FIA WEC, 6h de Monza: vitória da Alpine em corrida sensacional!

RIO DE JANEIRO – Sensacional do início até a última volta: a edição 2022 das 6h de Monza foi possivelmente a corrida mais espetacular do FIA WEC, o Campeonato Mundial de Endurance, em muitos anos. Houve de um tudo em incríveis 194 giros de disputa – inclusive o que muitos sequer previam quando o campeonato começou: a Alpine venceu pela segunda vez com um protótipo LMP1 com quatro anos de uso, tido como ‘velho’ e ‘superado’, mas muito bem conduzido na disputa e com uma trinca com muita vontade de surpreender e entrar para a história da competição.

E principalmente pôr uma orelha atrás da pulga da Toyota, mostrando que o GR010 Hybrid do construtor oriental tem defeitos, falhas e, sobretudo, não é um carro tão dominante quanto foi em 2021. Se a alteração do BoP foi desfavorável aos franceses na prova mais importante do ano, na Itália eles souberam tirar partido de cinco intervenções da direção de prova – quatro FCY deflagrados no correr da disputa e um Safety Car, este por conta de um pavoroso acidente com o Aston Martin LMGTE-AM da TF Sport, com o português Henrique Chaves a bordo.

Veja no vídeo abaixo.

Não obstante, a corrida começou com o acachapante domínio do Glickenhaus 007 LMH que, por conta das modificações para este fim de semana na tentativa de equiparar a performance da Toyota com os novíssimos Peugeot 9X8 que faziam sua estreia após 15 mil km de testes e uma longa preparação – mesmo que com percalços durante todo o fim de semana, o que era mais ou menos esperado – era o carro mais rápido do fim de semana.

O #708 liderou fácil primeiro com Romain Dumas e depois com o brasileiro Pipo Derani. Até pouco antes da metade da disputa, tudo correu bem. Mas veio o ‘capote’ do #33 mostrado no vídeo acima e houve uma penalização por infração durante um período de FCY a ser paga pelo carro. Quando Olivier Pla estava a bordo, o motor 3,5 litros V6 biturbo preparado pela Pipo Moteurs (sem referência alguma a Derani) estourou. Foi o fim das esperanças para James Glickenhaus e companhia.

A Peugeot, como era de se prever, tinha muito mais com o que se preocupar. O 9X8 mostrou ritmo quando não teve problemas, mas os dois carros fizeram visitas aos boxes com frequência, sendo que o #93 mal completou 50 voltas e o #94 ainda recebeu a quadriculada, porém num distante 33º lugar geral, a 25 voltas dos vencedores. Ficou claro que os franceses ainda precisam ganhar em confiabilidade, mas é melhor testar o carro agora do que passar vergonha em 2023.

Com Toyota e Alpine em confronto direto durante grande parte da corrida, algumas situações ficaram claras. Um carro mais leve, porém menos potente, era a arma francesa e a Toyota, mesmo com um bólido mais pesado, tinha a vantagem de ter o sistema de tração total das quatro rodas ativado a 190 km/h graças ao motor elétrico – que também influencia no consumo do combustível.

Mas não foi isso que aconteceu; o Alpine era infernalmente rápido em trechos muito velozes como a variante Ascari e a curva Michele Alboreto (Parabólica) e após uma grande luta do #36 com o #8, veio o embate pela liderança com o #7 então guiado por Kamui Kobayashi. No Alpine, Matthieu Vaxivière, que guiou no primeiro e último turnos.

Numa refrega, Koba jogou mais pesado sobre o piloto do construtor francês, os carros se tocaram perto da reta da primeira variante (Variante del Rettifilo) e no contato, o pneu traseiro direito do Toyota estourou. Em primeira análise, pareceu que Koba ‘espremeu’ Vaxivière, que não cedeu um metro mas não moveu o volante. E os comissários dirigidos por Eduardo Freitas entenderam o dolo da manobra como perigosa: tanto que puniram o #7 com um stop & hold de 90 segundos.

Para Kazuki Nakajima, agora diretor esportivo e antigo piloto, o representante da Toyota não teve culpa (alguém tinha dúvidas que haveria uma tremenda passada de pano?). Mas até um dos pilotos da Alpine, André Negrão, achou que não deveria haver a punição ao #7. Só que o colegiado de comissários foi soberano e a decisão, acatada.

No final, Ryo Hirakawa, o último piloto do #8, ensaiou um ataque a Vaxivière, mas não foi possível. O Alpine se saiu muito bem em meio ao intenso tráfego e triunfou numa prova incrível com vantagem de 2″762 somente – uma das menores já registradas no WEC, naquela que provavelmente terá sido a melhor corrida da história recente da competição.

Com o triunfo, o trio do #36 conserva a liderança no Mundial da Hypercar e abre 10 pontos (106 a 96) justamente sobre Hirakawa, Brendon Hartley e Sébastien Buemi, que vinham da vitória nas 24h de Le Mans. A quebra do Glickenhaus promoveu Kobayashi, Mike Conway e José María López ao 3º posto da classificação.

