Saudosas pequenas – Minardi, parte II

Formula One World Championship
A estreia: com 12 pessoas apenas na equipe, Giancarlo Minardi (à esquerda) começa a trajetória de sua escuderia na Fórmula 1 no GP do Brasil de 1985

RIO DE JANEIRO – Dia 5 de abril de 1985. Quando a pista de Jacarepaguá foi aberta para o primeiro treino livre do Mundial daquele ano, o sonho de Giancarlo Minardi se materializava. E certamente veio à sua memória o que aconteceu em 76, quando colocou uma Ferrari 312T em duas provas extracampeonato, para Giancarlo Martini guiar.

Giancarlo que estava ali representado no GP do Brasil através de seu sobrinho, pois quem estava a bordo do carro #29 no circuito carioca era Pierluigi Martini, que seria quase uma extensão do time de Giancarlo Minardi durante toda sua carreira na Fórmula 1.

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O primeiro carro tinha motor Ford Cosworth V8

A equipe de Faenza trouxe apenas 12 pessoas do staff para a primeira corrida do ano. Natural, até. A Minardi não tinha pretensão nenhuma de ser competitiva e nem podia. Era um time novato, em formação. E o motor do M185, projeto de Giacomo Caliri, era o velho e pouco potente Ford Cosworth DFY de risíveis 550 HP contra os 900 HP dos mais modernos e bem construídos modelos turbo da época.

Martini foi marraio no treino, mais de 15 segundos mais lento que a pole position cravada por Michele Alboreto, da Ferrari. Fez uma volta em ritmo de corrida ao redor de 1’45” e esteve em último – ou entre os últimos, até o motor se entregar e ele desistir. Em Portugal, quando a equipe ainda tinha o Cosworth montado no carro, o italiano ficou até à frente de Keke Rosberg  e Manfred Winkelhock no começo da disputa aquática no Estoril. Até que rodou na 12ª volta e abandonou.

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Motori Moderni: uma eterna dor de cabeça para o time de Faenza

A Minardi recebeu enfim um motor turbo para a 3ª etapa, o GP de San Marino. Projeto de Carlo Chitti, o motor tinha o nome de Motori Moderni e era um V6 a 90º biturbo, debitando 720 HP a 11.300 rpm. Além da pouca potência comparado ao resto, o carro era 10 kg mais pesado que o mínimo exigido pelo regulamento. A equipe iria sofrer – e muito – no começo de sua aventura na Fórmula 1.

Até que na estreia do motor e numa pista “caseira”, Martini conseguiu o melhor grid do M185 em todo o ano: 19º colocado, a 5″443 da pole e à frente do ridículo François Hesnault, que andava na Brabham. Imaginem vocês: uma Minardi melhor que uma Brabham BMW! E foi exatamente isso que aconteceu. Pena que Martini não correspondeu: largou mal, caiu para 22º e vinha em décimo-sétimo quando o turbo quebrou.

Mônaco, onde já se sabia que piloto e carro não se qualificariam foi ainda pior: Martini nem treinou direito em razão de um acidente que detonou o carro e impediu a participação da equipe em Monte-Carlo. Um novo chassi foi despachado para o Canadá, onde o italiano – último com mais de 10 segundos de defasagem em relação a Elio de Angelis, bateu de novo.

Em Detroit, mais um vexame: o carro quase não andou nos treinos e o transponder da cronometragem registrou a marca de 3’04″446 para Pierluigi Martini. Com a anuência da FIA, o piloto recebeu autorização para largar de último. E por lá ficou até a 12ª volta, com mais um turbo indo para o espaço. Na França, o italiano largou em penúltimo, mas uma colisão com Gerhard Berger o tirou da disputa, quando o austríaco da Arrows ia colocar-lhe uma volta.

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Martini evoluiu ao longo do ano, mas o carro era o pior de 1985

Apesar dos percalços, o M185 começava a melhorar com passos de tartaruga. Martini qualificou-se em 23º para o GP da Inglaterra no veloz circuito de Silverstone. Alcançou o décimo-quarto lugar, o que para um carro pouco rodado e um motor nada confiável, era excelente. Mas não foi o motor que quebrou: foi a transmissão. Já em Nürburgring, pecado: o italiano vinha em 10º a poucas voltas do fim e o Motori Moderni V6 turbo explodiu.

Na Áustria, Martini alcançou a 12ª posição na pista quando a suspensão do carro quebrou na 41ª volta. Em Zandvoort, bateu logo na primeira volta após largar em 24º. Em Monza, a bomba de gasolina impediu o italiano de passar pela primeira volta. O azar misturado à falta de confiabilidade do carro minava a confiança do piloto.

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O jovem piloto pouco pôde fazer em seu primeiro ano de Fórmula 1

Mas na Bélgica, aconteceu o milagre. Não houve quebra, não houve rodada e nenhum problema afetou o M185 em Spa. Exceto a lentidão perene do carro. Martini deu a Giancarlo Minardi o gostinho do primeiro Grande Prêmio completado. Está certo: cinco voltas atrás de Ayrton Senna mas, pombas! Para quem não tinha experiência alguma de Fórmula 1 e um carro que só quebrava, foi um tremendo resultado: 12º lugar.

