A Mil por Hora
Fórmula 1

Y dale Lole…

RIO DE JANEIRO – Tristeza imensa para nossos vizinhos da Argentina, para o automobilismo mundial e, principalmente para a Fórmula 1: morreu nesta quarta-feira o antigo piloto Carlos Reutemann. Com pesar, uma de suas filhas, Cora, confirmou a infausta notícia. https://twitter.com/CoraReutemann/status/1412817852839628801 Carlos foi um dos grandes da história do automobilismo que jamais teve a glória […]

Em Jacarepaguá, venceu o primeiro GP do Brasil disputado no Rio de Janeiro, com a Ferrari 312 T2

RIO DE JANEIRO – Tristeza imensa para nossos vizinhos da Argentina, para o automobilismo mundial e, principalmente para a Fórmula 1: morreu nesta quarta-feira o antigo piloto Carlos Reutemann. Com pesar, uma de suas filhas, Cora, confirmou a infausta notícia.

https://twitter.com/CoraReutemann/status/1412817852839628801

Carlos foi um dos grandes da história do automobilismo que jamais teve a glória de um campeonato do mundo de pilotos. Lutou muito para isso. Foi um ‘carne de pescoço’ para a maioria de seus rivais. Em 146 corridas que disputou, ganhou 12 delas. Fez seis pole positions, seis recordes de volta em prova e subiu ao pódio 45 vezes.

“Meu referencial era o Carlos. Toda vez que eu chegava numa pista, queria saber que tempos estava marcando. Ele era meu indicador”, contou uma vez Emerson Fittipaldi, bicampeão mundial de F1 e da Indy 500, em um livro autobiográfico.

Wilsinho Fittipaldi, que conviveu com Reutemann na Brabham, tinha outra opinião sobre o rival e colega de equipe. O Tigrão achava que ele tinha uma personalidade “estranha”. E de fato Reutemann era um piloto de altos e baixos. Nos seus dias, era simplesmente irresistível, imbatível. Noutras, fazia corridas absolutamente medíocres.

Sua trajetória no esporte começou no automobilismo doméstico de seu país, mas em 1970, com o generoso aporte da Yacimientos Petroliferos Fiscales (YPF), sem contar a propaganda que fazia para o mercado exportador de carnes, Reutemann chegou à Fórmula 2. Na antessala da categoria máxima, disputou três temporadas, 28 corridas e foi o vice-campeão europeu de 1971, atrás do sueco Ronnie Peterson.

Antes disso ele já estreara com um McLaren na categoria máxima: Carlos foi um dos participantes da corrida de 1971 em Buenos Aires que homologou a pista da capital para receber novamente a Fórmula 1. Quando estreou com o Brabham “Lobster Claw”, o BT34, fez pole logo na primeira corrida e venceu – extracampeonato – o primeiro GP do Brasil em Interlagos.

A simbiose entre Reutemann e Brabham foi razoavelmente boa – até 1975. Naquele ano, ele foi 3º colocado do campeonato, atrás apenas de Fittipaldi e do campeão Niki Lauda. Porém, no ano seguinte, a Brabham assinou com a Alfa Romeo para o fornecimento de motores e, enquanto o parceiro José Carlos Pace se matava na pista em muitos testes com a BT45 de motor 12 cilindros opostos, “Lole” parecia desinteressado. Na maioria das vezes, ia jogar golfe. E forçou sua saída, assinando com a Ferrari – o grande problema é que Niki Lauda era um de seus desafetos. Não se sabe por qual razão, mas o austríaco detestava o argentino.

“Lole” e Lauda só conviveram uma temporada inteira até que o então bicampeão foi para a Brabham. Pela Ferrari, Reutemann conquistou cinco vitórias, 13 pódios e foi 3º colocado do Mundial de Pilotos outra vez, em 1978 – atrás somente da dupla da Lotus, Ronnie Peterson e  o campeão Mario Andretti.

E quando o “Sueco Voador” morreu no GP da Itália, foi a Reutemann (primeiro Jean-Pierre Jarier, bem entendido) que a Lotus recorreu. Piloto e equipe assinaram um contrato de duração longa, mas o compromisso foi rompido ao fim do primeiro ano, onde o argentino fez uma ótima primeira metade de campeonato com quatro pódios, mas a falta de competitividade do Lotus 79 e também do modelo 80 – que jamais pilotou – pesou naquele campeonato.

