem ser baba-ovo de ninguém.

Um outro fato é que inclusive o Lucas tentou arrumar patrocínio da Petrobras pra se manter na Fórmula 1. Apuração do Grande Prêmio inclusive.

E outro fato é que Massa, no tempo em que a Petrobras esteve com os stickers em seu carro e voltou a parceria com a Williams, jamais abriu a boca para fazer qualquer tipo de crítica, ao contrário de hoje, quando retuita o colega.

Para a pilotada, qualquer verba de empresa brasileira deveria ser apenas direcionada aos daqui. E quando a Petrobras começou sua aliança lá pelos anos 1990 – isso pouca gente sabe – havia um discreto sticker da petroleira no protótipo BMW (que tinha engenharia da Williams) vencedor das 24 Horas de Le Mans com Pier Luigi Martini/Yannick Dalmas/Joachim Winkelhock – um alemão, um francês e um italiano.

Pois é, né…

Vamos parar com hipocrisias. A parceria é tecnológica. É positiva para a imagem da Petrobras, mas há quem ache que nada do que foi feito no passado pode ser repetido no futuro. Essa onda revanchista que tomou conta do Brasil é altamente nociva para a imagem do próprio país. Mas parece que o presidente Jair Bolsonaro está cagando e andando pra tudo isso.

Não pode e não deve ser assim.

Um chefe de estado tem que ter responsabilidades.

Não pode tomar atitudes como as que toma, não pode causar desconforto, não pode humilhar a própria população do país que o elegeu, não pode se comportar como um idiota que nem sabe o gentílico de quem vive em Nova York, não pode lamber botas dos EUA e posar de capachão de Donald Trump, não pode posar de honesto a vida inteira e ver, em cinco meses, todo o seu discurso de político rastaquera do baixo clero, por 28 anos, destruído pela própria inépcia e – principalmente – pela incapacidade em pôr um freio nos próprios filhos – mimados, arrogantes e tão despreparados quanto o próprio pai.

Talkey?

PS.: ah! E antes que eu me esqueça: para rasgar o compromisso com a McLaren, terá de ser paga uma multa – por sinal, muito maior do que o saldo restante do contrato.