Em Brands Hatch, tudo voltou ao “normal”: Martini saiu da pista na quarta volta, tendo sido o último do grid. No GP da África do Sul, a Minardi furou o boicote de Ligier e Renault e seguiu as italianas Alfa Romeo, Osella e Ferrari. Era melhor para o time que o #29 não tivesse ido: o radiador do carro furou quando Pierluigi vinha em nono – e último – entre os que corriam na pista de Kyalami. Por fim, no estreante GP da Austrália, a Minardi salvou um honroso 8º lugar, apenas quatro voltas atrás do vencedor Keke Rosberg.

Com apenas dois resultados em 15 corridas disputadas, mais por culpa da falta de confiabilidade do que por seu próprio potencial, Pierluigi Martini foi ‘rebaixado’ para a Fórmula 3000 para ganhar mais quilometragem – e no futuro ele se beneficiaria disto. Para 1986, Giancarlo Minardi tinha planos mais elaborados – a começar pela ampliação das operações para dois carros. Ele costurou também uma parceria para usar a pista de testes da Ferrari, em Fiorano, em dias onde o construtor italiano não andaria. E como efeito, até Michele Alboreto foi convidado a dar umas ‘voltinhas’ no carro do time, como visto aqui na foto abaixo.

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Michele Alboreto testa a Minardi em Fiorano, pista da Ferrari

Com um incremento da verba de patrocínio, ele foi à luta e trouxe o velho recruta dos tempos de Fórmula 2, Alessandro Nannini, para aos 26 anos estrear na categoria máxima. A surpresa ficou por conta do ocupante do segundo carro: o impetuoso e imprevisível Andrea De Cesaris, notório pela velocidade natural e pela enorme propensão a acidentes. Cheiro de prejuízo pela frente…

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Alessandro Nannini chega à F-1 e tem um primeiro ano de pesadelos

Nas primeiras provas, a Minardi entrou com o modelo M185 na versão B, remodelada por Giacomo Caliri. Com os motores daquela época limitados ao consumo de 195 litros de combustível. o beberrão MM V6 turbo era sério candidato a deixar os dois pilotos do time a pé, sem qualquer aviso prévio. Mas para sorte deles, isso só aconteceria com De Cesaris, na Bélgica.

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O tresloucado Andrea de Cesaris a bordo do M185B

Até o GP da Alemanha, quando Andrea e Nannini andaram juntos com o M185B, foram incríveis dezoito abandonos – somando, claro, os resultados dos dois pilotos e descontando Mônaco, onde a Minardi não correu. Foram quatro quebras de turbo, dois motores explodidos, três falhas de diferencial, dois acidentes (ambos com Nannini, pasmem!), duas quebras de câmbio e o resto foram problemas que variaram de embreagem a suspensão, passando por semi-eixo e pane seca. Uma falta de confiabilidade alarmante.

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O M186 mostrou algum potencial com Andrea de Cesaris

A partir do GP da Hungria, o M186, segundo projeto de Giacomo Caliri para o time de Faenza, estreou para ter vida curta na categoria. Só disputou seis corridas e abandonou cinco. Andrea De Cesaris ainda conseguiria um incrível 8º posto no GP do México e a 11ª colocação no grid do GP da Austrália. Alessandro Nannini ficou mesmo com o velho M185B, com o qual também só terminou uma corrida, também no México, quando foi 14º colocado.

Saldo da Minardi nos dois primeiros anos de Fórmula 1: nenhum ponto, 30 GPs disputados, quatro corridas apenas com um carro recebendo a bandeirada e duas oitavas posições como melhor resultado. Início pouco encorajador, é verdade. Mas a equipe evoluiria. Veremos isso no próximo post, que falará dos anos de 1987 e 1988.

Comentários

  • eu,fico pensando no que esse povo, o saudoso Alboreto,Nannini,De Cesaris e Martini,o quê eles fariam pilotando os F1 de hoje. Imagina De Cesaris sendo companheiro de Vettel na Red Bull,talvez a emoção que a F1 procura não esteja,nas ultrapassagens forjadas pelos pneus,KERS e DRS , a sigla que a F1 procura e que está faltando hoje se chama ALMA.

  • Essa foto do saudoso Alboreto pilotando uma Minardi é demais!!!
    Comparando os três primeiros anos da Minardi com o mesmo período da HRT, vemos que o trabalho da equipe espanhola não foi de todo ruim, eu acho. Beleza de post, aguardando ansiosamente a próxima parte!

    • Muito pelo contrário, Alexandre, tem um post no blog do indigitado Felipe Giacomelli que explica muito bem a diferença entre as equipes pequenas e, principalmente, a F1 de ontem e hoje.

      Como bem disse Frank Williams, quando perguntado porque sua equipe passou de estrela a coadjuvante no grid em tão pouco tempo, hoje só existem equipes que em um passado recente seriam times médios ou mesmo grandes.

  • Os carros da Minardi sempre foram muito bonitos enquanto usaram esse esquema de preto-amarelo-branco, Aquela Minardi branca do Cristian era horrivel. Das pequenas sempre será minha favorita, das grandes é a Williams.