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Fórmula 1

Saudosas pequenas – RAM, parte IV (final)

RIO DE JANEIRO – A RAM deixou para trás as dificuldades enfrentadas na temporada de 1983 e se preparou para encarar o Mundial de Fórmula 1 em 1984 com fôlego novo. John MacDonald conseguiu patrocínio para alinhar dois carros e, pela primeira vez, seus bólidos teriam motor turbo: o Hart 415T idêntico ao de Toleman e […]

RIO DE JANEIRO – A RAM deixou para trás as dificuldades enfrentadas na temporada de 1983 e se preparou para encarar o Mundial de Fórmula 1 em 1984 com fôlego novo. John MacDonald conseguiu patrocínio para alinhar dois carros e, pela primeira vez, seus bólidos teriam motor turbo: o Hart 415T idêntico ao de Toleman e Spirit.

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Oriundo da Fórmula 2, Philippe Alliot fez sua estreia na F-1 pela RAM

Os dois RAM 02 pintados de verde e branco com o apoio da Skoal Bandit e da Rizla teriam como pilotos o estreante francês Philippe Alliot, vindo da Fórmula 2, onde tivera resultados bastante modestos, e o britânico Jonathan Palmer, campeão da categoria de acesso à F-1 com seu Ralt RH6 de motor Honda.

No carro #10, estava o britânico Jonathan Palmer, que ganhara em 1983 o Europeu de F-2 com um Ralt Honda

Nos GPs do Brasil e África do Sul, Palmer ainda correu com uma versão atualizada do 01 de 1983 e Alliot foi o único a bordo do carro novo. Palmer largou em último em Jacarepaguá e ainda conseguiu terminar em oitavo, enquanto em Kyalami o câmbio quebrou. Alliot abandonou as duas primeiras corridas e ainda por cima nem se qualificou no GP da Bélgica, em Zolder, onde Palmer foi décimo em sua primeira corrida no RAM 02.

Apesar do carro péssimo, Palmer mostrou que era mais piloto que Alliot

Sem nenhuma surpresa, o britânico evidenciava sua superioridade técnica sobre o companheiro de equipe, mesmo com um carro sofrível. Nono em San Marino e 13º em Dijon, no GP da França, Palmer se sobressaía sobre Alliot, que só colecionava abandonos. Uma coisa os dois tiveram em comum em Mônaco: não se qualificaram.

Mike Thackwell substituiu Jonathan Palmer no GP do Canadá, disputado em Montreal

Em paralelo com a Fórmula 1, Palmer disputava provas do World Sportscar Championship, o antigo Grupo C. E nas 24 Horas de Le Mans, sofreu um violento acidente que o impediu de disputar o GP do Canadá, em Montreal. Acabou substituído pelo neozelandês Mike Thackwell, que liderava absoluto a temporada europeia de Fórmula 2. Enquanto o reserva de Palmer abandonava com o turbo do motor Hart quebrado, Alliot chegou em décimo.

Segura, peão! Palmer ataca demais a zebra em Monza, no GP da Itália

Entre o GP dos EUA em Detroit e a corrida da Alemanha, os RAM 02 Hart foram acometidos por diversos problemas técnicos e acidentes que prejudicaram o desempenho dos dois pilotos. Na Áustria e na Holanda, duas corridas atípicas para o time na segunda metade do campeonato, tanto Palmer quanto Alliot conseguiram chegar ao fim daquelas corridas. O britânico completou ambas em nono, enquanto Alliot fez um 10º na Holanda e um 11º na Áustria.

Nas corridas finais, a rotina de abandonos continuou. A fragilidade do conjunto era evidente e tanto Palmer quanto Alliot acabaram o ano sem um único ponto marcado.

Para a temporada de 1985, John MacDonald buscou reforços numa equipe que acabara de fechar suas portas. Da alemã ATS vieram o engenheiro suíço Gustav Brunner e o piloto germânico Manfred Winkelhock, de 33 anos, para substituir Jonathan Palmer, que se transferira para a novata Zakspeed. Brunner desenhou o novo RAM 03 com assessoria do engenheiro argentino Sergio Rinland, usando no projeto do chassi os mesmos conceitos dos ATS D6 e D7, renunciando à carenagem. A pintura verde e branca era diretamente aplicada na fibra de carbono do monocoque.

