A Mil por Hora
Fórmula 1

Bodas de prata

RIO DE JANEIRO – Para muitos torcedores brasileiros, a Fórmula 1 nunca mais seria a mesma a partir do dia 30 de outubro de 1988. Naquela data, há 25 anos, Ayrton Senna vencia a luta interna contra Alain Prost na McLaren, que tinha o carro dominante daquela temporada, para se consagrar pela primeira vez campeão […]

senna1988_04042011

RIO DE JANEIRO – Para muitos torcedores brasileiros, a Fórmula 1 nunca mais seria a mesma a partir do dia 30 de outubro de 1988. Naquela data, há 25 anos, Ayrton Senna vencia a luta interna contra Alain Prost na McLaren, que tinha o carro dominante daquela temporada, para se consagrar pela primeira vez campeão mundial da categoria máxima do automobilismo.

A temporada foi um mano-a-mano como poucas vezes pudemos presenciar, onde eles e só eles tiveram chance real de ser campeões. Era o último ano dos carros com motores turbocomprimidos, que competiam com enorme restrição de consumo, podendo gastar apenas 150 litros de combustível. E mesmo assim, o desempenho de Senna e de seu companheiro de equipe foi muito acima de todas as outras escuderias.

O domínio dos McLaren-Honda foi tão latente que, somando os pontos das demais equipes, quase que o time chefiado por Ron Dennis fez o total de todas as outras, que deu 201 pontos. A campeã de Construtores fez 199, com quinze vitórias em dezesseis corridas. Só não venceu todas porque o motor do carro de Prost quebrou em Monza e Senna atrapalhou-se com Jean-Louis Schlesser, ofertando a vitória em dobradinha à Ferrari, com Gerhard Berger em primeiro e Michele Alboreto em segundo.

Foi um campeonato com grandes momentos de ambos, Senna e Prost. Ayrton começou de uma forma frustrante em Jacarepaguá, ganhando bandeira preta após largar com o carro reserva após uma quebra do titular, o que não era permitido pela regra. Prost venceu e fez 1 x 0 em cima do brasileiro, que deu o troco em San Marino, empatando a “peleja”.

Veio Mônaco e a famosa corrida onde Ayrton desconcentrou-se e bateu sozinho. O brasileiro foi até chamado de “barbeiro” por um jornal paulista, mas não se incomodou com o epíteto e foi à luta. Segundo no México, derrotou Prost no Canadá e em Detroit, em grande estilo. Em vitórias, estava 3 x 3.

No GP da França, Prost estava inspirado e veloz como poucas vezes víamos o francês naqueles tempos. Tido como um piloto ‘cerebral’ e com o apelido de Le Professeur, Alain raramente se arriscava. Mas diante de sua torcida, em Paul Ricard, ele tinha que derrotar Senna e abrir vantagem no Mundial de Pilotos. Àquela altura, com sete etapas, estava 54 a 39 para o francês.

Só que veio uma corrida com chuva logo na sequência. E pista molhada nunca foi a especialidade de Prost, que no GP da Inglaterra foi humilhado a ponto de levar uma volta inteira de Senna, que venceu e descontou a diferença. Choveria de novo na Alemanha, em meio à floresta de Hockenheim, mas um campeonato estava em jogo, Prost foi obrigado a deixar a cautela para escanteio e chegou em segundo, novamente atrás de um inspirado Senna – que venceria também em Hungaroring e Spa-Francorchamps, desconcertando Prost.

“Parabéns, campeão”, disse o piloto para seu companheiro de equipe, líder naquele momento por três pontos de vantagem – 75 a 72.

A frase não passava de uma das muitas manobras ardilosas de Prost, que transitava com muita desenvoltura nos bastidores. Fora das pistas, o francês fazia articulações, choramingava, chiava, tudo para desviar a atenção da mídia a Senna, que caminhava célere para o título.

Então veio Monza, a única corrida onde os dois não marcaram pontos juntos e uma sequência nada feliz para Ayrton, com direito a um 6º lugar em Portugal após uma disputa nada amistosa entre ambos no fim da primeira volta, onde Senna quase jogou Prost no muro e o quarto posto em Jerez de la Frontera. Prost, matreiro, venceu ambas.

Mas havia ainda um componente que poderia virar o jogo em favor de Ayrton: o descarte dos cinco piores resultados, obrigatório naqueles tempos. Para efeito de pontuação, só valiam onze corridas e Prost, com 90 pontos somados, tinha que descartar seis e estava com 84 válidos. Senna tinha 79 pontos líquidos e só iria descartar os resultados de Portugal e Espanha após as duas corridas finais no Japão e Austrália.

Foi um fim de semana de tensa expectativa. Na qualificação, Ayrton marcou mais uma pole em 1’41″853, com Prost em segundo, tendo marcado 1’42″177. Os dois largariam à frente do pelotão de 26 carros num domingo nublado no circuito de Suzuka para a decisão de um campeonato extraordinário para ambos.

O câmbio do carro de Senna teimou em não colaborar quando o brasileiro quis engatar a primeira marcha e arrancar à frente de Prost. Com o problema e a hesitação de Ayrton, o piloto foi engolido por metade do grid e ele chegou a cair para 16º. Mas na primeira volta, fez uma série de ultrapassagens e já estava em oitavo. Em mais 20 passagens, Senna tinha deixado cinco adversários para trás, ganhando a 2ª posição com a quebra de motor do March Judd de Ivan Capelli que – suprema audácia – chegou a liderar a corrida ultrapassando Prost.

Foi um momento crucial da corrida, pois o francês claramente reduziu o ritmo em decorrência de uma chuva fininha que caía no circuito e podia pôr tudo a perder. Prost foi cauteloso como sempre e Senna arriscou tudo para se aproximar do rival e companheiro de equipe. E deu tudo certo.

No início da 28ª volta, o brasileiro vislumbrou a possibilidade de superar Prost e deixá-lo para trás. Com a presença de dois retardatários à sua frente, o francês hesitou, como de hábito, e não dobrou os carros mais lentos. Senna aproveitou a brecha e passou onde dava, assumindo a liderança sem perdê-la até o fim da 51ª passagem. O brasileiro relegou Prost a 13″363 de distância na quadriculada e comemorou de forma emocionada e intensa o seu primeiro título mundial de Fórmula 1.

Mais relaxado, Senna foi derrotado por Prost em Adelaide na última corrida do ano, que contou com Nelson Piquet de coadjuvante no pódio. Com oito triunfos contra sete de Alain, Ayrton Senna da Silva, aos 28 anos, entrava para o rol dos grandes campeões da história do automobilismo. Pena que a parceria e o respeito que parecia existir entre os dois rivais e companheiros de equipe deitaria por terra em 1989 e mudaria os rumos da Fórmula 1 naqueles tempos.