RIO DE JANEIRO – Luto entre os irmãos portugueses fãs do automobilismo, o desporto motorizado, como eles o chamam: Mário “Nicha” Cabral, o primeiro piloto daquele país a disputar uma corrida de Fórmula 1, morreu nesta segunda-feira em Lisboa aos 86 anos, após longa enfermidade.
Em caráter oficial, o piloto nascido em Cedofeita, na região do Porto, no dia 15 de janeiro de 1934, foi inscrito em cinco GPs da categoria máxima do automobilismo, tendo disputado quatro. O melhor resultado foi logo na prova de estreia: 10º lugar no circuito de Monsanto, tendo completado 56 voltas – seis a menos que o vencedor da oportunidade, Stirling Moss – de quem ganharia elogios na ocasião. “Nicha” guiou um Cooper Maserati da Scuderia Centro Sud, um dos muitos times não-oficiais da época.
No ano seguinte, Mário voltou a disputar o GP de Portugal pela mesma equipe e com o mesmo pacote técnico. Largou em 15º e era sétimo colocado quando foi traído pela caixa de marchas. Depois das aparições nas pistas de Monsanto e do Porto, “Nicha” voltaria a uma corrida oficial somente em 1963: 20º no grid de largada em Nürburgring, já era décimo colocado no GP da Alemanha quando novamente teve problemas de câmbio – desta vez com um Cooper Climax. Com este mesmo equipamento, o português não se classificou para o GP da Itália, onde tinha tempo melhor que Giancarlo Baghetti – que por ser vencedor de corridas anteriores na Fórmula 1 tinha a chamada “qualificação de ofício”.
Ironicamente, Cabral alinhou para sua última prova de F1 com o mesmo carro que Baghetti usara na temporada de 1963, porém com outro nome. O A-T-S 100 virou Derrington Francis graças a uma atualização de construção que incluiu um câmbio Colotti de cinco marchas e pneus Goodyear. Largou da 19ª posição e desistiu na vigésima-quarta volta, em decorrência de uma falha de ignição.
Um grave acidente sofrido em 1965 numa prova de Fórmula 2 disputada no circuito francês de Rouen les Essarts quase lhe custou a carreira e a vida. Sobreviveu a quase 20 fraturas no corpo para voltar aos cockpits – porém em Carros Esporte e Grã-Turismo, permanecendo na ativa até 1977, quando conquistou a última vitória da carreira numa prova de monopostos disputada em Benguela, cidade de Angola.
“Nicha” Cabral era um emérito contador de histórias, um grande papo, segundo os conterrâneos dele e amigo, ora vejam, de Sacha Distel e de ninguém menos que Paul Newman. Foi também diretor da escola de Fórmula Ford em Portugal, que revelou dezenas de talentos portugueses para os cockpits. Um deles, Ni Amorim, tornou-se inclusive presidente da Federação de Automobilismo e Kart de Portugal. Hoje, o dirigente, outrora piloto, lamentou a morte do pioneiro luso na F1.
“Foi um ícone do automobilismo português e internacional”, destaca Amorim. “É com muita consternação que vejo partir uma pessoa que conheci muito bem”, disse.
Pedro Lamy, que pelas estatísticas foi o primeiro português a se classificar para um GP após “Nicha” Cabral – Pedro Matos Chaves não alcançou o objetivo em 1991 – se disse ‘triste’ pela morte daquele que considerava um grande amigo.
“Agora temos de recordar os bons momentos dele. Perdemos o nosso primeiro piloto de Fórmula 1.”