Manfred Winkelhock a bordo do RAM Hart projetado por Gustav Brunner, que tinha o mesmo conceito dos ATS de 83/84

O começo foi razoável. De saída, Winkelhock se mostrou muito mais rápido em qualificação que Alliot, mas no GP do Brasil foi o francês quem terminou melhor qualificado, em nono, enquanto o companheiro de equipe chegava em 13º lugar. No Estoril, o alemão largou em décimo-quinto e terminou a corrida, mas não recebeu classificação, enquanto o francês desistia após uma rodada.

CRASH! O acidente entre Brundle e Alliot no GP dos EUA, em Detroit

Apesar dos esforços de Winkelhock, faltava resistência ao motor Hart, dinheiro para um maior investimento e o carro não era tão bom quanto o projeto fazia supor. Apesar disto, Manfred ainda conseguiu um 14º posto no grid do GP do Canadá. E os problemas e acidentes se sucediam, como este de Philippe Alliot com Martin Brundle no GP dos EUA, em Detroit.

Winkelhock chegou em 12º no GP da França, antes de seu acidente fatal nos 1000 km de Mosport, pelo World Sportscar Championship; o alemão tinha 33 anos

Até o fim da primeira metade do campeonato, somente uma vez um dos RAM 03 Hart foi visto recebendo a quadriculada: foi no calorento GP da França, em Paul Ricard, onde Winkelhock chegou em 12º lugar. As duas etapas seguintes – Inglaterra e Alemanha – seriam as últimas do piloto alemão na Fórmula 1.

Assim como Palmer em 1984, Manfred Winkelhock também disputava em paralelo com a categoria máxima as provas do Mundial de Grupo C. No dia 12 de agosto, lá estava ele a bordo de um Porsche 962C da equipe de Erwin Kremer, disputando os 1000 km de Mosport, no Canadá, em mais uma etapa daquele campeonato. Em dupla com o suíço Marc Surer, outro que também participava da F-1, Winkelhock alinhou da quarta posição do grid e vinha bem na corrida quando um pneu do protótipo estourou a mais de 200 km/h, causando o acidente que o matou. Manfred era celebrado por seus compatriotas por sua experiência e versatilidade nas pistas.

Com a perda de Winkelhock, a RAM ficou acéfala. Sem um piloto com o referencial de acerto e velocidade, John MacDonald acabou por resgatar o britânico Kenny Acheson, que não corria de F-1 desde 1983. Ele conseguiu a qualificação nos GPs da Áustria e Itália, não correu na Holanda e acabou afastado do GP da Bélgica porque seu carro estava indisponível para a disputa dos treinos.

Acheson, como efeito, nunca mais sentou num RAM. Philippe Alliot foi com o único carro do time para o GP da Europa e John MacDonald, já sem dinheiro, desistiu de levar o bólido para as corridas finais na África do Sul e Austrália, encerrando a temporada antes do seu término.

Mike Thackwell testou na pré-temporada de 1986 no Rio de Janeiro, mas o RAM Hart não seria inscrito por falta de patrocínio

Mesmo após dois anos em branco, a equipe ainda seria vista, numa última tentativa de sobrevivência, nos famosos testes de pneus que se realizavam em janeiro, no verão carioca, em Jacarepaguá. O RAM 03B com motor Hart foi conduzido nos treinos por Mike Thackwell, mas a equipe desistiu definitivamente de disputar a temporada de 1986 antes da primeira corrida do campeonato.

Armação: John McDonald tentou voltar com uma Benetton travestida de Trussardi com motor BMW Megatron: a FIA não permitiu a inscrição de uma equipe não-oficial

A última e fracassada aposta de John MacDonald em ter uma equipe de Fórmula 1 novamente foi vetada pela FIA em 1987. Ele chegou a apresentar uma Benetton B186 com motor BMW Megatron, pintada nas cores dos jeans Trussardi, que seria o nome de sua “nova” equipe. O piloto seria Emanuele Pirro. A Federação Internacional de Automobilismo, que já proibia a entrada de times particulares comprando carros de terceiros desde o início daquela década, descobriu a falcatrua e vetou a entrada da Trussardi na categoria.