Carlos assinou com a Williams. E encontrou não só um obstáculo – Alan Jones – mas vários outros, entre eles Nelson Piquet, Jacques Laffite, Didier Pironi e diversos outros adversários com bons carros, dependendo da ocasião. Em 1980, com vitória no GP de Mônaco e oito pódios, estabelceu seu 3º lugar no Mundial pela terceira vez. Mas, perto de completar 40 anos, ele decidiu peitar a hierarquia da equipe que defendia.

Em 29 de março de 1981, eclodiu a crise na equipe de Frank Williams: Jones e Reutemann venceram em 1-2 duas semanas antes em Long Beach, chovia cântaros no Rio de Janeiro e Carlos liderava em Jacarepaguá.

Foi dada placa de sinalização para a inversão de posições. Reutemann fez que não era com ele, seguiu em frente e após 2h de prova, venceu. Quarto triunfo do argentino no Brasil. Eu era um dos “arquibaldos” que levou chuva até a alma naquele dia. E que teve de aturar a gozação de torcedores ‘hermanos’ que nos gritavam ‘Y dale Lole’ e empunhavam bandeiras. A festa era deles, com toda razão e merecimento.

Mas Piquet deu o troco: venceu os GPs da Argentina e San Marino, ambos com atuação monumental. Só que Reutemann também triunfaria no GP da Bélgica e faltando seis etapas, o argentino tinha 17 pontos de vantagem sobre o rival da Brabham (43 a 26).

O problema é que, entre quebras e acidentes, Reutemann só marcaria mais seis pontos naquela temporada e o brasileiro, 24 – mesmo quebrando em Monza, à frente do piloto da Williams, quando era 3º colocado.

Se houvesse um empate em pontos, Piquet seria campeão por ter uma vitória a mais, mas isso não foi necessário. Reutemann fez duas corridas ‘de cão’ em Montreal sob um toró épico e em Las Vegas, onde largara na pole. Nelson o superou sem qualquer dificuldade, chegou em 5º e levou o título de 1981.

“Perdi para o garoto que um dia limpou as rodas de meu carro”, lamentava Carlos.

E era verdade: em 1974, Piquet, então com 21 anos, foi uma espécie de faz-tudo para a Brabham por ocasião do GP Presdidente Médici – um triste nome para a corrida que inaugurou o Autódromo de Brasília,

Além de servir sanduíches, conseguir peças, soldas, macacos e tudo o mais, Piquet foi motorista dos mecãnicos e os levou para os puteiros da capital. E ele também polia as rodas dos BT44 de Wilsinho Fittipaldi e de Reutemann.

Carlos ainda disputaria mais duas corridas: foi 2º colocado na África do Sul, numa atuação excelente. Mas cometeu vários erros no GP do Brasil e decidiu se retirar, aos 40 anos completos, da categoria.

Reutemann não largou o esporte a motor de todo: fez aparições esporádicas no WRC (Mundial de Rally) em seu território e causou sensação com ótimos resultados. Em 1995, aos 53 anos, emocionou e enlouqueceu os torcedores de seu país ao guiar a Ferrari 412 T2 de 1994, que fora de Jean Alesi e Gerhard Berger. Carlos deu uma aula de pilotagem no molhado, virando tempos melhores que pilotos 30 anos mais jovens…

Depois, enveredou pela política. Foi primeiro senador da República Argentina e depois governador de seu estado natal, Santa Fe, pelo Partido Justicialista. Depois, mudaria para o “Macrismo”, do antigo presidente do Boca Juniors e também da Argentina, Mauricio Macri, que não se reelegeu. Carlos foi senador novamente, pelo Cambiemos. E seu mandato já estava expirado quando sua saúde começou a lhe trair.

Carlos Alberto Reutemann (1942-2021)

Já há alguns anos, Reutemann lutava contra problemas digestivos, especialmente hemorragias. Este ano de 2021 foi duríssimo para ele e seus familiares. Foram recorrentes as notícias de que sua saúde não vinha bem e ontem, terça-feira, ele entrou em estado crítco num hospital de Santa Fe. Veio a falecer hoje, aos 79 anos.

#RIP Godspeed