O ‘caos coletivo’ em Monza também vitimou muitos favoritos na LMP2. A Prema foi punida por um toque no carro da Richard Mille numa manobra infeliz de ultrapassagem. O Team WRT e a United Autosports tiveram problemas técnicos e se atrasaram. Os ‘outsiders’ passaram a sonhar com a possibilidade de vitória ou de pódio. E foi exatamente o que aconteceu.

Com o atraso dos Peugeot e o abandono de dois Hypercars, o vencedor da classe foi 4º colocado geral, numa atuação exemplar do #41 da RealTeam by WRT conduzido por Ferdinand Von Habsburg, Norman Nato e Rui Andrade, derrotando com 188 voltas e quase 12 segundos de vantagem o #38 da Jota que largou de último (literalmente, de último mesmo, de 38º) com Wil Stevens, Roberto González e Antonio Félix da Costa.

A equipe britânica, que estará em 2023 com um Porsche 963 LMDh na Hypercar, arriscou tudo no final e inclusive conservou o carro em três stints diretos com o mesmo jogo de pneu. A Vector Sport, que fez disparada sua melhor corrida da temporada, não conseguiu fôlego para alcançar a rival e mesmo assim comemorou o pódio conquistado por Nico Müller, Ryan Cullen e Sébastien Bourdais.

Outro destaque foi o 7º lugar geral e quarto da classe alcançado pela Inter Europol Competition, que em ciclos de bandeira verde liderou com autoridade, em boa performance de Kuba Smiechowski/Alex Brundle/Estebán Gutiérrez, este andando – e bem, aliás – numa pista que conhecia da Fórmula 1. A United Autosports ainda salvou o 8º posto geral e o quinto da classe com o #23, que também saiu da última fila, na frente da Prema e da Algarve Pro Racing – outra vez triunfante na LMP2 Pro-Am – e desta vez, nos instantes finais, pois a corrida se desenhava em direção à francesa Ultimate, que chegou em segundo na subcategoria, seguida do #83 da AF Corse e do #44 da ARC Bratislava.

Na LMGTE-PRO, sobraram escaramuças: Porsche e Ferrari tiveram momentos de tensão durante um momento de uma corrida quase que inteiramente dominada pelo construtor italiano. Contudo, uma penalização ao #51 então líder com James Calado e Alessandro Pier Guidi motivou a aproximação física na pista com um dos 911 RSR-19, o #92 de Kévin Estre e Michael Christensen.

Mágoas passadas por uma decisão polêmica de campeonato, vencida pela Ferrari, voltaram na mente de Estre e tanto ele quanto o italiano da AF Corse jogaram muito pesado um com o outro na disputa pelo pódio. Todavia, Estre não foi leal e bateu deliberadamente na traseira da #51, sendo posteriormente penalizado pela direção de prova com drive through pela conduta antiesportiva.

Mas a Ferrari, que se jactava de ter a melhor estratégia após mandar seus carros para box no primeiro período de FCY, entrou pelo cano. O combustível não daria para terminar as últimas voltas e não só o #51 de Pier Guidi e Calado parou como TAMBÉM o #52 dos então líderes Miguel Molina e Antonio Fuoco.

Posta para fora da pista em Le Mans justamente pelo protótipo LMP2 Pro-Am da AF Corse, a Corvette se vingou de forma deliciosa e deu ao modelo C8.R sua primeira vitória no FIA WEC, numa atuação exemplar de Nick Tandy e Tommy Milner, que fecharam a disputa em 15º na geral com 181 voltas percorridas.

A vitória na LMGTE-AM, após um período de domínio da Ferrari #85 das Iron Dames – e duvido quem houvesse que não tivesse torcido por elas – veio para a Dempsey-Proton Racing, que fez uma corrida muito consistente com o trio Seb Priaulx/Christian Ried/Harry Tincknell, alcançando a segunda vitória no campeonato. Mas Rahel Frey/Sarah Bovy/Michelle Gätting seguem se superando – além da primeira pole, agora têm o melhor resultado da carreira e o primeiro pódio no WEC – um trabalho que está rendendo frutos.

O 3º lugar da classe foi do Team Project 1, numa apresentação sóbria e eficiente de Matteo Cairoli, Mikkel O. Pedersen e Niki Leutwiler, que eventualmente lideraram. O #60 da Iron Lynx veio de último na classe para quarto ao final, com a Spirit of Race alcançando o primeiro top 5 do ano.

Ufa! Que corrida, gente! E a próxima será as 6h de Fuji, dia 11 de setembro.

Comentários

  • Rodrigo, boa tarde. Acompanhei a corrida, a sua transmissão pelo canal do YouTube, e foi espetacular. Obrigado pelo belo trabalho. Tirando o acidente com o Aston Martin LMGTE-AM da TF Sport, foi boa a disputa, e legal ver que a Toyota na reina sozinha. Chato de se ver foi o Kévin Estre jogar pesado. Não precisava.