A Mil por Hora
Fórmula 1

Uma corrida histórica

RIO DE JANEIRO – Há pouco tempo atrás, se me lembro bem, não só este escriba aqui como muitos que têm espaço para falar de automobilismo estavam descendo o cacete na Fórmula 1. “Porcaria” foi o que de mais gentil falamos na época do GP da França, em Paul Ricard. Pois a própria categoria se […]

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RIO DE JANEIRO – Há pouco tempo atrás, se me lembro bem, não só este escriba aqui como muitos que têm espaço para falar de automobilismo estavam descendo o cacete na Fórmula 1. “Porcaria” foi o que de mais gentil falamos na época do GP da França, em Paul Ricard.

Pois a própria categoria se encarregou de calar nossas bocas, diminuir nosso desânimo e mostrar que o esporte respira. Mais: mostrou, ela própria, que ainda é top. Por mais que às vezes pareça o contrário.

E foi preciso que o GP da Alemanha deste domingo fosse desse jeito que a gente viu. Pista molhada, largada sem Safety Car (gostamos!), três voltas a menos (bom senso é isso aí) e uma corrida pra ninguém botar defeito – do início ao fim. Chove, para. Chove de novo. Para de novo. Chove… um negócio de louco. Faltam até palavras pra serem escritas nesse texto.

Numa corrida onde – quase – todo mundo errou, brilhou aquele que já é uma realidade. O piloto que mais arrasta multidões nos autódromos. Verdadeiras hordas (no bom sentido, é claro) que gritam a cada passagem do carro #33 como se fossem gols da Holanda nos tempos de Johann Cruyff, Marco Van Basten ou Dennis Bergkamp.

É claro que me refiro a Max Verstappen. Que chegou à sua sétima vitória na categoria – nenhuma delas, registre-se, largando da pole, um caso raro na história do esporte. E pra não dizer que o piloto da Red Bull não cometeu erros, ele foi traído em mais uma largada sonolenta vindo da primeira fila, que o fez cair para quarto e depois se recuperar para terceiro.

E aí começou a dèbacle. Sergio Perez foi o primeiro, errando, rodando e batendo. Safety Car que veio como uma luva para as pretensões de Sebastian Vettel. O alemão da Ferrari queria se redimir diante de sua torcida e, vindo de último, sabia que não podia errar. Principalmente, calar os que lhe decretavam como ‘aposentado’.

Não parou no abandono do mexicano. O motor do carro de Daniel Ricciardo estourou. E a pista, que estava já imprópria para pneus biscoito, ficou pior para os intermediários porque secava e foi necessário montar os slicks.

Para provar que talvez não fosse a escolha do momento, Verstappen escapou do constrangimento de ser a primeira grande vítima da pista de Hockenheim. Rodou no miolo, naquela parte mundialmente conhecida como Stadium. Deu um 360º completo e seguiu.

A corrida viraria do avesso a partir do acidente com Charles Leclerc, que havia mudado dos pneus intermediários para slicks de composto macio. Um erro fatal do monegasco, que ficou putíssimo – consigo mesmo, é claro – por ter derrapado fora da linha ideal e saído não só da pista como da corrida – na qual podia ter ganho.

Isso porque o então incontestável Lewis Hamilton, que vinha sólido na liderança, teve um primeiro grande erro neste domingo, batendo sozinho quando saiu da pista uma volta depois do piloto da Ferrari.

Não obstante, a Mercedes também perpertrou um rosário de cagadas como nunca antes visto na equipe desde que Toto Wolff assumiu o comando das operações da marca de Stuttgart na Fórmula 1. Afora a demora na troca da asa dianteira danificada e da escolha por intermediários, já que voltara a chover, houve ainda um segundo erro do líder do campeonato, ao tentar ingressar na área de pitlane do mesmo modo perigoso que fizera um ano atrás.

Fariam vista grossa os comissários desportivos? Pois não houve e Hamilton foi merecidamente punido com acréscimo de tempo de cinco segundos, ou no tempo final de prova ou numa outra parada de box, caso necessária.

O nível de loucura deste GP da Alemanha pôde ser medido pelo momento em que Nico Hülkenberg esteve em posição de pódio e Alex Albon, com a Toro Rosso – sem nunca ter guiado um Fórmula 1 na chuva, dia algum, hora nenhuma – era o quarto, antes de perder a posição para Hamilton, a posteriori informado da punição.

Pois Hülkenberg jogaria sua corrida fora se acidentando na 40ª volta, o que provocou nova reviravolta no jogo. Lance Stroll, sem nada a perder, trocou para slicks, no que foi imitado por Daniil Kvyat, logo após a bandeira verde.

E para provar que este domingo não era da Mercedes – que se auto-homenageara com uma pintura nova celebrando os 125 anos da marca no automobilismo mundial e o 200º GP da equipe na categoria, Lewis Hamilton saiu rodando na curva 1 do circuito alemão e detonou os pneus de seu carro, caindo para último.

Pelo menos não teria o fim de Valtteri Bottas, que perdeu o controle do carro na mesma curva e a sorte do finlandês não foi a mesma do companheiro de equipe. Uma forte batida o deixou fora da disputa… e o Safety Car entrou de novo.

Nessa, Stroll e Kvyat emergiram para a frente e estavam em posições de pódio, com o canadense da Racing Point num improvável 2º lugar e o mais novo papai do pedaço era terceiro, com Sebastian Vettel trucidando Carlos Sainz numa relargada para menos de cinco voltas.

E não teve conversa: Stroll não segurou o “Torpedo”, mas Vettel também não teve cerimônia com nenhum dos dois. Deixou o carro rosa para trás e atacou Kvyat para conseguir um redentor 2º lugar. Nada mal para quem saiu com o rabo por entre as pernas naquela mesma Hockenheim, um ano atrás.

Ainda houve tempo para a dupla da Haas se estranhar e para o êxtase dos holandeses, sedentos por cerveja e alucinados pela “Verstappenmania” que toma conta da Fórmula 1. Detalhe: em onze corridas, Max terminou todas na zona de pontuação. E além dele, um outro único piloto conseguiu isso em 2019.

Mas, como, se Lewis Hamilton cruzou em 11º?

Pois é… o destino, perverso e caprichoso ao mesmo tempo, mudou o resultado de uma corrida incrível. E só mesmo o GP da Alemanha para ter uma equipe punida por “ajuda na largada”: a FIA meteu um pênalti de 30 segundos na Alfa Romeo e a Williams (ora vejam!) conseguiu um pontinho com o 10º lugar de Robert Kubica!

Oito anos, oito meses e 14 dias depois! O maior intervalo da história da categoria para um piloto na zona de pontuação.

Um fato incrível, numa corrida que teve de tudo e foi não só redentora como espetacular e histórica.

Em tempo: Carlos Sainz e Alexander Albon, que terminaram respectivamente em quinto e sexto, merecem a citação. O espanhol, cada vez melhor na McLaren, chegou a rodar e quase saiu da corrida – mas saiu pelos próprios meios e alcançou mais um ótimo resultado. Albon andou bem demais na pista molhada e pontuou pela quarta vez no ano.

Aliás, a Toro Rosso foi ao pódio pela primeira vez desde 2008… vocês se lembram com quem?

Por mais GPs como este da Alemanha, ainda na temporada 2019, de preferência.